São Paulo, domingo, 30 de outubro de 2005

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ENTREVISTA

Secretário de Política Econômica espera aprovar projetos ainda neste ano

Fazenda prepara nova fase da agenda microeconômica

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O otimismo que move a equipe econômica levou o Ministério da Fazenda a preparar um novo conjunto de medidas para compor a chamada agenda microeconômica do governo. Em entrevista à Folha, o secretário de Política Econômica, Bernard Appy, disse que tal agenda é "dinâmica" e novas propostas estão no "forno".
Entre as medidas estão projetos que precisam passar pelo Congresso e outras mudanças que dispensam o aval dos parlamentares. Com a aprovação da MP 255, que incorporou a chamada "MP do Bem" e desonerou vários setores, o secretário crê que será possível tocar adiante a agenda de reformas institucionais, cujo objetivo é elevar a eficiência da economia.
A agenda foi lançada no final do ano passado em um documento preparado pela equipe do ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda). Desde então, pouco se avançou. Para o secretário, muitos dos projetos lá previstos podem ser aprovados neste ano e no próximo, restando ainda espaço para apresentar novas propostas ao Legislativo, apesar da crise política e das dificuldades decorrentes da disputa eleitoral de 2006.
Leia trechos da entrevista.
(JULIANNA SOFIA e SHEILA D'AMORIM)

Folha - A agenda microeconômica elaborada pela Fazenda -que inclui abertura do mercado de resseguros, reforma do sistema de defesa da concorrência e cadastro positivo- não andou. O sr. acha que pode ser aprovada no Congresso até o final do governo?
Bernard Appy -
Dois projetos tiveram um avanço relevante e estão praticamente prontos para serem votados: a abertura do mercado de resseguros [quebra do monopólio do IRB (Instituto de Resseguros do Brasil)] e o de normas contábeis [cria um órgão técnico privado para sugerir adequações nas normas contábeis aos padrões internacionais]. Até o final deste ano, há uma chance grande de votá-los na Câmara. Com relação ao cadastro positivo [bancos de dados com histórico de tomadores de crédito], que foi enviado recentemente, há uma perspectiva otimista de votá-lo até o final do ano que vem. O projeto que altera o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência é mais recente. Acho difícil aprová-lo até o final deste ano, mas, para 2006, a perspectiva é positiva.

Folha - O governo vai ter tempo de colher os frutos dessa agenda?
Appy -
A maior parte das mudanças tem impacto de longo prazo. O objetivo deste governo não é colher resultados imediatos. Todos esses projetos têm um efeito cumulativo positivo ao longo do tempo. Isolados, podem parecer ter alcance limitado, mas, no conjunto, acabam tendo efeito importante sobre a eficiência da economia, a criação de ambiente favorável para negócios e o ritmo de crescimento potencial. Mas a agenda microeconômica é dinâmica. É possível que novos projetos venham a surgir nos próximos meses. O que a gente conseguir votar até o final do ano que vem, ótimo. O que não conseguir fica para o próximo governo.

Folha - Que projetos são esses?
Appy -
São vários, mas não posso falar. São em várias áreas, inclusive na de mercado de capitais. A discussão ainda não foi fechada dentro do governo. A agenda continua sendo discutida, há projetos novos no forno. O grupo de trabalho de mercado de capitais continua trabalhando. Logo teremos resultados na linha de dar mais eficiência ao funcionamento do mercado e das agências de supervisão e fiscalização.

Folha - A idéia é anunciar um conjunto de medidas? Quando? A agenda não pode ser vista como se o governo estivesse levando em conta o ano eleitoral?
Appy -
Não cuido do "timing" do envio, mas algumas coisas podem sair neste ano. A disputa eleitoral já começou. Não adianta dizermos que não, porque ela está colocada desde o início da crise e está condicionando o trabalho do Congresso. O que não significa que não se possa avançar em projetos que são positivos. O próprio Congresso aprovou a MP 255 [redução de impostos] recuperando todos os dispositivos da MP 252 [chamada "MP do Bem"], que são positivos para o país. Acredito que propostas positivas para a economia tendem a ter boa receptividade no Congresso, mesmo em um ambiente mais tenso. Não são coisas incompatíveis.

Folha - Mas e o que aconteceu com a "MP do Bem"?
Appy -
A "MP do Bem" teve um problema de "timing". A votação ficou muito em cima do prazo final. Foi algo localizado. Não acredito que outras medidas positivas vão sofrer o que houve com a "MP do Bem". Ao contrário, acho que existe um espaço bastante razoável para andarem. Medidas mais polêmicas talvez tenham mais dificuldade. Nessa agenda que estamos discutindo, os projetos não são muito polêmicos.

Folha - O senhor não está muito otimista?
Appy -
Veja o caso da Lei de Falências. Havia interesses e pressões, mas o resultado final foi positivo. E é uma legislação extremamente complexa. O cadastro positivo, por exemplo, é bem mais simples e o tempo para um debate adequado é menor. No caso do mercado de resseguros, o projeto em si é simples. Não há muitos interesses por trás. Quem poderia estar interessado em o projeto não avançar seria o IRB. Agora, o presidente do IRB é Marcos Lisboa [ex-secretário de Política Econômica e um dos mentores do projeto]. Obviamente o IRB não vai criar problemas.

Folha - Há um foco nessa nova fase da agenda em que vocês estão trabalhando?
Appy -
Não. Há uma abrangência grande. Não é só um setor ou outro. Desde eficiência do mercado de capitais, reforço de garantias nas operações de crédito, o próprio desenho institucional de regulação dos setores e a parte de inovação. Também estamos participando da discussão da micro e pequena empresa.

Folha - A aprovação da "MP do Bem" abre caminho para votar outras medidas econômicas?
Appy -
Quando a pauta está obstruída, não há espaço para aprovar medidas que não sejam MPs. Agora, desobstruiu a pauta. E há na agenda projetos que são claramente positivos para a economia. Talvez haja resistência contra alguns. O Congresso é um pouco cíclico. No auge da tensão, a racionalidade perde espaço no debate. Mas isso é cíclico. Mesmo que continue a tensão política, volta a ter um espaço de debate racional.
Todo mundo sabe que, em ano eleitoral, não é só a tensão, mas a própria disponibilidade dos parlamentares se reduz. Isso gera dificuldade. Mas há espaço para aprovar medidas positivas para a economia.


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