São Paulo, quarta-feira, 29 de agosto de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

A mira está nos bancos

Ações dos maiores bancos dos EUA estão no vermelho neste ano; balanço de perdas vai dar medida da crise

O QUE CAIU MAIS? O preço das casas nos Estados Unidos ou as ações dos bancos? O preço das casas caiu 3,2%, pior resultado em 20 anos. Mas as ações de bancos na Bolsa americana caíram duas, três, dez vezes mais neste ano. Analistas da Merrill Lynch tiraram a recomendação de compra de ações do Lehman Brothers, Bear Stearns e Citi (aliás, seus concorrentes).
O rumor de ontem era sobre bancos e a quantidade de papéis podres que cada um deles vai ter de reconhecer de público. A depender da quantidade de "lixo tóxico" que será incorporada na contabilidade, a crise pode engrossar. Por quê?
A crise do "subprime" (dos calotes nos empréstimos de segunda linha) desde o início não era bem uma crise do mercado imobiliário, ou não era só isso. Claro que foi preciso um aumento de inadimplência para que o problema deslanchasse. Mas não haveria tanto empréstimo ruim se os bancos não tivessem aberto as comportas de dinheiro para o negócio de venda de casas.
Como se sabe, os bancos repassaram tais empréstimos adiante, vendendo títulos que, grosso modo, rendiam algo equivalente às prestações do imóvel. Como o rendimento desses títulos parecia bom e seu risco parecia baixo, os bancos como que canalizaram a fome de rentabilidade e a baixa aversão ao risco para o negócio de venda de casas, realimentando a bolha imobiliária.
Os bancos livravam-se assim de parte do risco (de calote) e, de quebra, não limitavam sua capacidade de conceder mais empréstimos. Outros derivativos de crédito foram criados a partir desses títulos lastreados em hipotecas e essa parte do estouro já é mais conhecida.
O problema é que os bancos têm outros esquemas para negociar no mercado de crédito sem que, a princípio, essa movimentação apareça no balanço e, assim, limite o seu capital legalmente disponível para empréstimos. Uma dessas estratégias financeiras é criar entidades, os "conduits", que, por exemplo, vendem "commercial papers" (captam dinheiro por meio dessas notas promissórias) e empregam os recursos na compra de títulos garantidos por hipotecas, prestação de carro, dívidas de cartão de crédito etc. A idéia é ganhar com a diferença de rendimento entre os papéis vendidos e os comprados pelo "conduit".
Como se espalhou o receio de investir em títulos garantidos por dívidas e outros recebíveis, bancos ficaram com uma dívida (os "commercial papers") que por vezes não conseguem rolar e com ativos que valem pouco ou nada. Como patrocinadores do "conduit", teriam de cobrir o eventual prejuízo ou incorporar o negócio todo no seu balanço, o que tende a estreitar a disponibilidade de capital do banco, com impacto em juros e na oferta de crédito.
Outro risco de mico está nos empréstimos recentes que os bancos fizeram às firmas de "private equity". Os bancos também não carregavam esses empréstimos: repassavam-nos na forma de títulos. Com a crise, os investidores ficaram receosos de comprá-los; os bancos ficaram com os empréstimos na mão, em meio a uma desvalorização geral de ativos.
Mês que vem começam a aparecer estimativas de perdas dos bancos e de preço de papéis micados, o que pode dar uma dimensão da crise.


vinit@uol.com.br

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