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drible a neura
Quarto dos pais não é lugar para filho dormir
Marcelo Barabani/Folha Imagem
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Márcia, 38, deixa a filha Adrianne, 2, dormir em sua cama |
ANTONIO ARRUDA
DA REPORTAGEM LOCAL
Sorrateiramente, na pontinha dos
pés, sem alarde, a pequena Giovana, 2, entra no quarto dos pais, encosta
a cabeça na beirada da cama e, se a mãe
não a acolhe rapidamente, ela começa
a dormir em pé mesmo. "Essa cena já
se repetiu algumas vezes. Não resisto
e acabo deixando-a dormir conosco",
conta a auxiliar de contabilidade
Mauren Harue Washida, 32, que, nesse assunto, não é marinheira de primeira viagem. Seu filho Víctor, de seis
anos, desde pequeno "foge" do quarto e se enfia, de madrugada, debaixo
dos lençóis da cama do casal.
É natural a criança pedir para dormir com os pais? É natural ela gostar e
querer repetir esse ato? "Claro que
sim. Dos dois aos cinco anos de idade,
é totalmente natural; mas isso não faz
nenhum bem para ela", esclarece a
psicóloga e colunista da Folha Rosely
Sayão. Pode causar até insônia no futuro (leia na página ao lado).
E essa situação não existe só porque
crianças sentem medo, insegurança e
acham que o bicho-papão aparece
para pegá-las. "A "neura" de dormir
com os pais é coletiva", diz a psicóloga Silvana Rabello, da PUC-SP.
"Os pais são os grandes responsáveis por esse comportamento, pois
são donos de uma vontade imensa de
acolher o filho, à qual não conseguem
resistir. Eles deveriam dizer: "Não, você não pode dormir na nossa cama'",
explica Sayão (leia, na página ao lado,
sugestões dos especialistas sobre como agir nessa situação).
Hoje a jogadora de pólo aquático
Raquel Chiappini, 30, consegue ser
taxativa com o filho Bruno, de um
ano e sete meses. "Digo não e é não."
Mas ela assume que errou com a primeira filha, Izabella, de sete anos.
"Nós a acostumamos mal. Mesmo sabendo que era errado, optávamos pela solução prática, que era deixá-la na
nossa cama, em vez de levá-la para o
quarto, tranquilizá-la e fazê-la entender que deveria dormir lá."
Já a engenheira Márcia Magalhães,
38, mãe de Adrianne, de dois anos e
onze meses, não titubeia: "Eu não falo
nada. Se ela quer ficar com a gente,
que fique. Logo ela vai crescer e desistir disso", diz.
Há pais que vão um pouco mais
longe. A organizadora de eventos Zoraide Bertussi, 50, conta que incentivava o filho a dormir com ela e o marido para agradar o garoto. "Separei-me do meu marido no ano passado. O
Victor está com 11 anos e, vira-e-mexe, pede para eu deixá-lo dormir comigo", conta.
Ceder nesses casos não é a atitude
recomendada. Por trás de uma
negativa veemente está a possibilidade de a criança desenvolver
uma qualidade fundamental para
a sua vida futura: a autonomia.
"Os pais devem aproveitar essas
situações para ensinar aos filhos
mecanismos para que eles aguentem as próprias inseguranças, para que enfrentem seus medos e
suas angústias de forma autônoma", diz a psiquiatra Pilar Lecussan, do Instituto da Criança do
Hospital das Clínicas (SP).
Para Rabello, é nesses momentos que os pais estabelecem não
apenas o limite físico da relação,
ou seja, que cada um tem o seu
cantinho e a sua intimidade.
"É a hora de definir o espaço psíquico da criança, de mostrar a ela
que todos sentimos medo e que
nós mesmos temos de resolvê-lo",
diz a psicóloga.
Por outro lado, quando os pais permitem que o filho passe a noite no
quarto do casal, estão estimulando o
medo e a insegurança. "A criança se
sente autorizada a pensar: "Está vendo? Eu não consigo dormir sozinha
mesmo!". Então, no futuro, pode criar
a idéia de que não dá conta de cuidar
da vida sem os pais", diz Sayão.
Mais que eventuais filmes de terror
assistidos antes de dormir, são as tensões dos pais que deixam a criança intranquila. "Problemas conjugais deixam o casal tenso, e esse sentimento é
transferido para os pequenos", diz Rabello. Como ainda não sabe nomear o
que sente, a criança recorre à imaginação. "Daí ela cria monstros que dormem debaixo da cama."
E de nada adianta os pais quererem
imprimir uma dose de realidade aos
devaneios infantis. Sayão conta que
um pai, cansado de afastar a cortina,
acender a luz e dizer ao filho: "Não há
nenhum mostro aqui", pediu sua ajuda. Ela disse: "A imaginação da criança é a própria realidade dela". Algum
tempo depois, o pai procurou Sayão
novamente e disse: "Consegui! Dei
uma espada de plástico a ele e disse:
"Como só você vê o monstro, quando
ele aparecer você o acerta com essa espada'". O filho nunca mais pediu para
dormir com os pais.
Outro fator que leva as crianças para
a cama dos pais é a curiosidade de saber o que eles fazem quando trancam
a porta. "Quando sentem um clima de
sedução, as crianças tendem a querer
descobrir o que está acontecendo", diz
Rabello.
Independentemente de motivos
(medo ou curiosidade) e afora o risco
de a criança ter sua autonomia prejudicada, dormir sozinho é a melhor
maneira de garantir um sono de qualidade, indispensável não só para a
criança, mas para toda a família.
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