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LUíS NASSIF
Os males do presidencialismo
O que se está vendo nos últimos
dias são os últimos estertores de
uma política que já morreu. Dono
de um ego considerável, FHC vai
demorar mais tempo que pessoas
normais para cair na realidade, o
que obviamente aumentará substancialmente o preço -já imensamente caro- que o país está
pagando por suas indecisões.
Nos últimos dias, FHC vem recorrendo a um arsenal de fogos de
artifício, velho e surrado, para
tentar empurrar a crise com a
barriga. Convocou pactos nacionais, telefonou para sindicalistas,
procurou minimizar a crise, garantindo que ela só afetará quem
compra carros importados, enfim,
uma sucessão de atos descoordenados, improvisados, sem um
pingo de convicção, de quem perdeu o eixo e fica se debatendo em
gestos menores.
No que interessa -a operação
do dia a dia- permanece o caos.
O "knock down" sofrido pelo Banco Central no mercado de câmbio,
na quinta passada, ocorreu antes
que o mercado entrasse na luta do
câmbio livre. Foi como se um lutador disparasse um murro circular e acertasse a própria testa. E
vem FHC convocar pactos nacionais...
O presidente sabe que a gente
sabe que ele sabe que todos esses
gestos dos últimos dias não têm a
menor importância. Pior, a cada
nova demonstração de alienação
da realidade, lá se vão mais reservas cambiais e de credibilidade.
Mas não tem jeito, o presidencialismo é isso aí. A nação vai ter
que aguardar pacientemente (se
for possível) completar-se o processo de tomada de consciência do
presidente, a inevitável depressão
que o acometerá quando cair na
real e o duro processo de recomposição psicológica e da governabilidade. Que a estrela de dona Ruth
Cardoso brilhe e incuta seu bom
senso e determinação no seu companheiro.
²
Centralismo
Não há exemplo maior da inconsistência do presidencialismo
e do centralismo administrativo
do que esse impasse que o país
atravessa.
Nos últimos anos, tendo-se no
poder um presidente presumivelmente racional, a bandeira parlamentarista foi para segundo plano e recriou-se o mito de que a racionalidade imperaria em Brasília.
Esse sentimento fortaleceu várias iniciativas visando centralizar nas cúpulas o controle sobre
todos os movimentos da base. Entre essas iniciativas, as mais radicais são a súmula vinculante (que
impede manifestação de juízes
que contrariem decisões dos tribunais superiores) e a fidelidade
partidária.
De fato, a falta de uma certa disciplina nos tribunais permite que
teses derrotadas encontrem guarida e sirvam de instrumento protelatório, em decisões de primeira
instância. E o exercício da infidelidade partidária favorece o comércio de votos. Mas será que o
caminho residiria no enquadramento de todo rebelde?
O tamanho da crise atual reside
basicamente no oposto -o excesso de poder e a falta de instrumentos políticos de pressão sobre as
cúpulas. O presidencialismo confere ao presidente toda a responsabilidade pelas decisões de gestão do governo. Na fase de ascensão, o excesso de poder aliena.
Gradativamente ele vai perdendo
a sensibilidade para as críticas,
isolando-se da realidade. Na fase
do ocaso, o excesso de poder paralisa. O presidente não tem com
quem dividir as responsabilidades pelas decisões e não decide. Fica o país inteiro amarrado a sua
incapacidade de decidir.
Em um sistema parlamentarista, há muito esse nó górdio teria
sido rompido. O gabinete Malan
teria caído, o Congresso teria indicado um novo primeiro ministro e, na qualidade de quem indicou, seria co- responsável por todos os seus atos -até mesmo pela
renegociação das dívidas com os
Estados.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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