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ANÁLISE
Processo deverá mudar a indústria
RODOLFO LUCENA
Editor de Informática
A Microsoft será dividida? Seu
poderio será controlado? Ou o julgamento do século -na área de
informática- vai terminar em
pizza? Qualquer que seja o resultado, a ação do Departamento de
Justiça contra a Microsoft vai mudar o mundo da informática e o
comportamento das empresas
norte-americanas em geral.
A primeira mudança, que pode
ser chamada de comportamental-administrativa, se refere à política
sobre uso de e-mails.
As mensagens eletrônicas estão
sendo usadas como armas afiadas
durante o julgamento. Governo e
Microsoft foram cavoucar nos arquivos dos
computadores
das empresas
envolvidas,
conseguindo
recuperar textos com linguagem dura,
agressiva, que
não eram destinados à leitura por olhos
adversários.
As empresas
e seus funcionários passam
a saber que a tradicional advertência feita pela polícia norte-americana ao deter suspeitos de algum
crime pode ter nova leitura: "Tudo
o que você escrever em seus e-mails pode ser e será usado contra
você".
Outra lição para a indústria de alta tecnologia norte-americana,
cheia de compras e fusões, é que o
governo está olhando. Outras
companhias que dominam mercados, como a Intel, estão sob observação. E cada negócio importante
em qualquer setor será analisado
sob a ótica da legislação antitruste.
Resultados do julgamento
Essas são consequências comportamentais. E as reais? O que o
juiz Thomas Penfield Jackson vai
dizer antes de bater o martelo?
Pode acabar tudo em pizza. A
Microsoft, aliás, está usando o recente anúncio da compra da Netscape pela America Online para pedir o arquivamento imediato do
processo, que teria perdido qualquer sentido.
Mesmo com o julgamento seguindo -o que deve acontecer-,
a Microsoft pode vencer.
Isso, evidentemente, vai colocar
a empresa, que já tem tentáculos
nas mais diversas áreas -TV a cabo e transmissão de dados por satélite, por exemplo-, numa posição de ainda maior força.
Pode se arriscar em novos mercados e manter a política de concorrência agressiva que é sua marca registrada.
Do ponto de vista técnico, poderá "enriquecer" ainda mais seu
produto principal, o sistema operacional "Windows", que é o
responsável
pelo controle
das operações
básicas do
computador
(faz o computador "entender", por
exemplo, o que
significa imprimir, arquivar um texto
etc.).
E pode vir a
dominar completamente a Internet, temem seus adversários, aproveitando como arma o poder que
tem com o "Windows", que equipa
mais de 90% dos computadores
pessoais vendidos no mundo.
Se ela perder, porém, deve se tornar menos agressiva, mais cautelosa na entrada em novos mercados.
Mas não deve perder o domínio
que tem na área de sistemas operacionais.
O fim da Microsoft
Uma eventual derrota da Microsoft pode ter vários tons.
A maior parte dos analistas de
mercado ouvidos pela imprensa
norte-americana não acredita em
soluções muito dramáticas.
Apostam, sim, que a Justiça vai
procurar definir medidas para reduzir o poder de pressão que a Microsoft tem e aumentar a concorrência.
Ela poderia ser obrigada a divulgar os códigos que fazem com que
os programas funcionem em harmonia com o "Windows".
Isso facilitaria muito a vida de
empresas que produzem jogos,
processadores de texto ou programas de cálculos.
Em termos práticos, porém, teria
pouco efeito, porque a Microsoft
costuma divulgar esses códigos
-chamados API, sigla em inglês
para interface de programa aplicativo- e a empresa poderia continuar a empacotar seus jogos e programas com o "Windows".
Outra opção seria obrigar a Microsoft a licenciar o código-fonte
do "Windows", a planta baixa do
programa. Com o código, outras
empresas poderiam criar
suas versões do
sistema, montando seus
próprios pacotes.
A outra face
da moeda dessa última opção é proibir a
empresa de incluir no "Windows" outras
funções ou recursos além
dos básicos. O que leva a uma complicada e inacabável discussão técnica sobre onde acaba o sistema
operacional e onde começa o aplicativo.
Mas a decisão mais dramática,
que efetivamente eletriza a platéia,
é a possibilidade de a Microsoft ser
desmembrada. Todos dizem que
isso é remoto, mas cada especialista e mesmo os concorrentes têm
suas visões de como poderia ser a
divisão.
Uma hipótese comentada é a divisão em três companhias, uma
cuidando da área de sistemas operacionais -a Microsoft Windows-, outra responsável pelos
aplicativos -a Microsoft Word ou
Microsoft Office- e a terceira, pelos negócios na Internet -a Microsoft Explorer (os nomes são
apenas exemplos, para deixar mais
clara a área atual que cada "baby
Microsoft" poderia ter).
Essa solução já foi usada no passado nos processos antitruste.
Mais de 80 anos atrás, a então toda-poderosa Standard Oil, que dominava as áreas de refino e distribuição de combustível, foi dividida em 34 empresas. Em 84, a
AT&T foi desmembrada em companhias regionais.
A solução nem sempre dá certo.
Em 82, o governo norte-americano
desistiu de um processo contra a
IBM, depois de tentar durante 13
anos desmembrar aquela que ainda hoje é a maior empresa de informática do mundo.
O que diz o povo
Nem os internautas, que costumam exalar um sentimento anti-Microsoft, cerram fileiras pela divisão da
empresa de
Gates.
Enquete feita
pela revista
"Time" na Internet teve
48,1% de votos
pró-divisão e
50,81% de votos contra.
Apesar da
grande participação, 29.648,
a enquete, como outras do gênero,
não tem valor científico, não representando um universo definido.
Mesmo sem respaldo sociológico, porém, essas enquetes podem
ser encaradas como indicadoras
-nem que seja apenas da opinião
dos votantes.
E ela é basicamente cética.
Enquete do jornal "San Jose Mercury News" teve 53,1% dos votantes acreditando que o processo
contra a Microsoft servirá como
incentivo à competição limpa na
Internet. Mas 41% acham que a
Microsoft não vai mudar suas práticas comerciais (contra 34% que
acham o contrário). Práticas anticompetitivas, segundo 57,7% de
uma enquete feita pelo diário
"USA Today". Ou seja, para eles, o
processo é positivo, mas não deve
alterar o curso das coisas.
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