São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 2006
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inspire respire transpire

Não se reprima

As aulas de ginástica aeróbica, que reinaram absolutas nos anos 80 e ditaram moda com polainas e cores berrantes, estão de volta às academias

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois das festas temáticas, do renascimento de pérolas da moda como as saias balonês e os leggings, e dos livros e revistas destinados a relembrar até brinquedos, como o Atari, a nostalgia em torno dos anos 80 despertou mais um hit adormecido: a ginástica aeróbica. E ela volta às academias com tudo a que tem direito: corridinhas sem sair do lugar, polichinelos, coreografias e muitos pulos.
Os balzaquianos provavelmente vão se lembrar da febre que a aeróbica foi nos anos 80. Os movimentos coreografados caíram no gosto do público, principalmente das mulheres, que logo abasteceram o guarda-roupa com shorts, tops, "colants" e polainas. Tudo, claro, em cores bem berrantes.

Ascensão e queda
Mauro Guiselini, hoje diretor do Instituto Runner de Ensino e Pesquisa, conheceu a "dança aeróbica" nos Estados Unidos e foi um dos primeiros a trazer a atividade para o Brasil, mudando um pouco o nome dela. "Trocando o nome "dança" por "ginástica", a aeróbica também atraiu os homens", conta.
Até então, a ginástica praticada aqui tinha uma base européia e, embora também utilizasse música, tinha movimentos diferentes. A aeróbica criada pela norte-americana Jackie Sorensen trazia corrida, saltinho e passos cruzados provenientes da ginástica rítmica.
"Era uma aula simples, com músicas alegres e alto gasto calórico", define Guiselini. Em 1984, a Runner realizou a 1ª Clínica de Ginástica Aeróbica, destinada a treinar professores. O curso, com mais de 400 inscritos, teve lotação esgotada.
A atividade cresceu tanto que, nos anos 90, passou a ser considerada um esporte competitivo. "Todas as grandes academias tinham uma equipe de competição de aeróbica. Os circuitos eram televisionados", conta Eda Regina de Moura Rocha, 46, presidente do comitê técnico de ginástica aeróbica esportiva da Federação Paulista de Ginástica.
A vantagem, segundo Eda, foi a visibilidade que a atividade ganhou. A desvantagem, que as competições levaram os movimentos, que já eram intensos, a níveis mais e mais difíceis.
Ao mesmo tempo, as aulas passaram a ter códigos específicos. Hoje, uma apresentação oficial de ginástica aeróbica esportiva tem que durar 1 minuto e 45 segundos e ter dez movimentos de força estática, força dinâmica e flexibilidade, que devem ser devem ser feitos sobre colchões e um piso especial.
Mas o tal colchão e o tal piso não existiam há 20 anos, e quem se arriscava a acompanhar as aulas mais puxadas era, muitas vezes, vítima de lesões, principalmente no joelho e no tornozelo, devido aos saltos, giros e elevações de perna.
Na época, segundo Eda, também era comum encontrar professores sem a formação necessária em educação física. "Muitos eram só pessoas que tinham feito muitas aulas de aeróbica e eram criativos para inventar séries", diz ela.
Segundo Guiselini, muita gente também abusava e fazia aulas duas ou três vezes por dia.
O risco de lesões fez com que muita gente desistisse da ginástica aeróbica. No lugar dela, foram surgindo outras aulas, mais leves, como a aerofighting e a aerojumping.
Agora, a Federação Federação Paulista de Ginástica quer recuperar o público, que, ao longo dos anos, foi ficando restrito a clubes. Em São Paulo, o Palmeiras e o São Paulo têm aulas de aeróbica esportiva. Para ampliar o número de praticantes, conta Eda, foi criado um projeto que busca tornar a aeróbica mais popular, principalmente entre as crianças.

Retorno
Não que o pessoal que tem cerca de 30 anos precise ficar de fora. Foram alunos dessa faixa etária que começaram a pedir a volta das aulas de aeróbica na ACM (Associação Cristã de Moços), conta Edney Roberto Delgado, 33, responsável pela área de educação física e saúde da entidade, em São Paulo.
Na versão repaginada, que está sendo desenvolvida pela ACM e ganhou o nome de "Y Energy", a aeróbica tem passos mais seguros, para diminuir a chance de lesões. Ainda assim, é considerada pelos alunos a mais difícil da academia.
"Faço natação, step, spinning, e essa é a mais puxada", assegura o advogado Renato Coelho, 26, ainda suado e ofegante após uma hora de aula. "Aqui, a gente tem que saber manter a postura certa, regular o impacto no solo, pisar direito", ensina.
A trilha da aula, composta, entre outras coisas, por hits de Bon Jovi, ajuda a manter o pique, segundo ele. "Adoro todo esse revival dos anos 80 e sempre vou a essas festas temáticas. É bom lembrar daquela época, quando a gente não tinha nenhuma responsabilidade ou obrigação."
Na Gold Gym, que lançou há cerca de um mês a aula de "Aerotrash", a professora Rafaela Porto, 23, chega ao requinte de usar algum acessório da época durante a malhação. Na aula acompanhada pela reportagem, o enfeite era um par de polainas azuis. "Só não tive coragem mesmo de colocar o "colant" por cima da calça, como as mulheres faziam", diverte-se.
Para preparar as aulas, ela aluga DVDs para conhecer e adaptar a coreografia de músicas como "Ilariê", da Xuxa, e "Comer, Comer", da Turma do Balão Mágico. "Os passos mais básicos, todo mundo lembra", conta. Segundo ela, é possível perder aproximadamente 500 calorias a cada aula.
"É muito divertido", conta a assistente administrativa Marilza Martins de Almeida, 46, que praticava aeróbica "há muito tempo" e agora leva a filha Érika, de 12 anos, às aulas de "Aerotrash". "Quando tocou "Não se Reprima" eu perguntei se ela conhecia os Menudos, mas ela nunca ouviu falar."
Érika gosta mesmo é de outro grupo latino-americano: o mexicano Rebelde, cujas músicas também têm refrão grudento e coreografias saltitantes.
Certas coisas nunca mudam.


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