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drible a neura
Elas estão por toda parte, exigindo paciência zen
DINAH FELDMAN FREE
LANCE PARA A FOLHA
"Nos Estados Unidos e em países da Europa, a formação de uma fila é sinal de incompetência. No Brasil, é sinal de "ser bom", é marketing", diz o psicoterapeuta
Ari Rehfeld, supervisor da clínica psicológica da PUC-SP. E, o mais incrível, há quem
goste de enfrentar filas. Mas a idéia aqui é ajudar o cidadão que foge dela feito o diabo da cruz.
A psicanalista Mara Cristina Souza de Lucia, diretora
da divisão de psicologia do Instituto Central do Hospital
das Clínicas, defende uma tese que, além de curiosa, pode ajudá-lo a identificar quando você é obrigado a enfrentar a fila e quando dá para escapar. Segundo ela,
existem dois tipos: a fila efêmera e a essencial.
"A primeira revela a importância do evento a que o indivíduo está indo. É a fila da vaidade, regada a caipirinha", diz. Esperas em restaurantes concorridos, cinemas, estacionamento de shopping center, churrascarias
e parques de diversão são exemplos dessa modalidade,
na qual a pessoa pode optar por estar ali ou não.
"No domingo, um senhor de 70 anos estava com sua
família esperando uma mesa havia umas duas horas e
disse que preferia estar na fila a estar se aborrecendo em
casa", conta Fernanda Arruda Meireles, caixa da churrascaria paulistana Boi Preto. "É uma forma de diversão", conclui a funcionária.
Já as filas essenciais, como as de ônibus, trânsito, banco, seguro-desemprego, doação de órgãos, para marcar
consultas e pegar remédio em hospitais públicos massacram a auto-estima do brasileiro, diz a psicanalista.
"Trabalhar o dia inteiro e esperar o ônibus lotado por
40 minutos na volta dá ao trabalhador angústia e sensação de ter tido seu tempo roubado", afirma Mara.
Para Rehfeld, a solução para as filas, em geral, existe,
apenas é preciso reclamar por elas. Para ilustrar, ele relata uma cena que presenciou num banco: "Uma pessoa
na fila começou a, literalmente, mugir alto. Depois disse
que parecíamos vacas em uma fila de matadouro. Em
pouco tempo, apareceram novos caixas, e a fila andou".
Porém o brasileiro não está acostumado a reclamar, diz
ele. "Faz parte de uma cultura no Brasil a idéia de que fazer o outro esperar dá status. Minha hipótese é que isso é
uma herança colonial, da época da escravidão."
Ele acredita que, por ter sido o país que mais tarde saiu
da escravidão, a elite brasileira acostumou-se a ser servida, e a fila passou a ser uma questão cultural, reforçada
pelo uso contínuo.
E aí vai a orientação dele: "Se tiver oportunidade, evite
a fila. Caso contrário, exerça seu direito e mostre sua indignação".
Agora, se a fila é inevitável, pelo menos evite o estresse
durante a espera. Uma solução é buscar algo para fazer
enquanto aguarda a vez, como ler um livro, um jornal,
ouvir walkman, colocar a bolsa em ordem, por exemplo.
"Uma atividade que não deixe a pessoa parada evita
que ela tenha a sensação estar sendo lesada", diz a psicanalista Mara.
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