São Paulo, domingo, 28 de junho de 1998

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CRISE ASIÁTICA
Recessão provoca dispensa de 21 mil entre 175 mil descendentes de japoneses que foram do Brasil para lá
Dekasseguis viram sem-teto no Japão

MARCIO AITH
de Tóquio e de Hamamatsu

Eles saíram do Brasil para acumular poupança, mas foram atropelados pela maior turbulência econômica japonesa desde a crise do petróleo, em 1974-75.
Nos últimos 12 meses, a recessão no Japão provocou a demissão de 21 mil dos 175 mil dekasseguis brasileiros que trabalhavam como operários nos setores automobilístico, eletroeletrônico e de alimentação.
Famílias inteiras de brasileiros estão desempregadas e viraram sem-teto do outro lado do mundo, disputando espaço debaixo de pontes em cidades industriais como Hamamatsu ou nas estações de Shinjuku e de Ueno, na capital, Tóquio.
A crise está mudando o perfil de uma comunidade na qual até 1995 não havia desemprego e compunha uma força de trabalho disputada "a tapa" por fornecedoras de componentes para grandes companhias como Nissan, Sony, Canon, Sanyo e NEC.
"Só quero dinheiro para comprar minha passagem de volta", diz Cícero T., paulista de 35 anos, neto de japoneses demitido de uma indústria de autopeças na Província de Shizuoka, a 300 quilômetros de Tóquio. "Achei que fosse enriquecer e encontrei o inferno", afirmou.
Junto com sua mulher -grávida de quatro meses- e com outros 17 brasileiros, Cícero mora junto de um rio canalizado que serve de esgoto no centro de Hamamatsu.

Fim do sonho
"A época de ouro dos nikkeis acabou", disse à Folha Hiroshi Nomura, gerente do centro de estabilização de empregos do Japão, administrado pelo Ministério do Trabalho. "Faço um apelo para que os brasileiros parem de vir. Não há mais empregos", disse ele.
As ofertas de empregos para nikkeis -descendentes de japoneses nascidos no exterior- despencaram de 354 por mês para 80. Os empregos à disposição oferecem metade da remuneração que os brasileiros estavam acostumados a ganhar. Além disso, passaram a ser disputados por coreanos, tailandeses e malaios trabalhando ilegalmente e dispostos a fazer qualquer coisa para fugir da crise em seus países.

Salários caem
Os brasileiros que conseguiram manter seus postos de trabalho deixaram de ganhar horas extras e foram obrigados a aceitar a redução de seus salários. Recebem hoje, no máximo, 1.300 ienes por hora nas mesmas funções nas quais ganhavam 1.500 ienes há dois anos. As brasileiras ganhavam 1.200 ienes por hora de trabalho e se contentam agora com 1.000.
A desvalorização do iene no último ano reduziu ainda mais o valor de seus salários em dólar. Há dois anos, os dekasseguis ajudavam o governo brasileiro a fechar suas contas externas com remessas de US$ 2 bilhões. Estima-se que, em 1998, o valor não ultrapasse US$ 1,2 bilhão.




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