São Paulo, domingo, 08 de agosto de 2004

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DIVERSIDADE ESTRATÉGICA

Questionamento sobre capacidade dos "diferentes" é um dos efeitos colaterais da prática

Modelo gera polêmica sobre competência

DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar do apelo politicamente correto, introduzir a noção de diversidade no modelo de gestão pode aflorar polêmicas no ambiente de trabalho. Isso porque, assim como existe muita discussão em torno das cotas para estudantes negros nas universidades, a associação de cargos a perfis preestabelecidos pode não ser aprovada pelos colaboradores.
"Ela só virou diretora por ser mulher. Antes, todos os diretores eram homens." Esse foi um dos comentários que Carlo Hauschild, da Hewitt, ouviu de funcionários que atuavam em empresas que apostaram na diversidade.
"O questionamento é um efeito colateral da prática. As pessoas podem achar que aquele profissional não está preparado para assumir o cargo", comenta.
Para não correr esse risco, o foco na diversidade da Avon é concentrado na etapa de contratação, e a rede não planeja estipular metas quantitativas de posições a serem preenchidas com pessoas que tenham perfis específicos.
"O que fazemos é usar de rigidez e fiscalização para assegurar que fatores como idade, origem ou etnia jamais interfiram num recrutamento", explica a gerente de desenvolvimento organizacional, Carla Marques, 36.

"Atestado de racismo"
Isabel Cristina Fernandes, 42, é gerente de setor na Avon e supervisiona o trabalho de 1.600 revendedoras. Embora seja negra, a profissional não enxerga na adoção de cotas uma estratégia que concentre soluções definitivas de inclusão. "De certa forma, a cota é um atestado de racismo. Pode funcionar no primeiro momento, para abrir horizontes. Mas o ideal é que a aceitação seja natural."
Filha de um metalúrgico que morreu quando ela tinha apenas 12 anos, Fernandes recomenda "competência e luta" para que as minorias consigam se inserir no mercado. "Acho que o racismo é inegável, mas existe um preconceito bilateral entre negros e brancos. O negro tem de parar de ser preconceituoso com ele mesmo para poder chegar mais longe."
Para combater a tendência à segmentação das minorias, os grupos temáticos da IBM são abertos a qualquer colaborador que se interesse pelo tema: nem só de gays é formado o grupo GLBT da empresa, e há muitos brancos no grupo de negros. "Consideramos importante que sejam heterogêneos", diz a gerente de talentos, Luciana Camargo.

Objetivos
Outro ponto que merece atenção é refletir sobre aonde se quer chegar ao apostar na contratação de funcionários de diferentes origens. Isso porque, mais do que tê-los no organograma, é importante certificar-se de que eles possam manifestar-se livremente.
"Diversidade não se contrata, fomenta-se", resume Luciana Annunziata, diretora da Dobra, empresa de soluções para comunicação empresarial e aprendizado.
Na opinião dela, de nada adianta trazer tipos "superexóticos" para compor a equipe se o contexto de relações da empresa segue um padrão rígido. "[O funcionário] pode ser um descendente de índios da Amazônia, mas ter de seguir a linha", exemplifica.
Annunziata ressalta ainda que "diversidade é exposição". "É abrir o espaço para que cada um exiba o que tem de diferente. Caso contrário, contrata-se por ser diferente e depois mata-se a diversidade com as práticas da casa."


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