São Paulo, domingo, 28 de junho de 1998

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LUÍS NASSIF
A competição da gasolina

No último mês ocorreu um episódio inédito no mercado de distribuidores de combustíveis. A Esso vendeu combustível a seus postos pelo preço de tabela. Depois, entregou a alguns deles cheques, representando desconto sobre o preço acertado.
Pela primeira vez rompia-se o acordo de preços e de mercado que historicamente marcou o controle do mercado brasileiro de combustíveis pelas cinco grandes distribuidoras: BR Distribuidora, Ipiranga, Shell, Texaco e Esso.
O que levou a essa situação foi o surgimento de dezenas de distribuidores independentes, competindo em nível de mercado, como conseqüência da desregulamentação do setor, iniciada ainda no governo Collor.
Hoje, reunidas em uma associação de classe, 25 companhias independentes, distribuídas em 8 Estados, respondem por 17% do mercado, com faturamento de US$ 1,7 bilhão e investimentos da ordem de US$ 180 milhões. Atendem a mais de 2 mil postos (a Esso tem 5.500 postos, e a Petrobrás, 8.000), têm 1.600 empregos diretos e presumíveis 8.500 indiretos.
A desregulamentação marcou o início efetivo da competição no setor. Mas a ela se atribui também um descontrole, com a ampliação de gasolina adulterada e sonegação de impostos.
Início da liberação
Antes da desregulamentação, esse era um dos mercados mais cartoriais do país. A distribuidora fazia estudos de mercado e identificava áreas para a instalação de postos. Em seguida selecionava o candidato a dono de posto e o financiava, em troca de contratos de exclusividade de dez anos. Pelo contrato, o dono comprometia-se a vender determinado volume de litros por mês.
Com o tempo, o dono do posto percebia que a demanda estava subestimada. Tinha que continuar adquirindo da distribuidora inicial, mesmo acima da cota inicialmente fixada, passando a arcar sozinho com o investimento adicional necessário.
Quando o mercado foi desregulamentado, as novas distribuidoras passaram a operar sobre essa cota de suplementação, extra-acordo. Hoje em dia, esse excedente representa 40% do mercado. Nos próximos três anos, deverá representar de 60% a 70%. O percentual tende a crescer porque os postos não estão renovando mais os contratos de exclusividade aos quais estavam amarrados.
Início da competição
Quando teve início a desregulamentação, as primeiras dificuldades surgiram no âmbito do Departamento Nacional de Combustíveis (DNC), com uma série de diretores entrando e tentando alterar a legislação, para refazer a situação anterior.
O novo sindicato procurou o ministro das Minas e Energia, Raimundo Brito, avisando que o mercado poderia se cartelizar novamente. De início, a luta foi desigual.
Na maior parte, as novas distribuidoras surgiram dos retalhistas, o segmento do comércio de combustíveis que vende "picado" para empresas e transportadoras. Em geral, é um povo batalhador, mas sem grande verniz político e sem relacionamentos maiores. Nas reuniões às quais compareciam, no Ministério das Minas e Energia, os presidentes das grandes distribuidoras entravam acompanhados do vice-presidente da República, Marco Maciel, do PFL, partido que indicou o ministro Raimundo Brito.
O ministro demonstrou correção no processo. Disse que revogaria a portaria se o setor provasse que não haveria sonegação, nem consumidor seria enganado por misturas e falsificações.
Como a sede do sindicato é em Curitiba, seus diretores procuraram o governador Jaime Lerner e propuseram a substituição tributária: isto é, o imposto ser recolhido na própria refinaria. Lerner concordou.
Falsificação
O segundo desafio era a questão da falsificação de combustíveis. O sindicato montou uma pesquisa nacional que demonstrou que apenas 2% dos consumidores buscavam o posto de acordo com a bandeira. A maioria absoluta buscava por proximidade ou por conhecimento do dono. Logo, o ponto de fiscalização deveria ser o posto.
Quinze dias depois, em janeiro de 1997, a portaria que retornava à situação anterior foi revogada por Brito, e a competição se implantou derrubando um cartório de 50 anos.
Os dois problemas que existem hoje -sonegação e adulteração-necessitam ser combatidos. A sonegação surge de distorções no processo judicial, com juízes de primeira instância concedendo liminares para que não haja a cobrança de impostos na própria refinaria. As denúncias saídas na imprensa têm inibido a ação desses juízes
Quanto à adulteração da gasolina, a decisão da Agência Nacional de Petróleo de impor multas de até R$ 5 milhões a postos autuados deverá reduzir sua incidência.

E-mail: lnassif@uol.com.br



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