São Paulo, terça-feira, 29 de agosto de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Indústria manca, China e real forte

Dólar barato atrapalha, mas exportações asiáticas para o Brasil têm crescido mais do que a média de outros países

A INDÚSTRIA está manca, na avaliação de dois experimentados analistas da economia brasileira, Antônio Barros de Castro e José Roberto Mendonça de Barros. Nos dois anos menos anormais do pós-Real, 2000 e 2004, quando o país cresceu mais de 4%, quase todos os setores da indústria estavam no azul, cerca de 80% a 90%. No ano da indústria manca de 2006, esse índice cai pela metade, segundo estudo de Castro e de Francisco Pires de Souza. Mendonça de Barros e a economista Lídia Goldenstein apresentaram diagnóstico parecido em palestra no Cebrap, na sexta passada.
Por que a indústria estaria manca?
Isto é, qual o motivo de alguns setores darem um passo grande e os demais se arrastarem? O Grupo de Conjuntura econômica da UFRJ, cauteloso sobre o câmbio até julho, na análise publicada ontem já aponta a canelada do câmbio na desaceleração industrial deste ano.
Mas a canelada maior vem das importações da China, que cresceram 50% no semestre. As que vêm da União Européia (UE) cresceram 7,5%. As da América do Norte, 12%.
Logo, só o câmbio não explica a invasão chinesa, embora a estratégia planejada e bem-sucedida da indústria chinesa receba no Brasil o auxílio adicional do real forte.
As compras do Brasil na China e na Coréia do Sul ainda são um terço das importações que vêm da UE e do Nafta. Mas, em dólares, a alta das importações asiáticas já é maior que a das compras nos mercados americano e europeu somados.
Para piorar a situação doméstica, a quantidade de produtos exportada cresce mais devagar. Em 2005, a exportação avançava graças ao efeito combinado e quase igual do aumento de preço e quantidades vendidas. Agora, os preços seriam responsáveis por 70% do aumento das vendas. Como os ganhos de preços estão concentrados em alguns setores, como minérios, petroquímicos, álcool e açúcar, isso ajuda ainda a explicar parte da concentração industrial.
Outra vítima inédita da perda de competitividade em 2006, apontam Castro e Pires de Souza, é a indústria de máquinas e instalações para indústria. A indústria de bens de capital que se mantém sobre as duas pernas é a que produz para setores como mineração, petróleo e álcool, responsáveis por mais de um terço do crescimento industrial este ano. Outro terço do crescimento deveu-se ao desempenho de máquinas e aparelhos elétricos e computadores, muito dependentes de importação de componentes, ora bem baratos.
Economistas de banco observam que o ano ainda vai pela metade e que o segundo trimestre de 2006 foi atípico devido a Copa, greves no setor público que atrapalharam a indústria e ataques do PCC. Os indicadores que antecipam a atividade das fábricas em julho já mostrariam a inversão da tendência ruim.
Pires de Souza reconhece a influência desses fatores e que a ainda não se pode afirmar que é certa a tendência de concentração: que poucos setores industriais sobreviveriam fortes ao aumento da competição. Mas reafirma que os dados do semestre são preocupantes e mais fortes que os fatores conjunturais de junho e, que, China e câmbio, em proporções ainda não bem conhecidas, têm colocado parte da indústria nacional para escanteio.


vinit@uol.com.br

Texto Anterior: Avaliação: Carga tributária alta afasta grau de investimento, vê S&P
Próximo Texto: Tesouro não vê risco de crise fiscal em 2007
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.