São Paulo, sábado, 27 de maio de 2000


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SIDERURGIA
Separação litigiosa colocou Steinbruch contra o Bradesco e a Previ
Conflito na Vale nasceu de disputa por espaço na CSN

DAVID FRIEDLANDER
DA REPORTAGEM LOCAL

O impasse na escolha do novo comandante da Vale do Rio Doce é resultado de uma separação litigiosa que colocou o empresário Benjamin Steinbruch contra a dupla Bradesco e Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil).
A origem do conflito não está na Vale, mas numa disputa por espaço dentro da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) -da qual os três também são sócios.
O argumento de que é preciso acabar com as participações cruzadas que amarram Vale e CSN, para que as duas possam crescer, é uma meia verdade.
Desde que a mineradora foi privatizada, em 1996, todos os sócios sabiam disso e nunca se mexeram. Inclusive o governo, que ainda é o maior acionista da mineradora.
Na realidade, Bradesco e Previ sentiam-se mal representados na CSN e queriam que Steinbruch lhes desse mais espaço. Quando confirmaram que a situação não ia mudar, decidiram empurrar o empresário para fora da Vale e deixá-lo sozinho na CSN.
Bradesco e Previ possuem juntos 31,7% da siderúrgica, mas quem manda na CSN é a Vicunha de Benjamin Steinbruch, que tem 16,3%.
Isso acontece porque a Vicunha está na empresa desde sua privatização, em 1993, e é majoritária no bloco de controle da CSN.
Steinbruch nunca permitiu que Bradesco e Previ aumentassem suas participações no bloco de controle. Segundo representantes desses dois sócios, o empresário repetia sempre que eles teriam de esperar o vencimento do acordo de acionistas, que ocorreria em abril do ano passado.
A data chegou, mas o acordo foi prorrogado automaticamente por mais três anos.
O motivo foi uma cláusula do acordo prevendo que, se os controladores atingissem determinadas metas de eficiência, poderiam continuar no comando. Como os objetivos foram cumpridos, Steinbruch permanece no controle e Bradesco e Previ continuam mandando pouco.

Brigas com a Previ
O problema do empresário, na realidade, era com a Previ. Até hoje os dois não se entendem no conselho de administração da Vale e por isso Steinbruch queria a fundação longe das decisões estratégicas da CSN. Steinbruch até admitia dar mais poder ao Bradesco, mas o banco preferiu ficar do lado da Previ, com quem tem vários negócios.
A reação mais forte por parte da Previ veio quando a fundação decidiu vender parte de suas ações numa outra siderúrgica, a Acesita, há dois anos. Steinbruch tentou comprar a empresa, mas a Previ preferiu fechar negócio com os franceses da Usinor, atitude que o empresário até hoje não engoliu.
Os dois lados brigaram por vários outros motivos, como a insistência de Steinbruch em não contratar um executivo profissional para presidir a Vale -atitude que aborrecia também os outros sócios.
O clima ficou mais pesado a partir do ano passado, quando Steinbruch informou seus sócios sobre a intenção de vender sua participação na CSN. O empresário precisava do dinheiro para reforçar o caixa da Vicunha, empresa de sua família, que no começo do ano passado carregava uma dívida de mais de R$ 1 bilhão.
Ao mesmo tempo em que precisava do dinheiro, Steinbruch não queria se afastar da CSN e, por tabela, da Vale -a CSN é a maior acionista da mineradora. Conseguiu, então, um acordo perfeito com o grupo siderúrgico Arbed, da Bélgica, um dos maiores do mundo no ramo.
Em vez de comprar as ações de Steinbruch, a Arbed topou tornar-se sócia da Vicunha. Se a operação tivesse dado certo, o empresário não venderia nada, continuaria no comando da siderúrgica e da mineradora e ainda embolsaria dinheiro para a Vicunha.
Só que, para ter peso na CSN, a Arbed precisava comprar também a participação do Bradesco. Pelo bloco, a Arbed aceitou pagar mais de US$ 1,7 bilhão.
Tudo combinado, a Previ travou o negócio. A CSN é proprietária de uma mina de ferro de grande potencial, chamada Casa de Pedra, e a Previ temia que nas mãos da Arbed essa mina passasse a competir com a produção da Vale. O Bradesco, fechado com a fundação, recusou a oferta dos belgas e a operação foi desfeita.
A Casa de Pedra foi, inclusive, o principal motivo para a participação da Vale do Rio Doce na privatização da CSN. Ainda estatal na época, a Vale queria vigiar a mina de perto. Tanto que até hoje a Casa de Pedra fornece sua produção basicamente para a CSN.

Tentativa de fusão
Em meados de 99, chegou-se a cogitar a fusão da Vale e da CSN, sugestão feita pelo Bradesco. A proposta era transformar a Vale numa empresa de participações, que controlaria negócios de mineração, alumínio, papel e celulose e siderurgia. Nesse desenho, a CSN seria mais uma empresa do grupo Vale do Rio Doce.
Parecia o caminho ideal para acabar com a bagunça societária entre a Vale e a CSN, já que Bradesco, Previ e Steinbruch eram sócios nas duas companhias. O problema é que Steinbruch perderia estatura com a fusão.
Enquanto Bradesco e Previ são acionistas da Vale e da CSN, está apenas na siderúrgica -a CSN é que é sócia da Vale. A participação da Vicunha, portanto, ficaria menor que a dos outros dois sócios.
Para contornar esse obstáculo, Bradesco e Previ aceitaram dar a Steinbruch a presidência do conselho de administração da nova empresa.
Mais: concordaram em apoiar financeiramente a Vicunha, por meio de uma operação que não chegou a ser detalhada.
Antes disso, Steinbruch apresentou uma lista de pedidos, entre eles carta branca para indicar a diretoria da nova empresa. Isso sepultou a idéia de fusão.


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