São Paulo, quinta-feira, 24 de junho de 2004
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s.o.s. família

rosely sayão

Pai e mãe podem pensar diferente a educação

Os médicos obstetras estão cada vez mais acostumados com a presença do pai na hora do parto. Ele está presente na vida do filho desde o nascimento e amplia, cada dia um pouco mais, essa participação. Não se contenta mais em fazer apenas figuração. Os pais querem, de fato, interferir nos rumos da vida dos filhos e, principalmente, da educação. E isso -vejam que interessante- tem gerado muitas reclamações das mães.
Não é contraditório que o que antes era motivo de reclamação pela ausência agora o é pela presença? E de que reclamam as mães? Da dificuldade de educar em conjunto.
Elas, que, por muito tempo, tiveram de decidir quais atitudes tomar com os filhos e de arcar sozinhas com tal responsabilidade, agora não sabem exatamente como lidar com a participação do pai de seus filhos.
A mãe não quer deixar o filho sair sozinho ainda, mas o pai acha que já está na hora de ele aprender a se virar no mundo; o pai quer levar a filha para a escola de carro, mas a mãe quer que ela aprenda a usar o transporte coletivo. Quando em conflito, a mãe quer conversar e tudo acaba na maior discussão com a filha, mas, para o pai, isso se resolve sem muita conversa e assim se evita a gritaria final. Esses são alguns exemplos enviados por leitores que querem saber como sair da encrenca. E numa coisa eles têm razão: é encrenca mesmo o que vivem, já que o filho, em geral bem esperto, logo descobre as discordâncias entre os pais e sempre dá um jeito de, de acordo com seus interesses, capitalizar para si algum tipo de vantagem.
Uma coisa é certa: é muito melhor que o pai e a mãe -e não apenas um deles- atuem juntos na educação. Muita gente acha que pai e mãe precisam pensar do mesmo modo sobre a educação do filho. Mas não é preciso unificar opiniões e ações, não é fundamental igualar as atitudes do pai e da mãe. Aliás, isso seria quase impossível, dadas as diferenças pessoais.
A educação do filho até pode ser enriquecida quando os pais pensam de modo diferente. Mas o difícil é o pai e a mãe saberem lidar com as próprias diferenças sem moralizar, sem avaliar as opiniões um do outro segundo as referências de certo e errado no ato de educar.
O mais comum é a mãe achar que o pai está errado e vice-versa. Como não sabemos o que é certo e o que é errado na educação familiar, podemos concluir que, na verdade, o que pai e mãe disputam é o poder de cada um na determinação dos rumos da educação dos filhos.
Dá para resolver isso? Claro que sim, mas não sabemos como, já que só no mundo contemporâneo o exercício da paternidade tem-se mostrado tão atuante e, por isso, este é o tempo de criar as saídas para os impasses estabelecidos. Mas há algumas pistas que podem ajudar. Uma delas é a de que nem tudo precisa ser acertado entre pai e mãe. Se o filho está com o pai, pode muito bem seguir as orientações dele naquele momento. Quando está com a mãe, que atenda à orientação dela, mesmo que seja diferente das dadas pelo pai em situação semelhante. E nem vamos considerar o argumento de que o filho vai ficar confuso com essa diferença de condução.
Ele não pode ser subestimado a esse ponto. Ele aprenderá logo -antes mesmo que os pais possam esperar- a identificar o que cada um exige ou pede dele para saber agir.
Mas, é claro, os pais devem conversar sobre pontos que consideram importantes para, em situações desse tipo, acordarem atitudes que adotarão com o filho. E aí é que será preciso, da parte de ambos, disponibilidade para ceder e mudar. E, principalmente, para reconhecer a importância da participação dos dois na educação dos filhos. Como estamos acostumados com o modelo "a mãe educa e o pai provê", tem sido difícil para a mulher compartilhar o papel educativo. Aceitar dividir essa responsabilidade não é fácil, mas talvez seja fundamental para os filhos e para a construção dos papéis de pai e de mãe na atualidade.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha), entre outros; e-mail: roselys@uol.com.br


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