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EFEITO CASCATA
Pecuaristas com gado pronto confinado são os mais afetados
Crise da aftosa prejudica
vasta cadeia do agronegócio
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
Vinte dias após o anúncio do foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul, a sensação é que o susto
foi maior do que a crise, mas que
ninguém está sorrindo. Os efeitos
do reaparecimento da doença em
uma região livre de aftosa respingaram por toda a cadeia da carne.
Perdem todos, principalmente
após as suspeitas de a doença ter
ultrapassado as fronteiras de Mato Grosso do Sul com o vizinho
Paraná, Estado responsável pelo
terceiro maior volume de exportações de carne suína.
Os mais prejudicados são os pecuaristas. Pior ainda para os que
têm gado pronto em confinamentos. No momento em que a arroba
de boi gordo começava a reagir, a
febre aftosa derrubou os preços.
Cotada a R$ 58,43 às vésperas
do anúncio da doença, a arroba
estava a R$ 53,97 no mercado físico na sexta-feira, mostra o Cepea
(Centro de Estudos Avançados
em Economia Aplicada), órgão da
Esalq/USP.
Perdem também os frigoríficos.
O mercado externo é a fatia mais
lucrativa, e as renegociações, após
os embargos, vão ser mais árduas,
mesmo com a demanda externa
por carne bovina aquecida.
Olham ainda com atenção o desenrolar da crise os exportadores,
que lutaram nos últimos anos para conseguir uma boa imagem para a carne brasileira. Após liderar
os embarques mundiais em volume, o país buscava uma remuneração melhor para seus produtos.
A desconfiança aparece também no setor de suplementação
alimentar, que já apostava na retomada das vendas com a recuperação dos preços da arroba de boi.
Até o mercado futuro da Bolsa
de Mercadorias & Futuros, que
deslanchava com os bons ventos
no setor, pisou no freio e reduziu
volumes negociados. Perde também o setor de leilões, proibidos
em vários Estados.
Até o setor de grãos teme pelo
desfecho dessa crise. Os focos parecem estar controlados, mas um
avanço da doença colocaria em
risco as produções de milho e de
soja, dois itens importantes na
composição das rações.
Gilman Viana Rodrigues, vice-presidente para Assuntos Internacionais da CNA (Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil), diz que os efeitos temporários
da crise são menores do que se esperava. Há, no entanto, um efeito
duradouro de credibilidade a ser
renovado.
Luiz Nabhan, presidente da
UDR, diz que a aftosa mascarou
um pouco o quadro de oferta de
carne no país. Os preços estavam
em alta e, baixada a poeira, vão
voltar a subir porque há uma falta
de boi gordo pronto para abate.
Um comprador independente
de boi, que não quis se identificar,
confirma essa escassez. Os frigoríficos forçaram uma baixa dos preços, aproveitando a aftosa, mas
são obrigados a pagar mais pelo
produto porque não conseguem
fechar a escala de abate -comprar o número suficiente de animais que necessitam. "O mercado
está sem carne e o curral vazio."
Marcos Molina, diretor presidente do frigorífico Marfrig, diz
que a ocorrência da aftosa gerou a
necessidade de uma readequação
industrial. Foram mais afetados
os frigoríficos que estão com até
80% dos volumes produzidos voltados para o mercado externo.
No caso do Marfrig, o mercado
externo responde por 50% dos
abates e, mesmo assim, 25% desse
volume é de carne cozida, que não
tem restrições. Com plantas em
São Paulo, Mato Grosso e Mato
Grosso do Sul, o Marfrig teve de
fazer remanejamentos de produção entre essas unidades. Apesar
da aftosa, está mantida previsão
de faturamento de R$ 1,5 bilhão
para este ano e os investimentos
na construção de uma unidade
em Porto Murtinho (MS).
Para Antônio Camardelli, diretor-executivo da Abiec (associação dos exportadores), "os efeitos
mais perversos dessa crise são a
destruição de uma imagem e a desestruturação da carteira de clientes". Além disso, acrescenta, há
uma desarrumação no processo
de compra e de venda e os clientes
deixam de ser permanentes.
Muito mais grave do que o estrago financeiro de quatro ou cinco meses é o que vem depois, diz
Camardelli. O Japão, por exemplo, começava a aceitar o conceito
de regionalização, o que poderia
favorecer a compra de carne "in
natura" de parte do Brasil. Volta-se à estaca zero, diz ele.
No setor de suplementação alimentar, Marcos Mantelato, diretor da Asbram (Associação Brasileira das Indústrias de Suplementos Minerais), diz que a redução
de preços da arroba de boi vai fazer os pecuaristas se preocuparem mais com os custos.
Se o problema for sanado rapidamente e a arroba de boi voltar a
US$ 22, as vendas serão retomadas. Mario Sergio Cutait, do Sindirações, concorda com Mantelato e diz que "essa surpresa" veio
bem na hora em que a pecuária
voltava a investir em alimentação.
Mirlaine Barbosa de Mello, da
Ágora Senior, diz que o mercado
futuro também ficou tenso e mostrou fortes quedas, que já chegaram no limite. Félix Schouchana,
diretor de mercados agrícolas da
BM&F, diz que os limites de baixas serviram como antipânico para o mercado.
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