São Paulo, segunda-feira, 29 de maio de 2000


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MERCADO CAMBIAL

Elevação de 0,5 ponto percentual de juros dos EUA indica que país não pretende socorrer moeda européia

Política do dólar despreza baixa do euro


PIERRE-ANTOINE DELHOMMAIS
DO "LE MONDE"

Ao optar por elevar, por meio de uma forte alta de 0,5 ponto percentual na taxa de juros de referência, a remuneração sobre os investimentos em dólar, o Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) indicou claramente que os Estados Unidos não pretendiam fazer o menor gesto de socorro à moeda européia, ajudando-a a recuperar parte de seu valor.
Assim que o Fed anunciou sua decisão, o euro voltou a cair diante do dólar.
Uma alta mais limitada dos juros (0,25 ponto percentual) poderia ter aliviado a situação do euro e reduzido as pressões de baixas que existem sobre ele. Mas o Fed rejeitou essa opção, porque suas preocupação interna -conter o crescimento econômico norte-americano- se sobrepôs às externas -a estabilização do mercado mundial de câmbio.
A atitude do Fed prova a que ponto a cooperação cambial internacional está em pane hoje em dia.
A criação do euro, em tese, deveria ter gerado uma maior coordenação entre as três grandes zonas monetárias (Estados Unidos, Europa e Japão).
Mas o antigo projeto nipo-europeu de criar metas cambiais coordenadas que enquadrariam as flutuações do euro, do dólar e do iene foi rapidamente abandonado diante da reticência do Banco Central Europeu (BCE) e, acima de tudo, da hostilidade declarada da Casa Branca à idéia.
Um ano e meio após o lançamento do euro, a colaboração no mercado de câmbio se reduziu à sua mais simples expressão, a dos comunicados públicos conjuntos lançados durante as reuniões dos ministros das Finanças do G-7 (grupo dos sete países mais ricos do mundo). Trata-se de comunicados minimalistas, que se contentam em mencionar a firmeza do iene sem tocar no mergulho do euro.
As autoridades norte-americanas, européias e japonesas não conseguem chegar a um acordo de intervenção conjunta no mercado de câmbio a fim de corrigir as anomalias atuais.
No ano passado, o Banco do Japão agiu sozinho e desperdiçou bilhões de dólares, em vão, para tentar limitar a valorização de sua divisa.
Nem o Fed nem o BCE levantaram um dedo sequer para ajudar os japoneses, e os norte-americanos, particularmente, diziam que a maneira mais eficiente de Tóquio reduzir o valor cambial do iene seria por meio da abertura de suas fronteiras aos produtos estrangeiros e da redução de seu superávit comercial.
Mas o fracasso da cooperação cambial parece ainda mais evidente no que tange ao euro. Não foi sem uma pontinha de satisfação que os japoneses, temerosos de ver o iene marginalizado no cenário mundial, assistiram aos problemas que a moeda unificada européia começou a sofrer depois de seu lançamento.

Egoísmo monetário
Os norte-americanos não se mostraram mais flexíveis. Se Felix Rohatyn, embaixador dos Estados Unidos em Paris, afirma diplomaticamente que "o euro é um grande sucesso" e que "a psicologia negativa em torno do euro não é merecida, se levarmos em conta a situação real da economia européia", o secretário do Tesouro, Lawrence Summers, se mostra mais severo.
Ele não cansa de explicar que a melhor maneira de os europeus recuperarem sua divisa seria proceder a uma reforma estrutural para estimular o crescimento na zona do euro e levá-lo a um nível mais próximo ao dos Estados Unidos. "Nossa abordagem se concentrou sempre nos parâmetros econômicos fundamentais e acreditamos que a longo prazo isso fará diferença", disse Summers.
Mas essa condenação moral do suposto arcaísmo da economia européia oculta mal as verdadeiras razões que a Casa Branca tem hoje, em plena campanha eleitoral, para estar feliz com a situação do mercado de câmbio.
Para conter a pressão inflacionária, continuar a financiar seu gigantesco déficit em conta corrente e atrair capitais externos ao seu território, para evitar, enfim, que Wall Street desabe, os Estados Unidos têm necessidade vital de um dólar forte, e, portanto, de um euro fraco.
"Intervenções para fazer com que o euro suba podem ter sucesso com a participação dos principais interessados, mas um deles, os Estados Unidos, opta por ficar de fora", declarou Hans Helmut Kotz, membro do conselho do Bundesbank (banco central alemão), acrescentando que Washington não tem qualquer interesse na queda da moeda norte-americana.
A despeito da vontade expressa publicamente pelos dirigentes do G-7 -cooperar de maneira mais estreita a fim de regulamentar melhor o sistema financeiro mundial-, o egoísmo monetário é hoje maior do que nunca. E corre o risco de se transformar em guerra aberta.


Tradução de Paulo Migliacci


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