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Setor vem sustentando o PIB do país nos últimos anos, mas suporte corre perigo em caso de estagnação
Agricultura pára se economia não crescer
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
A agropecuária sustentou a economia brasileira nos últimos
anos, mas esse suporte corre perigo se a atividade econômica como
um todo se mantiver estagnada.
Os números divulgados ontem
pelo IBGE sobre o desempenho
da agricultura no PIB (Produto
Interno Bruto) comprovam isso.
No primeiro trimestre do ano o
setor agropecuário cresceu 3,7%
em relação ao quarto trimestre de
2002. Em relação ao primeiro trimestre de 2002, o crescimento é
de 8,6%. Nos últimos 12 meses
(abril de 2002 a março deste ano),
houve aumento de 6,57% em relação aos 12 meses anteriores.
A agricultura brasileira tem espaço e competitividade para continuar crescendo, mas as condições favoráveis do mercado externo, encontradas nos últimos dois
anos, podem se esgotar.
Quando isso ocorrer, resta o
mercado interno para dar sustentação à agropecuária. Se a economia interna não retomar um bom
ritmo de crescimento, a agricultura também pára.
Após patinar por muitos anos
nos 80 milhões de toneladas de
grãos, a produção brasileira deslanchou nos últimos anos e poderá atingir 115 milhões de toneladas neste ano -mais 19% sobre
2002. A pecuária, embora encolhendo em algumas regiões, deu a
resposta via produtividade, e
mantém expansão de 4% ao ano.
Analistas do setor são unânimes
em dizer que este e o próximo ainda serão bons anos para a agropecuária. A partir de 2005, as coisas
podem se complicar para o setor,
a menos que questões internacionais sejam resolvidas e que haja
aumento da demanda interna.
"Maré muito boa"
O setor agropecuário foi fundamental na melhora das contas externas do país. Sem o bom desempenho do agronegócio, essas contas estariam em situação ainda
mais complicada do que a atual.
Dados da Conab indicam que nos
últimos dez anos o agronegócio
trouxe para o país um saldo líquido de US$ 147 bilhões. Até o final
deste ano, esse valor poderá atingir US$ 170 bilhões.
"A maré está muito boa e o setor
agrícola tem uma função extraordinária no momento porque dá
ao país os dólares de que precisa",
diz Guilherme Dias, economista
da Fipe (Fundação Instituto de
Pesquisas Econômicas) e da Universidade de São Paulo.
Dias diz, no entanto, que a agropecuária não pode crescer sozinha, e que é necessário um acompanhamento dos demais setores
da economia para dar maior poder aquisitivo à população e incentivo ao consumo.
Pedro de Camargo Neto, ex-secretário de Produção e Comercialização do governo FHC, diz que
"o setor agrícola não precisa gerar
manchete sempre", se referindo
ao bom desempenho dos últimos
anos. Mas o país precisa consolidar esse avanço, gerar melhor redistribuição de renda e aumentar
o consumo de alimentos.
Getúlio Pernambuco, da CNA
(Confederação da Agricultura e
Pecuária do Brasil), concorda que
o país precisa gerar demanda, e o
programa Fome Zero do governo
Lula traz novas perspectivas. Ele
diz que que esses programas deveriam ser constantes, e que são
muito usados em países desenvolvidos, inclusive nos EUA.
Pernambuco concorda com os
outros analistas e diz que "o país
precisa voltar a crescer" e que as
taxas anuais de evolução de 1,5%
para o PIB e de 8,5% do agronegócio estão muito distantes.
O crescimento do agronegócio é
muito importante para o Brasil,
que depende das exportações,
mas vai na contramão dos países
desenvolvidos, diz Joaquim Guilhoto, professor da Esalq/USP e
pesquisador do Cepea.
A agropecuária e o agronegócio
brasileiros participaram com 11%
e 29%, respectivamente, do PIB
no ano passado. Nos Estados Unidos, esses percentuais são bem
menores, mas há um crescimento
cada vez maior dos setores de
transformação dos produtos do
agronegócio por lá.
Mercado externo
O mercado interno é importante, mas o Brasil não deve descuidar do externo, principalmente
neste momento de importantes
definições para o futuro do agropecuário.
Cláudia Viegas, pesquisador da
Fipe e professora da FEA/USP, diz
que "o cenário de sustentabilidade implica manter o mercado externo, que esbarra nos subsídios,
cotas e outras tarifas". Para a economista, o Brasil já mostrou como conquistar o mercado externo, mas precisa ficar atento ao
"institucional" -ou seja, às negociações que ocorrem.
Amaryllis Romano, da consultoria Tendências, diz que o Brasil
avançou nos últimos anos no
mercado externo ocupando espaços deixados por outros países.
Quebra de safras e problemas fitossanitários em alguns países
abriram espaço aos produtos brasileiros.
Romano diz que a participação
brasileira no mercado externo vai
continuar boa porque os estoques
mundiais estão baixos e precisam
ser refeitos. Todos os analistas
concordam, no entanto, que, apesar de o cenário externo ser favorável agora, a participação brasileira no exterior vai desacelerar.
O Brasil é competitivo, mas os
países desenvolvidos estão criando novas barreiras, e os grandes
mercados, como China, Rússia e
Índia, também passaram a dar
prioridade à produção interna de
grãos e de carnes.
Dias alerta para outro detalhe.
Grande parte das receitas brasileiras vêm da soja, e o país precisa
estar preparado para quando
ocorrer uma desaceleração da demanda mundial do produto.
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