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CENÁRIOS
Previsão era que moeda perderia de 6% a 12% diante do dólar em 99
Maxidesvalorização do real surpreende consultores
ANTONIO CARLOS SEIDL
da Reportagem Local
O colapso do
regime cambial
brasileiro com a
fracassada tentativa de desvalorização controlada do real
em 8,26% no dia
13 de janeiro e a adoção do câmbio
livre em 18 de janeiro pegaram de
surpresa nove em cada dez analistas financeiros.
A maioria dos boletins econômicos de consultorias independentes, de bancos de investimento e de
associações de economistas encaminhada a clientes e à imprensa
entre 30 de novembro e 5 de janeiro estimava que a desvalorização
ficaria entre 6% e 12% em 1999.
Mas, enquanto o país acordava
ainda inebriado das comemorações do réveillon, no dia 1º de janeiro o ex-presidente Itamar Franco, um dos "pais do Real", assumia
o governo de Minas Gerais, fazendo, no discurso de posse, críticas
duras ao governo federal.
O "efeito samba" fez os mercados dançarem ao som dos pregões
nervosos quando, no dia 5 deste
mês, Itamar Franco anunciou a
moratória da dívida mineira para
com a União por 90 dias.
Hoje, quando o real amarga uma
desvalorização de cerca de 60% de
1º a 29 de janeiro, analistas e consultores econômicos explicam por
que traçaram cenários mais amenos para a cotação do real na virada do ano.
Odair Abate, do Lloyds Bank, estimou a desvalorização do real em
relação ao dólar entre 7,2% e 8,2%,
no cenário A, com probabilidade
de 70% a 80%, e entre 30% e 35%
no cenário B, com uma probabilidade de 20% a 30%.
"A derrota da contribuição previdenciária dos inativos em dezembro, a redução da queda diária
dos juros e a moratória mineira
afetaram a credibilidade da política econômica, desviando o cenário
macroeconômico da nossa rota
A", diz Abate.
Mas, se reconhece que a sequência de eventos dos primeiros dias
de janeiro "realmente foi uma surpresa", Abate reserva críticas aos
arautos da desvalorização como
panacéia para a economia do país.
"Nem os mais ardentes defensores da liberdade cambial previram
uma desvalorização de 60% neste
mês", observa.
Roger Hipskind, vice-presidente
do conselho de negócios da Câmara Americana de Comércio, de São
Paulo, afirmou na seção "Inside
Brazil", da revista "Update", da
própria Câmara, que uma maxidesvalorização do real em 1999 era
uma hipótese "improvável".
"O país estava indo bem. Acordo
fechado com o FMI. O presidente
Fernando Henrique Cardoso arrancando o ajuste fiscal do Congresso. Mas quem esperava a ação
desastrada do governador Itamar
Franco?"
Para Hipskind, dois eventos que
"nada tinham a ver" com os fundamentos macroeconômicos do país
-a atitude política de Itamar e o
choque de personalidades dentro
do governo- determinaram a
derrocada da âncora cambial.
Neil Dougall, economista-chefe
do banco de investimentos Dresdner Kleinwort Benson, de Londres,
previu, no fim de dezembro, que o
dólar valeria R$ 1,32 em 31 de dezembro deste ano, com uma taxa
média de R$ 1,26 em 1999. Hoje, reviu as projeções para R$ 2 e R$
1,82, respectivamente.
"Em termos da média anual, a
nova estimativa significa um mergulho do real de 57% neste ano."
Para Dougall, o "overshooting"
(aumento exagerado da cotação)
não é uma grande surpresa. "É
uma reação típica de mercado em
países forçados a abandonar a âncora cambial com uma consequente perda de credibilidade."
"Mas, no caso do Brasil, isso aumentar o risco de a inflação chegar
à marca de 20% ao ano. Esse é o
ponto no qual as pressões para a
volta da indexação podem se tornar irresistíveis."
Marcos de Calli, economista do
banco CCF Brasil, que projetou
uma desvalorização cambial de 8%
para 1999, diz que, na verdade, todos os economistas trabalham
com mais de um cenário: "Esse era
o nosso cenário básico, mas, no
nosso cenário pessimista, esperávamos esse desfecho. O que nos
surpreendeu foi a rapidez dos
acontecimentos".
Segundo Calli, o que explica as
previsões modestas de desvalorização cambial nos boletins econômicos que circularam nas semanas
que antecederam a derrocada da
âncora cambial brasileira foi a
"torcida" dos grandes bancos e
instituições financeiras pelo sucesso do Plano Real.
"Todos estavam torcendo para
que o governo conseguisse levar o
Real até um ponto em que a transição para um outro regime cambial
pudesse ser feita sem traumas."
Mas, diz, o "evento Itamar" precipitou uma mudança que o governo não estava planejando para
ocorrer neste mês: "O Itamar abriu
a boca, e o mercado internacional
de capitais fechou os cofres para o
Brasil de vez."
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