São Paulo, sábado, 29 de abril de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA
Como anda a qualidade de nossos combustíveis?

LUIZ AUGUSTO HORTA NOGUEIRA

Considerando as dimensões e a população do Brasil, até que não é demais uma frota de 16 milhões de automóveis, abastecidos por mais de 27 mil postos revendedores.
Esses números servem para indicar o tamanho do mercado brasileiro e dão uma boa idéia do que significam os principais objetivos da Agência Nacional do Petróleo (ANP), na área de distribuição de combustíveis: regular e fiscalizar esse mercado, promover seu desenvolvimento saudável e garantir a defesa do consumidor.
Nesse sentido, a qualidade do combustível é um tema central, algumas vezes pouco entendido, mesmo porque temos vários tipos de combustível, inclusive o álcool etílico, que é empregado em praticamente todos os automóveis brasileiros.
Aproximadamente 3 milhões de veículos brasileiros usam álcool hidratado puro, enquanto outros 13 milhões queimam uma mistura de gasolina com 24% de álcool anidro.
Um outro fator que confunde o consumidor sobre as questões de qualidade dos combustíveis é a equivocada associação das distorções de mercado decorrentes de sonegação e liminares de caráter tributário com problemas efetivos de composição dos produtos. O primeiro grupo de distorções afeta os agentes do mercado e toda a sociedade, enquanto os problemas de adulteração afetam diretamente o consumidor.
Mas, afinal, o que significa "qualidade de um combustível"? Em essência, é sua capacidade para atender bem sua função de gerar energia em motores. Os parâmetros que definem a qualidade de um combustível são estabelecidos tendo em conta os equipamentos que o utilizam, seus impactos sobre o meio ambiente e as restrições dadas pelo parque de refino.
No caso brasileiro, essas especificações têm evoluído e atualmente a gasolina nacional tem qualidade comparável à gasolina européia. O álcool hidratado é um combustível sem similares em outros países, mas também é especificado pela legislação.
Para saber como anda a qualidade dos combustíveis no Brasil, a ANP tem estabelecido uma série de procedimentos e acompanhado os indicadores de conformidade desses combustíveis, principalmente sua densidade, no caso do álcool, e octanagem e teor de álcool, no caso da gasolina. Trata-se de defender o consumidor, buscando uma abordagem consistente.
Mais do que manter um exército de fiscais, optou-se por um amplo programa de monitoramento estatístico da qualidade, fundamentando ações tópicas de fiscalização. Em resumo, não se quer fiscalizar a esmo, sem rumo, mas de forma inteligente e com indícios concretos. Assim, a ANP decidiu descentralizar suas atividades e estabelecer convênios com universidades e instituições estaduais de pesquisa e desenvolvimento.
Essas atividades já tiveram seu início no Distrito Federal e em alguns Estados (São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro), estando por começar em diversos outros (Ceará, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio Grande do Norte). Até o momento tais convênios já cobrem 78% do mercado brasileiro, com previsão de amostragem anual em 19.344 postos de gasolina, o que significa cerca de 1.250 postos por semana. Esses postos são escolhidos de forma aleatória e o resultado do monitoramento é um verdadeiro mapa da qualidade dos combustíveis no Brasil, orientando as ações de fiscalização.
Em meados do ano passado, a ANP iniciou o monitoramento de qualidade em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Bahia, avaliando 13.279 amostras de gasolina, álcool e óleo diesel e chegando a alguns resultados interessantes.
Diferentemente do que talvez se pudesse imaginar, apenas 7,8% das amostras de gasolina apresentaram não-conformidade às especificações brasileiras, na maior parte dos casos com teores de álcool elevados. Quanto ao álcool hidratado, 4,9% das amostras apresentaram problemas, tipicamente quanto ao teor alcóolico. E, com relação ao diesel, 3,7% das amostras mostraram-se fora da conformidade, em sua maioria por problema de cor, o que indica mistura com frações mais pesadas. Tais distorções levaram a 1.749 autuações em postos revendedores e 323 em distribuidoras, com a aplicação de multas totalizando R$ 4,1 milhões.
Para reforçar a capacitação das universidades e instituições de pesquisa no acompanhamento da qualidade do combustível, a ANP está lançando um edital para equipar laboratórios e fomentar tecnologias nesse campo e, a partir de abril, deverá publicar a portaria ANP 197/99, que, além de definir uma especificação mais completa para a gasolina brasileira, estabelece uma sistemática para a "rastreabilidade da qualidade", comprometendo distribuidoras e revendedores de forma inequívoca quanto à qualidade do produto que comercializam.
As empresas que encaram com seriedade seus consumidores já estão se adequando para cumprir essas determinações. O consumidor também pode ser um agente importante: os postos são obrigados a fazer testes de qualidade sempre que receberem os produtos ou forem solicitados por seus clientes. Isso é muito importante, pois o excesso no teor de álcool, a fraude mais comum na gasolina, pode ser facilmente avaliada por um teste rápido e simples no próprio posto.
Com essas medidas, a ANP acredita estar trabalhando para o desenvolvimento saudável da indústria do petróleo no Brasil. Isso implica, no país, empresas concorrendo de forma justa e consumidores bem atendidos, inclusive em qualidade. O monitoramento estatístico dos produtos é uma ferramenta importante para subsidiar as ações de fiscalização e nessa direção temos orientado nossos esforços. E os primeiros indicadores mostram o acerto do modelo adotado.
O que buscamos na distribuição dos combustíveis são resultados consistentes e consolidados, em coerência com os sucessos que a ANP já tem obtido na promoção do novo marco para a exploração e o desenvolvimento do petróleo e gás natural no Brasil.


Luiz Augusto Horta Nogueira, 43, engenheiro mecânico, é diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP).


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