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São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2003
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Variação de temperatura, odores fortes e até vibrações afetam a qualidade dos vinhos

Adega preserva o prazer de beber

Dimitar Dilkoff/Reuters
A luz pode prejudicar coloração e sabor da bebida


GUSTAVO PRUDENTE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A expectativa é grande: aquele vinho tinto que custou uma pequena fortuna e aguardava há meses para ser aberto está prestes a ser degustado até a última gota. Mas, antes do primeiro gole, surge a frustração: o vermelho e o perfume não são tão intensos como o esperado. Pequenos resíduos bóiam na bebida, que invade a boca com um sabor estranho. Falsificação? Não, o responsável por esse anticlímax é, provavelmente, o local onde a garrafa estava. Para manter suas características, o vinho exige ser bem guardado -de preferência, numa adega. Até os vinhos mais "simples" correm o risco de ter o sabor alterado em poucos meses devido à má conservação, alerta Marlene Kratz, gerente de adega do Empório Santa Maria. E o estrago pode ser ainda maior -no bolso e no paladar- se for um vinho especial. "Muitos grandes vinhos, como os "bordeaux", precisam de anos de envelhecimento em local adequado para atingir seu auge", afirma ela. De acordo com os especialistas, o ambiente ideal para guardar a bebida deve ter pouca ou nenhuma luz, o mínimo de vibração e ruído possível, temperatura constante -entre 12C e 16C- e cerca de 65% de umidade relativa do ar. "No Brasil, um país tropical, com muitas variações de temperatura, o ideal é uma adega climatizada", diz o sommelier Patrick de Neufville, da consultoria Grand Vin.

Prontas para usar
As adegas pré-fabricadas são a opção mais prática para quem pretende reservar vinhos por meses ou anos. Parecidas com geladeiras, elas são encontradas em diversos modelos e tamanhos, com capacidade para armazenar de 25 a 500 garrafas. Mas é preciso cuidado para não confundi-las com os "wine coolers", frigobares especiais cuja função é deixar o vinho na temperatura correta antes de servir. "Eles não servem para conservação, porque têm barulho e vibração e não possuem controle de umidade", diz Kratz. A maioria das adegas pré-fabricadas, embora possua o mesmo sistema de refrigeração, apresenta vibração e ruído bem menores. O preço das adegas pré-fabricadas é salgado -entre R$ 1.800 e R$ 18 mil- mas, ainda assim, é inferior ao das adegas sob encomenda e ao da climatização de ambientes. As adegas sob encomenda, que podem custar até R$ 40 mil, são mais indicadas para quem tem algum espaço vazio na casa e, ao mesmo tempo, pretende conservar grandes quantidades de vinho. "Não existe época nem local ideais para construir uma adega. Dá para levantar quatro paredes num terreno vazio ou fazer um gabinete numa sala com pé-direito alto", afirma Marco Antônio Fernandes, diretor da Art des Caves, empresa especializada na fabricação e na montagem de adegas. Quem quer distância de obras radicais pode climatizar um ambiente da casa. "Mas o custo só compensa se a pessoa planeja guardar acima de 600 garrafas", afirma Fernandes. Afinal, quem quiser transformar um quarto extra numa adega deve estar disposto a gastar entre R$ 18 mil e R$ 90 mil, valor que inclui o isolamento térmico, dois aparelhos -um interno e outro externo- para manter a temperatura baixa e as adaptações necessárias. "Se bater muito sol no ambiente, por exemplo, é preciso fazer um isolamento maior. Já se houver sauna ou piscina por perto ou se for um porão, onde há umidade em exagero, haverá necessidade de um desumidificador", explica Fernandes. A decoração fica a critério da pessoa. "Só não recomendo portas de correr, porque elas não proporcionam um isolamento muito bom, e a instalação de muitas luzes, pois a radiação ultravioleta altera as características do vinho." As adegas pré-fabricadas não são indicadas para ambientes muito quente ou úmidos. Já as adegas construídas e os ambientes climatizados estão imunes às influências externas -barulhos de motor, variações no clima, odores fortes etc.

Soluções caseiras
Quem não pretende investir em uma adega de verdade deve tomar alguns cuidados. O primeiro deles é não comprar muita bebida. "Quem não tem onde guardar uma Mercedes não deve comprá-la", diz Fernandes. "Conheci um homem que gastou uma fortuna em vinhos caríssimos e perdeu tudo porque guardou as garrafas embaixo de uma laje, num quarto quentíssimo", diz Neufville.
O sommelier explica que existem excelentes vinhos -a maioria dos espanhóis, por exemplo- que não precisam amadurecer e podem ser consumidos imediatamente após a compra. "Se ficar uma semana na geladeira, um vinho jovem não sofrerá interferência", diz.
Para Márcia Padilha, gerente de vendas da Maison du Vin, a adega pode ser deixada para os exemplares mais caros e sensíveis. Os vinhos de consumo imediato podem ser guardados em móveis do tipo "colméia", aqueles compostos por diversos losangos, "mas desde que fiquem protegidos do contato direto com o sol, no lugar mais fresco da casa", diz.
Neufville dá duas sugestões para criar uma adega improvisada: um quarto escuro e fresco, de pouca movimentação, onde deve ser colocado um balde com água e um pouco de desinfetante para aumentar a umidade, ou o vão embaixo da pia do banheiro. "É um lugar com grande circulação de umidade, longe de odores e com pouca luz."
"Mas, se a pessoa realmente quer conservar o vinho por muito tempo, é melhor investir numa adega climatizada", afirma o sommelier. Além disso, diz Márcia Padilha, "a pessoa que gosta muito de vinho quer todo o aparato que ladeia essa paixão. É como um jogador de beisebol, que quer uma camisa e um tênis legais. O amante de vinho também quer um abridor e uma adega de primeira".


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