São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

Uma reforma para os juros


Nada se fala sobre mudanças no sistema financeiro, nem disparates, agora reservados apenas para o gasto público

NESTES DIAS de tanta criatividade, quando se prepara a política econômica de Lula 2 e tanto ainda se fala de reformas, nada se escuta sobre a reforma do sistema financeiro e sobre os meios de administrar a dívida do governo.
A gente não ouve nem mais disparates sobre juros. Apenas disparates fiscais. Sindicalistas e parlamentares querem estourar o Tesouro com aumento de 20% do salário mínimo e redução de imposto para classe média e ricos. O governo quer tirar do superávit primário o dinheiro do investimento. Mas a tarefa essencial é investir contendo gastos: com INSS, salários, cartilhas do Gushiken ou financeiros (juros).
Quede reformas financeiras? Da decrépita lei do sistema financeiro? Da gestão da dívida pública, ainda contaminada pela era da superinflação? Por que o juro ainda é alto?
Qual o nível do juro real? A taxa de juro relevante para o cálculo econômico é aquela esperada para o futuro, diz o manual. O futuro, no ambiente das finanças do Brasil, fica no final do ano que vem. A estimativa razoável do juro real é a taxa esperada (negociada no mercado futuro) para daqui um ano, descontada a inflação que, estima o mercado, vai se acumular nos próximos 12 meses.
No dizer dos especialistas, trata-se da taxa "ex ante", que está em torno de 9% ao ano. Em janeiro, rondava os 13%. Mas a taxa "ex post", a verificada a posteriori, a taxa real deste final de ano e do começo de 2007, ficará em torno de 10%.
Quer dizer, houve e tem havido discrepância entre o que o mercado "prevê" e a taxa verificada um ano depois. Parêntese: "prevê" aqui significa "quer/negocia". Como as decisões do Banco Central sobre juros são influenciadas por expectativas de mercado, pode-se dizer que o BC paga um tipo de "ágio", um prêmio de risco, um extra de juros. Por quê?
Porque o Brasil tem histórico de confusões, de variações de preços devido a crises externas (que afetam o dólar), de volatilidade: de variação intensa e freqüente da inflação, mesmo após o Real. Também se coloca nessa conta o risco de descontrole do gasto do governo e da dívida pública, potencialmente explosiva no Brasil (pois é de curto prazo e sujeita, na maior parte, a taxas de juros variáveis: prefixada). Isto é, em caso de rolo financeiro ou político grave, a dívida dispara quase pari passu com a taxa de juros.
Mas as incertezas diminuíram. Expectativas de inflação e inflação real estão convergindo mais. A discrepância das estimativas de mercado sobre a inflação também caiu muito. A dívida, ainda alta, parou de corcovear. A perspectiva de crise cambial diminui muitíssimo. Por que a dívida ainda é tão prefixada?
No começo deste ano, o governo dizia que a parcela prefixada da dívida pública cairia. Bem, caiu de 2005 para 2006. Mas desde fevereiro a coisa parou de andar. Pode-se dizer que houve estresse financeiro em abril. Com eleição, a incerteza cresce. Mas foram só esses os motivos?
Alongar a dívida e a "pós-fixar" depende decerto de torná-la mais previsível e cadente, o que depende de controle de gastos. Mas o que este governo faz para gerir melhor a dívida, tornar sua gestão mais barata? E por que não se trata da nova regulamentação financeira, pendente faz mais de década?

vinit@uol.com.br


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