São Paulo, quinta-feira, 12 de junho de 2008
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Entrevista

poluição x coração

Além de piorar as condições de pacientes com doenças cardíacas, poluição pode gerar problemas em pessoas saudáveis, diz cardiologista americano

ADRIANA KÜCHLER
DE BUENOS AIRES

Com os avanços na medicina preventiva, a fórmula para tentar evitar ou controlar doenças cardíacas já é bem conhecida. Mas, por mais que você pratique exercícios regularmente, mantenha uma boa alimentação, não fume e evite se estressar, se vive em uma cidade como São Paulo, existe um fator que é quase impossível evitar: a poluição.
No último Congresso Mundial de Cardiologia, realizado no fim de maio em Buenos Aires, o diretor do Centro de Ciência e Medicina Cardiovascular da Universidade da Carolina do Norte, nos EUA, Sidney Smith, comandou um painel sobre os efeitos cardiovasculares da poluição, um dos mais concorridos do evento.
Smith, que assumirá a presidência da Federação Mundial do Coração em 2010, apresentou um panorama nada alentador. "A poluição não só agrava as condições de quem já tem uma doença cardíaca, como se pensava, mas pode também desenvolver problemas em pessoas saudáveis", diz Smith, que alerta para a prática de exercícios físicos em ambientes poluídos. "Intriga-me o que pode acontecer em Pequim, cidade com muita poluição, durante a Olimpíada, quando eles promoverem uma maratona."

 

Folha - Em que situações a poluição traz riscos para o coração?
Sidney Smith
- É difícil controlar porque as partículas de poluição que causam problemas cardíacos são invisíveis. As mais perigosas são as menores do que 2,5 mm, que vêm da queima de combustíveis, do trânsito e de fontes industriais, como fábricas que queimam carvão para energia. São essas que causam inflamação das artérias, criam ritmos cardíacos irregulares e podem ocasionar ataques cardíacos. Essas condições são comuns em países em desenvolvimento, como o Brasil, porque os combustíveis seguros são muito caros e os carros muitas vezes são velhos, produzindo mais emissões tóxicas. Com o uso crescente de carros, lugares como São Paulo ou Pequim estão ficando como Los Angeles, onde é praticamente impossível fugir dessas condições.

Folha - Para quem a poluição traz mais riscos cardíacos?
Smith
- O pior é que a poluição não só agrava as condições de quem já tem uma doença cardíaca, como se pensava, mas pode afetar pessoas saudáveis. Ela causa problemas a curto e a longo prazo, mas estudos mostram que, em condições de alta poluição, aumentam as entradas em hospitais por problemas cardíacos, principalmente entre os mais velhos, setores de baixa renda e pessoas com diabetes e problemas de coração ou de pulmão.

Folha - Quem corre mais perigo: a pessoa saudável que vive em um ambiente poluído ou quem tem uma doença, mas mora em um local com ar puro? Smith - A pessoa que já tem uma doença, mas vive em um ambiente com ar limpo, vai ter menos chance de sofrer eventos futuros como conseqüência de seu problema. Quem vive em um ambiente limpo tem mais facilidade de controlar a doença, ao passo que uma pessoa saudável que vive em um ambiente poluído tem mais probabilidade de desenvolver uma doença.

Folha - A longo prazo, que riscos traz a exposição à poluição?
Smith
- Um estudo da Universidade Harvard mostra que quem vive em um ambiente poluído tem 26% mais chances de morrer por problemas cardiovasculares. Pesquisas feitas no Leste Europeu e em Los Angeles provaram que há mais incidência de doenças congênitas do coração em crianças cujas mães passaram a gravidez em ambiente com muita poluição. Em Dublin, na Irlanda, foi constatada a redução de 10,3% em mortes por doenças cardíacas quando eles baniram a queima de carvão nas fábricas.

Folha - Praticar exercícios ao ar livre pode ser perigoso?
Smith
- Sim. O que parece um hábito saudável pode acabar sendo prejudicial porque, durante a prática, se consome mais ar do que em uma situação normal. Intriga-me o que pode acontecer em Pequim, que tem muita poluição, durante a Olimpíada, quando eles promoverem uma maratona. Pode ser muito perigoso. Uma medida é, antes de sair para se exercitar, checar os índices de poluição divulgados pela sua cidade [em São Paulo, acesse o link www.cetesb.sp.gov.br/Ar/].

Folha - Há outras formas de escapar da poluição em uma cidade como São Paulo?
Smith
- A primeira coisa é evitar ficar ao ar livre quando os índices de poluição estão muito altos. Evitar o fumo passivo e tentar escolher um local para viver que não tenha muito trânsito ou que não seja próximo de fábricas também ajuda. E, definitivamente, as pessoas têm que começar a fazer algo para melhorar as condições de poluição. Dar carona, usar motores que não poluam tanto o ambiente. Tudo isso gera menos trânsito e menos poluição.

Folha - Só a ação das pessoas afetadas resolve o problema?
Smith
- Também seria necessário que o governo determinasse padrões de controle para os carros que serão vendidos daqui para a frente e fizesse uma inspeção constante para ver se estão poluindo. Conheço programas no Brasil muito inovadores de implantação de uma alimentação saudável e da prática de exercícios entre crianças. Se começarem a aplicar essas inovações para tentar diminuir a poluição, será ótimo para a saúde dos brasileiros.


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