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O que os outros fazem para driblar o breu
Debate sobre crise mobiliza governos e ONGs dos EUA ao Quênia; as mudanças atingem da indústria aos hábitos do cidadão
Reuters
![](../images/q2405012001.jpg) |
Livre de cortes de energia, em San José (na Costa Rica), as luzes dos prédios competem com o brilho que vem da lua |
DANIELA FALCÃO - EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO
Desperdício, guerra, seca, falta de planejamento, privatização malconduzida. As
razões variam de país para país, mas o resultado é o mesmo: populações forçadas a repensar seus hábitos no consumo de luz
para escapar da mais temida consequência da crise energética, os blecautes.
A crise que há duas semanas monopoliza a atenção nacional é mundial e sem data para terminar. O debate chega com
atraso ao Brasil, mas as experiências dos
países que já se preocupavam com o assunto podem indicar o caminho das pedras. Casos da Argentina, do Quênia, da
Iugoslávia e dos EUA, que, nos últimos
dois anos, enfrentaram a falta de luz
-programada ou não.
E são duas as armas usadas nessa batalha pela defesa da energia: a criação de
produtos que garantem eficiência e baixo
consumo e a conscientização do usuário
para a mudança de hábitos.
Na semana passada, enquanto o brasileiro assistia quase incrédulo às notícias
sobre a ameaça do apagão, o presidente
norte-americano George W. Bush lançava um novo pacote para encorajar a conservação de energia nos EUA, que incluía
assistência financeira para empresas instalarem sistemas de geração mais eficientes e incentivos fiscais para quem tem casa movida à energia solar.
Bush também determinou que os 500
prédios do governo federal na Califórnia
mantivessem a temperatura dos ares-condicionados em, no máximo, 26C e
desligassem elevadores e escadas rolantes. Desde o ano passado, a Califórnia enfrenta racionamento de energia, com
cortes programados no fornecimento.
Mas o problema é localizado, causado
por falhas no processo de desregulamentação do setor elétrico. O país como um
todo pode ser apontado como modelo de
consumo racional de energia.
Parece mágica, mas, de 1973 até o ano
passado, o gasto per capita de energia se
manteve praticamente inalterado nos
EUA, apesar de o PIB per capita (Produto
Interno Bruto) ter crescido 74%. Ou seja,
o americano possui hoje muito mais bens
(incluindo eletrodomésticos) do que há
27 anos, mas o consumo de energia não
cresceu. Isso foi possível graças ao aumento na eficiência dos eletrodomésticos, que funcionam com cada vez menos
energia.
A eficiência dos aparelhos de ar-condicionado, por exemplo, aumentou 56%
em 27 anos. A das geladeiras triplicou,
mas o gasto médio de energia com esses
aparelhos caiu de 1.725 kWh/ano em 72
para 685 kWh/ano em 99.
Não apenas os eletrodomésticos passaram a funcionar melhor. A indústria
também fez a lição. Graças à implementação de sistemas de geração mais eficientes, a energia usada na produção de 1
t de aço caiu 25% entre 75 e 94 e 27% para
produzir 1 t de papel.
O governo ainda estima que o consumo
de energia possa cair 20% até 2020 com a
adoção de novas medidas para aumentar
a eficiência de equipamentos elétricos.
ONGs dedicadas a educar os consumidores, como a Acee (American Council
for an Energy-Efficient Economy), são
ainda mais otimistas e calculam uma redução de 33%.
A política de conservação de energia
dos EUA serve de modelo porque, à exceção da Califórnia, não coloca em risco o
fornecimento de luz nem estabelece limites de consumo individual. Lá economizar energia não significa voltar ao passado nem abrir mão de conforto.
O uso racional implica optar por lâmpadas fluorescentes, que consomem até
75% menos energia do que as incandescentes, e instalar sensores que desligam
as luzes automaticamente quando não há
ninguém no ambiente.
Entre 90 e 99, a venda de lâmpadas
fluorescentes compactas nos EUA aumentou cinco vezes, atingindo a marca
de 82 milhões de unidades -dez vezes
mais do que o consumo desse produto
no ano passado no Brasil.
As incandescentes ainda são campeãs
de venda por aqui, pois custam R$ 1,50,
contra pelo menos R$ 14 das fluorescentes, que são importadas (alguns modelos
chegam a custar R$ 50).
Para inverter o quadro, o governo pretende incrementar os programas de distribuição gratuita de lâmpadas que economizam luz. Em fevereiro de 2000, a
Eletropaulo distribuiu 15.190 lâmpadas
fluorescentes em três regiões carentes de
São Paulo. No Recanto do Paraíso, uma
consumidora que fez a troca viu sua conta de luz cair de R$ 31 para R$ 22.
Parte do sucesso do modelo americano
de conservação de energia se deve ainda à
fixação de limites de eficiência para os
eletrodomésticos produzidos no país. O
padrão, que vale para 12 aparelhos, gera
uma economia suficiente para o abastecimento elétrico de 6,5 milhões de casas.
A partir de 93, eletrodomésticos brasileiros que consumiam pouca energia
passaram a receber o selo do Procel (Programa de Combate ao Desperdício de
Energia Elétrica). Mas, como não há limite mínimo obrigatório, fica a cargo do cidadão optar pelos mais econômicos.
Resultado: dos 40 milhões de geladeiras
do país, 28 milhões são ineficientes. Para
incentivar a compra de modelos novos, o
governo federal estuda a possibilidade de
oferecer bônus a quem fizer a troca.
A experiência deu certo em Fernando
de Noronha (PE). Após intensa campanha, a população da ilha foi convencida a
trocar 850 geladeiras e freezers, o que fez
o consumo de energia cair 7%.
Voltados para a educação do cidadão,
cartilhas e sites produzidos pelo governo
e por ONGs orientam o americano a escolher equipamentos eficientes e a evitar
o desperdício, com dicas de reformas que
diminuem o uso de eletricidade, como a
instalação de coletores solares e de termostatos que desligam o aquecedor ou o
ar-condicionado quando a temperatura
no quarto chega ao patamar desejado.
Projeto de lei que tramita no Congresso
americano pretende conceder deduções
no imposto de renda de até US$ 2.000 para quem construir casas econômicas.
Se o governo tornar ainda mais rígidos
os limites de gasto de energia por eletrodoméstico e se leis como essa forem
aprovadas, o crescimento na demanda
cairá de 20% a 47%. Segundo cálculos do
próprio Departamento de Energia dos
EUA, essa economia dispensaria a construção de até 610 das 1.300 usinas que a
administração Bush afirma ser necessário fazer nos próximos 20 anos para o
país não ficar no escuro.
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