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São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 2003

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Consumo familiar tem queda de 4%

LÁSZLÓ VARGA
DA REPORTAGEM LOCAL
JULIANA RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

O consumo das famílias no segundo trimestre deste ano teve uma retração de 4% em comparação com o primeiro trimestre, segundo divulgou ontem o IBGE. A diminuição é resultado do desemprego alto e das sucessivas quedas da renda do trabalhador.
Em relação ao segundo trimestre de 2002, a queda no consumo entre abril e junho foi de 7,1%. O que é recorde para o IBGE, que possui no seu banco de dados levantamentos sobre o assunto desde 1991.
Para especialistas em economia, psiquiatria e finanças pessoas, as consequências da retração no consumo geralmente são muito ruins. Há um aumento de depressões, o que leva muita gente a desistir de procurar emprego.
Por outro lado, existe uma busca por bens não-materiais, como o contato com amigos. O que pode trazer benefícios à sociabilidade das pessoas.

Depressões
O psiquiatra José Del-Fraro afirmou que 10% de seus pacientes atuais têm problemas com dívidas. Cerca de 3% possuem débitos acima de R$ 200 mil. "A busca por tratamento no meu consultório tem crescido muito, mas pouca gente possui condições de pagar os R$ 100 a R$ 150 que cobro por sessão", disse Del-Fraro.
Ele afirmou que o número de pessoas que buscam soluções mágicas para seus problemas, como ganhar nos bingos, cresceu muito. O que acaba em vício. Várias entidades de auxílio a essas pessoas têm sido abertas em diversas cidades do país.
O consumo de antidepressivos também cresceu. "Mas eles apenas reequilibram os neurotransmissores. Não representam a solução para os pacientes", disse Del-Fraro.
Segundo ele, muitas pessoas entram em depressão com as dificuldades econômicas porque a sociedade brasileira é capitalista e valoriza o sucesso profissional e a aquisição de bens.
"Quem não tem uma visão crítica do mundo que vive ou possui uma psique mais frágil tem maior propensão a entrar em depressão", afirmou Del-Fraro.
Para o economista Eduardo Giannetti da Fonseca, a redução na renda familiar leva inevitavelmente a conflitos familiares. "Os membros da família precisam decidir o que cortar nos gastos para se adequarem ao novo orçamento. O que leva a conflitos. Se não fizerem isso rápido, os conflitos serão piores, pois a família já estará endividada", disse Giannetti.
O economista afirmou, no entanto, que a falta de dinheiro pode levar também as pessoas a visitarem os amigos, em vez de jantarem fora. Ou procurarem passatempos gratuitos.
"Esse é um lado positivo da crise", disse o economista. Na sua opinião, as pessoas podem ficar mais sociáveis e menos ligadas a bens materiais.
Para Erasmo Vieira, administrador de empresas e especialista em finanças pessoais, a retração econômica pode ter um efeito mais pesado nas pessoas pessimistas.
"Com as notícias ruins, os pessimistas tendem a desistir de procurar vagas. Os mais otimistas mantêm a rede de contatos e têm mais chances de arrumar um emprego", disse Vieira.
Segundo ele, o problema do endividamento começa a pesar na avaliação que as empresas fazem de candidatos para o preenchimento de vagas.
"As companhias começam a consultar cadastros de inadimplentes antes de contratar. O dono de uma empresa não quer um administrador que não soube cuidar das próprias contas pessoais", disse Vieira.

Contenção
Salvador Werneck, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), afirma que a retração no consumo pode ser também um sinal de que as pessoas deixaram de comprar porque previam que as taxas de juros para financiamento iriam diminuir, como aconteceu de fato a partir de julho.
"É natural que no cenário de retração econômica as famílias fiquem mais precavidas. O consumo dos supérfluos certamente tem uma queda maior, já que a prioridade é a alimentação, o transporte e o vestuário", afirmou Werneck.
O economista Marcelo Neri, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), concorda. "Se existe uma expectativa de queda dos juros, é melhor deixar o dinheiro aplicado do que se endividar no crediário."


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