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ARTIGO
É hora de acabar com o DPVAT
ANTONIO PENTEADO MENDONÇA
O DPVAT, aquele seguro que todo mundo paga (alguns no licenciamento, outros com o IPVA),
mas que quase ninguém sabe para
o que serve, nasceu cheio de boas
intenções, no final de 1974. Veio
para substituir outro seguro obrigatório que se transformara no escândalo do setor, e por isso trouxe
em seu bojo mudanças conceituais
importantes, como a ausência de
culpa. Quer dizer, ao contrário da
maioria dos outros seguros, o
DPVAT indeniza mesmo quando
o veículo envolvido no acidente
não é o responsável por ele.
Essa característica deveria fazê-lo um seguro com alta sinistralidade, mas, como nunca foi bem divulgado, não existindo na sua longa história uma única campanha
de esclarecimento contínua de
abrangência nacional, ele se transformou num seguro altamente
rentável, até 1986, quando foi criado um consórcio para administrá-lo.
Daí para a frente o DPVAT começou a fazer água. Em 1991 a lei
de custeio da Previdência Social,
com o argumento de que eram os
hospitais da rede pública que davam o grande atendimento para as
vítimas dos acidentes de automóveis, destinou 50% do seu faturamento para o Fundo Nacional de
Saúde. Depois, com o passar dos
anos o bolo foi sendo mais dividido, normalmente entre gente que
não tinha nada com ele, mas que se
valia de fatias da sua arrecadação
para manter jatinhos à sua disposição e para fazer turismo pelo mundo, sempre em hotéis de primeiríssima classe.
O resultado não poderia ser outro que não o prejuízo operacional
do consórcio, que ficava com apenas 30% da arrecadação total do
seguro para fazer frente aos sinistros.
Diante dessa situação absurda, as
companhias de seguros, por iniciativa da Susep (Superintendência
de Seguros Privados), tomaram
uma série de medidas destinadas a
sanear e depois a acabar com o
DPVAT, e então substituí-lo por
um seguro moderno, provavelmente, nos moldes dos seguros de
responsabilidade civil europeus,
onde cada seguradora tem as suas
apólices e é a única responsável
por elas.
A primeira providência foi a criação de uma reserva especial para
fazer frente aos sinistros ocorridos, mas ainda não avisados. Aqui
é preciso explicar que acabando
numa determinada data, um seguro, a partir dela, pára de receber os
prêmios, mas continua pagando os
sinistros, por pelo menos mais um
ano. Essa reserva, que já está sendo
feita por todas as seguradoras, visa
dotar o consórcio dos meios para
fazer frente aos sinistros, mesmo
depois de parar de receber os prêmios do seguro.
Só que, de repente, do meio do
ano passado para cá, ninguém
mais falou no fim do DPVAT, cuja
desastrada tentativa de cobrança
fora de época em São Paulo veio
deixar claro que ele continua tendo, e criando, problemas sérios,
que comprometem a imagem de
uma atividade que vem melhorando de desempenho ano após ano e
que hoje cumpre de forma satisfatória a sua função de proteger a sociedade, pagando anualmente bilhões de reais em indenizações.
Não tem cabimento as companhias de seguros investirem fortunas para melhorar o seu desempenho e o seu produto, a apólice de
seguro, e terem a sua imagem arranhada porque alguém decidiu que
seria interessante antecipar o recebimento de parte dos prêmios do
seguro obrigatório, com base num
decreto inconstitucional, assinado
no final do ano, que muda entre
outras coisas a lei de custeio da
Previdência Social, diminuindo a
contribuição do DPVAT para o
Fundo Nacional de Saúde de 50%
para 45% do total dos prêmios arrecadados.
Como o decreto, diante da sua
inconstitucionalidade, se mostrou
inócuo, a gestora do convênio do
DPVAT, em vez de reconhecer o
erro e consertar a situação, para
tentar continuar cobrando o que
não era devido, passou a citar resoluções e circulares com mais de dez
anos, ameaçando quem não pagasse, porque já tinha pago, com punições terríveis, que infelizmente
não são previstas em lei.
Graças a Deus, uma juíza federal
de São Paulo concedeu uma liminar pondo fim à novela, mas o mal
já estava feito: a atividade seguradora como um todo, mesmo com
as companhias de seguros investindo pesado para atender bem
seus consumidores, acabou recebendo as sobras dessa cobrança
desastrada, feita à sua revelia, e que
compromete a sua imagem, que
passou a ser vista, como me disse o
frentista do posto onde abasteço
meu carro, "disposta a sangrar o
nosso bolso, mesmo a gente já tendo pago".
O que é pior é que por conta de
todas as distorções que diminuíram o total destinado a indenizar
os seus sinistros, o DPVAT é um
seguro absurdamente caro, custando mais de R$ 50 e indenizando
apenas R$ 5.000 em caso de morte,
que é sua maior indenização. Só
como comparação, o seguro equivalente válido para o Mercosul
custa em torno de US$ 50,00 e indeniza US$ 40.000,00.
O segredo? Esse seguro é desenvolvido e comercializado pelas seguradoras, criando uma concorrência saudável e positiva para o
consumidor, além de impedir a
proliferação das fraudes que contribuem para denegrir ainda mais
a imagem do DPVAT.
Diante desse quadro, será que
não é hora de acabar com esse seguro?
²
Antonio Penteado Mendonça, 46, advogado, é
consultor de seguros e diretor do Centro do Comércio do Estado de São Paulo.
E-mail: pentmend@penteadomendonça.com.br
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