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LUÍS NASSIF
Os números e a fantasia
Nas duas colunas anteriores, procurei trocar em
miúdos a (anti) lógica econômica que passou a dominar o
país a partir do Plano Real: o livre fluxo de capitais com valorização do real e taxas de juros
elevadas, provocando uma
enorme vulnerabilidade externa e uma situação de permanente desequilíbrio. Tudo em
nome do combate à inflação.
Poder-se-ia ter combatido a inflação sem os desequilíbrios externos, mas se buscou deliberadamente essa situação. E por
quê?
Por trás desse modelo desequilibrado havia ganhadores e
perdedores. Dividiu-se o Brasil
em dois: o Brasil A, dos que tinham acesso ao mercado de
dólares; o Brasil B, dos que não
tinham acesso aos dólares.
No Brasil A estavam bancos
internacionais, bancos nacionais, multinacionais e grandes
grupos nacionais, que traziam
dólares baratos para um ambiente de reais caros. Ou se ganhava aplicando em títulos públicos ou expandindo os negócios em cima do Brasil B.
O Brasil B perdeu de diversas
formas. Primeiro quando os juros em reais foram brutalmente elevados e o real valorizado
para abrir espaço para o crédito em dólares. Depois quando
os juros foram mantidos em
patamares elevados para permitir a rolagem da dívida pública. Mais à frente quando a
carga tributária foi brutalmente elevada para permitir ao Estado fazer caixa para pagar os
juros. Depois, quando os gastos
públicos foram brutalmente
contidos para garantir mais
caixa para pagar os juros que
eram carreados para o Brasil
A.
Quando esse modelo explodiu, parte do Brasil A dançou
-as empresas que acredita-
ram na manutenção do câmbio baixo e que viram suas dívidas explodirem e seu mercado encolher-, parte continuou ganhando largamente
-os bancos de investimento,
que trabalham com captação
de dólares.
Como é possível manter um
modelo em que a maior parte
perde, se comprometem o desenvolvimento e os gastos públicos e apenas um setor muito
específico ganha? Simples:
criando uma fantasia, a de
que, se "matar e esquartejar" a
inflação, se aprovarem as reformas tributária e fiscal, se
mantiver o superávit fiscal, automaticamente a imagem do
país melhora, o risco Brasil cai,
voltam o investimento e o financiamento externos e o país
retoma a rota de crescimento.
Quando as reformas forem
aprovadas, se perceberá que,
para garantir o superávit fiscal,
aumentou-se estupidamente a
carga de impostos sobre as empresas e contiveram-se imprudentemente os investimentos
públicos em infra-estrutura,
aumentaram-se os passivos das
empresas e do Estado e encolheu-se o mercado interno. Ou
seja, o tal modelo virtuoso aumentou drasticamente o "custo
Brasil", piorou a infra-estrutura, ampliou o endividamento e
reduziu o mercado interno. Como é possível ir nessa conversa
de que preparou o caminho para a retomada do desenvolvimento?
Em breve irá cair a ficha do
PT que o segundo tempo do jogo só será iniciado quando se
cortar de vez o nó górdio que
sustenta essa armadilha na
qual o país se enredou: a vulnerabilidade externa. Tomara
que não demore a cair a ficha.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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