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VINICIUS TORRES FREIRE
A mira está nos bancos
Ações dos maiores bancos dos EUA estão no vermelho neste ano; balanço de perdas vai dar medida da crise
O QUE CAIU MAIS? O preço das
casas nos Estados Unidos ou
as ações dos bancos? O preço
das casas caiu 3,2%, pior resultado
em 20 anos. Mas as ações de bancos
na Bolsa americana caíram duas,
três, dez vezes mais neste ano. Analistas da Merrill Lynch tiraram a recomendação de compra de ações do
Lehman Brothers, Bear Stearns e
Citi (aliás, seus concorrentes).
O rumor de ontem era sobre bancos e a quantidade de papéis podres
que cada um deles vai ter de reconhecer de público. A depender da
quantidade de "lixo tóxico" que será
incorporada na contabilidade, a crise pode engrossar. Por quê?
A crise do "subprime" (dos calotes
nos empréstimos de segunda linha)
desde o início não era bem uma crise
do mercado imobiliário, ou não era
só isso. Claro que foi preciso um aumento de inadimplência para que o
problema deslanchasse. Mas não
haveria tanto empréstimo ruim se
os bancos não tivessem aberto as
comportas de dinheiro para o negócio de venda de casas.
Como se sabe, os bancos repassaram tais empréstimos adiante, vendendo títulos que, grosso modo, rendiam algo equivalente às prestações
do imóvel. Como o rendimento desses títulos parecia bom e seu risco
parecia baixo, os bancos como que
canalizaram a fome de rentabilidade
e a baixa aversão ao risco para o negócio de venda de casas, realimentando a bolha imobiliária.
Os bancos livravam-se assim de
parte do risco (de calote) e, de quebra, não limitavam sua capacidade
de conceder mais empréstimos. Outros derivativos de crédito foram
criados a partir desses títulos lastreados em hipotecas e essa parte do
estouro já é mais conhecida.
O problema é que os bancos têm
outros esquemas para negociar no
mercado de crédito sem que, a princípio, essa movimentação apareça
no balanço e, assim, limite o seu capital legalmente disponível para
empréstimos. Uma dessas estratégias financeiras é criar entidades, os
"conduits", que, por exemplo, vendem "commercial papers" (captam
dinheiro por meio dessas notas promissórias) e empregam os recursos
na compra de títulos garantidos por
hipotecas, prestação de carro, dívidas de cartão de crédito etc. A idéia é
ganhar com a diferença de rendimento entre os papéis vendidos e os
comprados pelo "conduit".
Como se espalhou o receio de investir em títulos garantidos por dívidas e outros recebíveis, bancos ficaram com uma dívida (os "commercial papers") que por vezes não conseguem rolar e com ativos que valem
pouco ou nada. Como patrocinadores do "conduit", teriam de cobrir o
eventual prejuízo ou incorporar o
negócio todo no seu balanço, o que
tende a estreitar a disponibilidade
de capital do banco, com impacto
em juros e na oferta de crédito.
Outro risco de mico está nos empréstimos recentes que os bancos fizeram às firmas de "private equity".
Os bancos também não carregavam
esses empréstimos: repassavam-nos na forma de títulos. Com a crise,
os investidores ficaram receosos de
comprá-los; os bancos ficaram com
os empréstimos na mão, em meio a
uma desvalorização geral de ativos.
Mês que vem começam a aparecer
estimativas de perdas dos bancos e
de preço de papéis micados, o que
pode dar uma dimensão da crise.
vinit@uol.com.br
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