São Paulo, quinta-feira, 24 de junho de 2004
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Quando o barulho detona o corpo

Nada de novo acontece com o corpo quando a pessoa está na quietude, mas, quando está sob barulho, sim. "Momentos de meditação são necessários para a saúde, senão a pessoa fica eufórica e os reflexos se tornam mais rápidos, o que altera o metabolismo e gera estresse", diz Fernando Pimentel, neurofisiologista da Universidade Federal de Minas Gerais.
A exposição à noite a ruídos superiores a 30 decibéis (dB) -até esse limite, o som equivale ao de uma tranqüila noite no campo- pode levar pessoas mais sensíveis a ter um sono superficial, gerando sonolência e cansaço ao longo do dia. O pior tipo de ruído é o intermitente, que ocorre por alguns segundos, como o de um alarme de carro ou de uma ambulância passando.
Sob a ação de ruídos de 50 dB (uma conversa normal) a 85 dB (um liqüidificador em funcionamento), o corpo começa a sentir efeitos de estresse. Os sintomas variam de um constante estado de alerta até a acentuação de problemas cardiovasculares e digestivos e diabetes. "Um estudo feito em Berlim, na Alemanha, mostrou que, em locais com ruído de fundo de 70 dB, a ocorrência de infarto de miocárdio é 20% maior", diz Pimentel. Outros efeitos são a diminuição da resposta imunológica e da capacidade de cicatrização dos tecidos.
Há também a liberação de endorfina, substância que gera sensação de bem-estar e pode causar dependência. Isso explicaria, segundo alguns especialistas, por que algumas pessoas precisam de barulho mesmo quando deveriam preferir o silêncio -caso, por exemplo, de pessoas que só conseguem dormir com a televisão ou o rádio ligados.
Os ruídos perturbam a capacidade de concentração e de desenvolvimento intelectual. Há estudos que relacionam o baixo desempenho de estudantes ao barulho do ambiente (da escola ou da sala de aula, por exemplo).
Porém, nessa faixa de som, os efeitos nefastos são relativos, porque dependem da interpretação pessoal e do tempo de exposição ao ruído. Ou seja, há quem fique irritado com a música do caminhão de gás, e há quem não se importe ou até goste dela. Um exemplo a respeito do tempo de exposição: um papo animado pode ser revigorante, mas encarar um falatório durante horas seguidas é capaz de deixar a pessoa estafada.
A partir de 85 dB (um show de rock), não importa se o som é agradável, ele é, necessariamente, prejudicial ao corpo, em especial à audição: as cerca de 2.000 células da cóclea de cada ouvido começam a se degenerar. Essas células são responsáveis por transformar as vibrações sonoras nos impulsos elétricos que vão para o cérebro. Quando há sobrecarga de energia, elas começam a morrer.
Para ter uma idéia, a cada 3 dB, a quantidade de energia que essas células recebem dobra. Aumentar o volume de 90 dB para 93 dB pode ser mais grave do que se imagina.
Quando a exposição a sons altos é curta e pouco freqüente, pode acontecer o chamado zumbido temporário, além de uma sensação de abafamento do som. Isso significa que as células foram afetadas, mas se regeneraram.
Quando o estilo de vida é muito barulhento, elas podem se extinguir aos poucos, sem que a própria pessoa note. Segundo Sady Selaimen, presidente da Sociedade Brasileira de Otologia, é comum pacientes irem aos consultórios com queixa de zumbido e então descobrirem a perda de audição ou vice-versa. "As duas coisas, em geral, ocorrem juntas", afirma Selaimen.
O zumbido contínuo, em geral, é um aviso antecipado da surdez e pode durar a vida toda, mesmo quando a pessoa perdeu completamente a audição. Ambos os problemas também podem ser causados por sons curtos e muito intensos, como os de explosões.


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