São Paulo, quinta-feira, 30 de maio de 2002
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Conceito de gestão do conhecimento muda as relações no trabalho e promove investimento na formação dos profissionais

Conhecimento dos funcionários vale ouro

Katia Monari Pessato/Divulgação
Funcionários da Serasa aprendem técnicas circenses para se apresentar em comunidades carentes, além de fotografia e pintura


ANTONIO ARRUDA
DA REPORTAGEM LOCAL

Que tipo de fenômeno é capaz de reunir num mesmo projeto um diretor de multinacional, uma monja budista, um estrategista de marketing, um rabino, vários acadêmicos (de filósofo a matemático), um chef de cozinha, um maestro e um gerente de vendas? Esse fenômeno leva o nome de gestão do conhecimento, conceito que está causando uma revolução no cotidiano das grandes corporações e na mentalidade de dirigentes e de suas respectivas equipes. O bem mais precioso de uma corporação hoje é o conhecimento, o grande diferencial competitivo no mundo do trabalho. E o principal desafio da empresa é se apropriar desse conhecimento, que está dentro da corporação, mas não é disseminado por quem o detém -os funcionários. Como dizem os especialistas em gestão do conhecimento, "se a empresa souber o que ela sabe, ela valerá três vezes mais". Ou seja, terá produtividade e lucro ampliados. Nessa busca pela aquisição do conhecimento, sobram novidades para os funcionários, que se deparam, às vezes, com mudanças radicais em sua rotina. Segundo o presidente da SBGC (Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento), Marcelo Corrêa, "quando são estabelecidas conexões entre as pessoas, o conhecimento surge naturalmente". Por conta disso, as empresas desenvolvem as mais diversas estratégias para aproximar os funcionários e humanizar as relações. Elas vão de concurso de culinária e malabares à decoração coletiva de uma árvore de Natal e à apresentação de uma orquestra (leia mais na página 7). E por que um espetáculo de música clássica pode ser útil a um profissional da área de engenharia elétrica, por exemplo? "Porque o bom profissional sabe que precisa refinar suas habilidades e desenvolver a capacidade de prestar a atenção em si e no outro", diz o filósofo, colunista da Folha e consultor em gestão do conhecimento Mario Sergio Cortella. "Essas ações podem parecer banais, mas são bastante úteis. Com essas atividades, o nível de competição entre as pessoas diminui, elas ficam mais relaxadas no processo de troca de experiências e, consequentemente, na transmissão do conhecimento", diz Betânia Tanure de Barros, psicóloga especializada em comportamento organizacional e professora da Fundação Dom Cabral. Além disso, essas iniciativas "aumentam a fidelidade e a capacidade criativa do funcionário", diz Cortella. "O Paulo Autran tem participado de vários eventos promovidos pela Fundação Dom Cabral. Após um monólogo, ele fala sobre o significado de representar. Isso gera um grande debate entre os participantes", conta Betânia de Barros. "É sem dúvida interessante. Havia departamentos que eu nem sabia que existiam, pessoas com as quais eu cruzava e não trocava nem um bom-dia", conta Bernhard Schultze, gerente de produtos da Nortel Networks, que participou no ano passado de um curso de fotografia e acabou de se inscrever para o concurso de culinária que a empresa vai promover. "A gestão do conhecimento implica uma mudança cultural profunda. É preciso passar de uma filosofia totalmente competitiva para uma filosofia colaborativa. Se a empresa tiver uma cultura individualista, os funcionários nunca vão se sentir estimulados a trocar o conhecimento entre si", diz Corrêa. A diretora da FEA (Faculdade de Economia e Administração da USP), Maria Tereza Fleury, confirma: "Se não há clima de confiança, o funcionário vai pensar: "Se eu divulgar o que sei, vou ser demitido logo depois".

Tácito x explícito
Até as experiências de vida dos funcionários são valorizadas na gestão do conhecimento. Elas compõem o chamado conhecimento tácito, em oposição ao explícito, este proveniente da atividade prática do funcionário em seu dia-a-dia e obtido por meio de instrumentos formais, como cursos, workshops, livros e os chamados "cases" das empresas.
Segundo Betânia de Barros, "o conhecimento tácito está inserido nas relações que as pessoas mantêm entre si". Por essa razão, o programa de desenvolvimento de equipe promovido pelo O Boticário prevê uma etapa em que os funcionários, reunidos em vivências, comentam fatos pessoais que tenham marcado suas vidas. "Quando muito, um funcionário conhece o outro somente pelo que ele é na empresa. É importante a proximidade com a experiência pessoal de cada um", diz Maria Letícia Sá Fortes, coordenadora do núcleo de desenvolvimento de competência da empresa em Curitiba.
Para desenvolver o outro tipo de conhecimento, o explícito, as empresas promovem atividades criadas pelas suas "universidades" internas; por fundações ligadas a universidades de primeiro time, como USP, FGV e PUC; por entidades formadas por acadêmicos, como a Fundação Dom Cabral; ou ainda por empresas constituídas por especialistas de outras áreas.
O vendedor José Ignácio Panegaffi, 65, trabalha há 34 anos na Boehringer do Brasil. Fez diversos cursos de especialização e aprimoramento e diz que a empresa, para ele, "é uma eterna faculdade". "Tenho uma vida de aprendizado", diz.
Responsável pelo gerenciamento de 51 lanchonetes da rede McDonald"s, Rogério Barreira acaba de ingressar no Programa Líderes do Século 21, que a empresa desenvolve em parceria com a FGV. Ele foi um dos selecionados para fazer um MBA ("master business administration"). "Estou extremamente feliz. É um conhecimento que vou utilizar dentro e fora da empresa."



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