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OPINIÃO ECONÔMICA
Celso Furtado
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Ontem completou 80 anos
o nosso grande economista
-Celso Furtado. Desde os anos
50, Furtado vem fazendo contribuições decisivas para a formação do pensamento econômico
brasileiro e latino-americano.
Poucos podem se comparar a ele
em matéria de criatividade, independência e vigor intelectual.
Tornou-se uma figura emblemática. Nas últimas décadas, fortemente marcadas pela reação antikeynesiana e antidesenvolvimentista, Furtado não recebeu a
atenção e o reconhecimento que
merece. Teve que suportar, mais
ou menos isolado, o enfraquecimento da linha de pensamento
econômico que ajudara a construir. Uma linha de pensamento
cuja finalidade central sempre foi
a busca do desenvolvimento nacional e da justiça social.
Historicamente, economia nunca figurou entre nossos pontos
fortes. Não se pode dizer que, nessa área, a criatividade brasileira
tenha se manifestado com grande
intensidade. Ao contrário, no
Brasil, a pesquisa e o ensino de
economia se caracterizaram em
geral pela reprodução acrítica de
modelos importados da Europa e,
depois da Segunda Guerra Mundial, dos Estados Unidos.
Mas a geração de Furtado rebelou-se contra esse estado de coisas. Enfrentando grandes dificuldades e resistências, fizeram o
possível para estabelecer e consolidar uma reflexão autônoma sobre os problemas do desenvolvimento econômico.
As gerações subsequentes de
economistas não souberam dar
continuidade a esses esforços. É
notável o contraste entre a obra
de Furtado e as tendências hoje
predominantes nos meios acadêmicos brasileiros.
Sob muitos pontos de vista,
houve empobrecimento e retrocesso. Os economistas sucumbiram à sedução dos modelos abstratos, produzidos no exterior, e
distanciaram-se dos problemas
nacionais. Por não exercitá-la,
muitos perderam a capacidade de
pensar. Para usar as palavras do
próprio Furtado, ficaram apegados aos "produtos enlatados" que
estão na base do prestígio do saber acadêmico.
Não se conseguiu, entretanto,
sufocar a tradição de Furtado e
suprimir a sua influência. São
muitos os que admiram o seu trabalho e procuram seguir o seu
exemplo.
Nem todos esqueceram que a
pesquisa pressupõe autonomia e
independência de espírito. Como
escreveu Furtado em livro recente
("O Capitalismo Global", editora
Paz e Terra, 1998), o pesquisador
precisa saber combinar dois ingredientes: imaginação e coragem para arriscar na busca do incerto. "A ciência", lembra ele, "é
construída por aqueles que são
capazes de ultrapassar certos limites hoje definidos pelo mundo
universitário".
Não é fácil levantar recursos para financiar atividades de pesquisa preservando a independência
na definição e tratamento dos
problemas. Mas, no estágio de desenvolvimento alcançado pelo
Brasil, já existem recursos para
apoiar o desenvolvimento do ensino e da pesquisa. O que falta
muitas vezes é a disposição de
inovar e usar a imaginação, observa Furtado.
Diante do fracasso evidente das
políticas econômicas dos últimos
dez anos, inspiradas por enganosos "consensos" internacionais, a
voz de Celso Furtado se fará ouvir
com mais força e clareza. Os economistas brasileiros têm todas as
razões para voltar a pensar com
independência, retomando a
preocupação com os problemas
do Brasil e do seu povo.
Não é pedir muito. Afinal, como
recorda Furtado, "o perigo já não
é o da fogueira, como na época de
Galileu, mas o de deixar-se corromper ou seduzir por prebendas".
Paulo Nogueira Batista Jr., 45, economista e professor da Fundação Getúlio
Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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