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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Restrições ao meu otimismo
O custo pela acumulação de
reservas é alto, mas não tenho
dúvida de que não estamos
trocando seis por meia dúzia
NA SEMANA passada, expressei
neste espaço meu quase entusiasmo com o fato de o
Brasil ter se tornado uma nação credora com o exterior. Ao expressar
esse meu sentimento, sabia que iria
provocar reações contrárias em
muito de meus leitores. E elas realmente aconteceram. Excluídos os
leitores petistas, que sempre me
bombardeiam com ataques menos
civilizados, sobraram questionamentos inteligentes e pertinentes.
Vou tentar respondê-los na coluna
de hoje.
A questão mais importante levantada por leitores da Folha foi a do
crescimento da dívida interna -caríssima- por conta do acúmulo de
reservas. Como o governo federal
tem um déficit fiscal, o dinheiro para a compra dos dólares ofertados
no mercado de câmbio vem da
emissão de títulos da dívida interna. Dessa forma estaríamos, usando um dito popular, trocando seis
por meia dúzia e ainda pagando um
custo por conta do diferencial de
juros em reais e em dólares e da valorização do real. Caberia aqui, portanto, uma pergunta para mim: ESTÁ RINDO POR QUÊ?
A resposta a esse questionamento é simples, embora exija uma leitura cuidadosa da dinâmica econômica de hoje no Brasil. A força do
real, em razão de nossas reservas
de US$ 190 bilhões, está provocando uma verdadeira revolução no
mercado financeiro brasileiro. Investidores internacionais de peso
estão trazendo dinheiro para o
mercado de renda fixa, principalmente no segmento de prazos mais
longos. Temos hoje um mercado de
títulos privados de até 20 anos de
prazo. Com isso, temos -pela primeira vez na nossa história- uma
estrutura a termo de taxas de juros.
Dificilmente teríamos isso sem o
dinheiro de fora por conta da confiança na taxa de câmbio. Os anos
de chumbo da inflação deixaram
uma marca indelével no sistema
bancário brasileiro: operações de
curto prazo e indexadas à inflação.
São os investimentos de fora que
romperam com esse comportamento de bancos e investidores. Os
benefícios são enormes para a economia. Se hoje temos financiamentos ao consumidor de até seis anos
de prazo, é por conta desse mercado de títulos de longo prazo. O
mesmo acontece com o crédito às
empresas, criando uma força importante para chegar ao crescimento econômico que temos hoje.
Os custos pagos pela acumulação
de reservas são elevados, mas não
tenho dúvida de que, neste momento de transição de nossa economia, não estamos trocando seis
por meia dúzia ao acumularmos reservas. Existe um ganho expressivo
para nós, brasileiros, derivado da
redução da volatilidade da economia, que favorece o crescimento e a
arrecadação de impostos. Mesmo
com a continuidade do crescimento dos gastos públicos além do razoável, o déficit público continuará
caindo em 2008. A força da economia é tão clara que nem o fim da
CPMF foi capaz de afetar gravemente a arrecadação, como mostraram os dados da Receita Federal
referentes a janeiro.
Gostaria ainda de citar outro benefício que colhemos com essa
condição de país credor em relação
ao exterior: a incrível resistência
da economia mesmo em tempos
bicudos como o que estamos vivendo. A crise bancária no G7 ainda não chegou aqui por conta da
força de nossa situação externa. Há
riscos elevados no cenário externo,
mas o cenário mais provável para o
Brasil ainda parece ser o de crescimento próximo ao ritmo de 2007,
já que não há fuga de capitais nem
enfraquecimento da moeda.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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