São Paulo, Domingo, 29 de Agosto de 1999
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COMBUSTÍVEIS
Cálculo do custo para reparar os estragos decorrentes de vazamentos é considerado conservador
Postos têm dívida ambiental de R$ 3 bi

LUCIA REGGIANI
da Reportagem Local


Uma conta de pelo menos R$ 3 bilhões mantém acesa a guerra da gasolina. É o passivo ambiental, o preço para consertar o estrago feito no solo e na água subterrânea pelos vazamentos de combustível nos postos de serviços, decorrentes de deficiências em instalação, manutenção, operação e fiscalização de tanques e outros equipamentos.
O cálculo é conservador, dada a escassez de estatísticas, e baseia-se em dados do Contru (Departamento de Controle e Uso de Imóveis), órgão da Prefeitura de São Paulo, da EPA, a agência de controle ambiental dos Estados Unidos, e de consultores, distribuidores e revendedores do setor.
Dos 2.098 postos de combustíveis de São Paulo mapeados neste ano pelo Contru, 56% apresentaram irregularidades, e de 20% a 25%, risco de explosão por causa de vazamento. Pelo levantamento do órgão, 70% dos tanques instalados nos postos têm mais de dez anos e já estariam precisando ser substituídos.
O custo da troca, considerando a média de cinco tanques de 15 mil litros por estabelecimento, seria da ordem de R$ 80 mil por posto, nos cálculos do Sindicom (Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes) e da Esso. Só a troca de tanques em 70% dos 25 mil postos do país custaria R$ 1,4 bilhão (US$ 721 milhões).
O preço da recuperação ambiental toma dados da EPA como referência. A agência norte-americana calcula em US$ 125 mil o valor da extração do combustível e o tratamento do solo na área de um posto e nas circunvizinhas. Considerando vazamento em 20% dos postos do país (5.000), a conta é acrescida de R$ 1,2 bilhão (US$ 625 milhões).
Se houver contaminação da água subterrânea, a limpeza vai custar outros US$ 100 mil a US$ 1 milhão por posto. E a conta ganha mais R$ 970 milhões (US$ 500 milhões), no mínimo, fechando em R$ 3,57 bilhões (US$ 1,85 bilhão).
Postos e distribuidoras divergem sobre o tamanho e o custo do problema. As distribuidoras, proprietárias da maioria dos tanques e responsáveis pela instalação e manutenção dos seus equipamentos, acham que é pequeno.
"No máximo, 1% dos postos do país tem vazamento", estima Marcos Lourenço Ferreira, coordenador de segurança, saúde e meio ambiente do Sindicom. "Para o Brasil, 1% é acidente", diz.
Já o Recom, sindicato que reúne os revendedores de combustíveis da cidade de São Paulo, avaliza os dados do Contru e calcula o passivo ambiental em R$ 1 milhão por posto, R$ 25 bilhões no país.
O sindicato teme que essa conta venha a estourar nas mãos do revendedor num momento em que as margens estão apertadas pela guerra de preços e há uma reestruturação do setor a caminho, que prevê a entrada das distribuidoras na venda ao consumidor.
O temor do Recom vem de uma portaria da ANP (Agência Nacional do Petróleo), que suprimiu da regulamentação anterior a obrigação de as distribuidoras prestarem assistência técnica nos equipamentos em comodato. O sindicato até entrou com ação na Justiça Federal, pedindo a restauração da portaria anterior.
Na ação, o sindicato afirma que as distribuidoras esperam vencer o contrato de comodato e doam ou vendem barato os tanques aos revendedores, desobrigando-se do passivo ambiental.
Para Marcos Ferreira, do Sindicom, a leis federais ambientais são fortes o bastante para assegurar a responsabilidade das distribuidoras "independentemente de constar na portaria da ANP. O que ocorre são casos pontuais, que dão uma dimensão ao problema que não é verdadeira".
Mas os números da Cetesb, agência ambiental paulista, indicam que a poluição causada por vazamentos em postos é frequente. Problemas como o aparecimento de gasolina em garagens de edifícios e caixas subterrâneas da tefone surgiram de 30 postos no Estado em 1996, 33 em 1997, 34 em 1998 e 23 de janeiro a maio de 1999, 15% a mais do que no mesmo período do ano anterior.
"Esse é o maior problema ambiental dos centros urbanos e a solução é complexa", afirma Alexandre Maximiano, geólogo da Waterloo Hydrogeologic, empresa canadense especializada em avaliação de risco ambiental.
Nos EUA, diz o geólogo, do 1,1 milhão de tanques de combustível subterrâneos existentes até 1995, 318 mil (29%) vazaram. No Brasil, ele acredita que a contaminação do solo e da água sejam maiores do que nos EUA, dada uma série de fatores geológicos peculiares do país.
Do lado da fiscalização, não há trabalho preventivo. Contru e Cetesb são acionados depois de o vazamento acontecer. Aos postos cabe monitorar o estoque de combustíveis diariamente e enviar laudo mensal à ANP.
Em São Paulo, uma lei obriga os postos a fazer teste anual de estanqueidade, mas não há garantia de que esteja sendo feito direito. Projeto de lei abrangente, que prevê a troca dos tanques, tramita há um ano na Câmara Municipal.














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