São Paulo, domingo, 27 de janeiro de 2002

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NEGOCIAÇÕES NA OMC

Rodada mundial começa nesta semana; países ricos estão de olho no mercado brasileiro de energia e de saneamento

Brasil oferece serviços em troca de abertura agrícola

CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Brasil se prepara para oferecer seu mercado de serviços aos países ricos em troca da abertura do comércio de produtos agrícolas. A OMC (Organização Mundial do Comércio) inicia nesta semana a nova rodada mundial de negociações, cuja largada foi dada em Doha (Qatar) em novembro de 2001.
O "toma-lá-da-cá" do comércio mundial começa tímido. O Brasil só definiu interesse para os setores de serviços e agricultura.
Os países ricos estão de olho no mercado brasileiro de serviços de energia e de saneamento (água e esgoto). O Brasil quer eliminar barreiras para vender softwares, automação bancária, serviços de construção civil e postal. Nesses setores, além de ser competitivo, o Brasil quase não enfrenta restrições ao capital estrangeiro.
Mas o maior interesse do Brasil é derrubar barreiras para seus produtos agrícolas e eliminar subsídios oferecidos pelos países desenvolvidos à produção e exportação agrícola, que causam distorções no mercado.
Os negociadores brasileiros prometem só fazer concessões à medida que conseguirem vitórias na área agrícola. "Vamos modular nossa oferta de acordo com aquilo que obtivermos em agricultura", disse o negociador Flávio Marega, especialista em comércio de serviços e investimentos do Itamaraty.
"Haverá muita pressão dos países desenvolvidos para explorar os serviços de energia e de saneamento", disse. O problema é que os marcos regulatórios (conjunto de leis) desses setores não estão prontos. E o governo terá de negociar regras internacionais ao mesmo tempo em que define as normas internas. Não está definido, por exemplo, se os serviços de saneamento são da competência de Estados ou de municípios.
O Brasil já teve esse problema na Rodada do Uruguai, a última série de negociações mundiais de comércio que terminou no final de 1996. Na época, havia discussões sobre os serviços de telefonia e o país estava em pleno processo de privatização desse setor.
O lobby dos países desenvolvidos foi forte. Bastou o governo estipular que uma empresa estatal não poderia ser vendida à outra estatal para a União Européia reclamar com as autoridades brasileiras, contam negociadores.
Como as grandes empresas de telefonia européias são estatais, a UE acusou o Brasil de tentar dirigir investimentos e privilegiar as empresas americanas. A reclamação funcionou, e hoje a espanhola Telefónica é a empresa do setor com o maior estoque de investimentos no Brasil, US$ 27 bilhões.
A opção pela tecnologia européia para a banda C do serviço de telefonia celular foi feita sem negociar contrapartida. Na avaliação do secretário-executivo da Camex (Câmara de Comércio Exterior), Roberto Giannetti da Fonseca, o país deveria ter pedido vantagens comerciais.
Naquela época, a vulnerabilidade externa do país pedia pressa para atrair investimentos. O balanço de pagamentos (gastos e receitas em dólares) atingiu seus maiores déficits (US$ 33 bilhões em 1998), e a economia foi atropela pelas crises russa e asiática.
Desta vez, o governo promete não oferecer abertura de mercado sem barganha. O governo vê a rodada como uma oportunidade de melhorar a conta de serviços. Em 2001, o déficit foi de US$ 7,7 bilhões. "Em 2001 vendemos US$ 40 milhões em produtos audiovisuais e importamos US$ 700 milhões, por exemplo. Há mercados que têm barreiras", disse Marega.



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