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FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL
Pânico faz Brown temer "desglobalização"
Primeiro-ministro britânico pede urgência na reativação do crédito e na criação de um sistema regulatório mundial
Presidente do HSBC sugere criação de um "Business20" para reunir o setor privado, promover o livre mercado e se opor à visão estatizante
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS
O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, parecia o
economista Nouriel Roubini,
conhecido como "Mr. Apocalipse", durante a entrevista coletiva que concedeu ontem em
Davos, a ponto de ter cunhado
um neologismo, "desglobalização", para referir-se ao risco
que antevê em função da crise
econômica global.
Ou seja, Brown teme que o
presidente venezuelano, Hugo
Chávez, antípoda ideológico do
mundo de Davos, possa vir a
acertar em sua avaliação de que
"Davos é o passado", se se tomar a cidadezinha suíça como
porta-bandeira da globalização
dita neoliberal.
Brown deu permanente tom
de urgência às providências
que devem ser tomadas para
que, em vez da "desglobalização", tenha-se uma globalização "mais bem administrada",
o que ele obviamente prefere.
A prioridade do momento é
pôr de pé o que chamou de terceiro pilar das providências tomadas contra a crise, pilar "essencial para o emprego". Trata-se de "retomar os empréstimos
em todas as economias".
Criticou duramente o que
chamou de "nova forma de protecionismo", o financeiro, na
medida em que bancos com
matriz nos países ricos estão
secando o crédito nos países
periféricos, para repatriar capital e enfrentar os buracos nos
seus próprios países.
Citou como comprovação o
fato de que o investimento líquido nos países emergentes
cairá neste ano para US$ 150
bilhões, apenas 15% do valor
(US$ 1 trilhão) que chegou a
atingir. Brown não está exagerando. Ricardo Vilela Marino,
executivo-chefe do banco Itaú
para a América Latina, diz que
os bancos estrangeiros no Brasil estão "vampirizando" as
suas filiais para fornecer capital
para as matrizes.
Para o Brasil, o problema é
bem menor porque a participação dos bancos estrangeiros no
conjunto do sistema financeiro
é pequena. Mas, nos casos de
Argentina e México, para ficar
só em América Latina, de fato é
uma tremenda complicação.
Brown aponta qual é a complicação: a não-retomada dos
empréstimos "tornará a recessão mais longa e profunda".
Completou: "As instituições
internacionais têm que ser
mais proativas imediatamente", na enésima vez em que
usou a palavra "imediatamente" ou sinônimo dela.
O sumiço do crédito está se
dando mesmo depois de os governos, pelas contas de Brown,
despejarem incríveis US$ 7 trilhões para evitar o colapso do
sistema financeiro -ou cinco
vezes tudo o que o Brasil produz de bens e serviços por ano.
Brown defendeu os pacotes
de estímulo à economia, que
começam a receber tímidas críticas porque aumentam os déficits nacionais. "A política fiscal
é essencial quando a política
monetária está prejudicada"
[porque os juros já caíram tanto no mundo rico que novas reduções não produzem efeito].
O premiê britânico, que será
o anfitrião da segunda cúpula
do G20 (abril, em Londres), espera que esse encontro adote
pelo menos duas decisões capazes de eventualmente controlar o pânico: 1) criar um sistema
de "aviso antecipado" de crise.
Ele próprio admite que faz dez
anos que essa ideia circula no
mundo financeiro;
2) adotar um conjunto de
medidas regulatórias que cubra
também fundos de hedge e outros "complexos instrumentos" financeiros, que são uma
das causas da crise.
Brown quer um sistema regulatório global, a partir do raciocínio de que "temos um sistema financeiro global, mas, até
agora, não temos coordenação
ou supervisão global, apenas
supervisores nacionais".
O problema com essa proposta é que ela já figurava no
comunicado da reunião de ministros da Fazenda do G20, realizada em novembro em São
Paulo, mas foi descaracterizada
na semana seguinte, quando se
reuniram em Washington os
presidentes e primeiros-ministros. O comunicado final da cúpula enfatiza a preferência pela
supervisão apenas nacional.
Como a cúpula anterior foi
durante a gestão Bush, a Folha
perguntou a Brown se ele recebera algum sinal da nova administração norte-americana de
aceitação de uma regulação
global, contra a tradição dos
Estados Unidos de preferir
seus próprios instrumentos.
Resposta: "Agora há um consenso global de que a supervisão nacional é inadequada".
Depois de Brown, foi a vez de
Angela Merkel, a chanceler alemã, defender a criação de um
Conselho Econômico das Nações Unidas, à semelhança do
Conselho de Segurança, que é o
coração do sistema ONU.
Merkel, como seu colega britânico, lamentou que o mundo
"não tenha uma arquitetura
global que funcione de forma
adequada" e defendeu que a
cúpula de Londres do G20 tome decisões que sejam obrigatórias para todos os participantes, o que inclui os EUA.
Talvez por sentir -ou temer- a pressão do ativismo estatal, o setor privado também
se mobiliza para o G20. Ontem,
o presidente do grupo HSBC,
Stephen Green, sugeriu a criação de um B20 ("Business20"),
um conglomerado das maiores
companhias do planeta, incluindo as de emergentes, desde que com operações globais.
Objetivo, segundo Green:
"Promover o livre mercado e
funcionar como a voz dos negócios sustentáveis".
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