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A tecnologia está roubando o emprego dos trabalhadores?
Investimento
em tecnologia
não aumenta
o desemprego
se a economia
está crescendo;
robotização
criou empregos
na fábrica da
Volkswagen
em Taubaté
MARIO CESAR CARVALHO
da Reportagem Local
Grande cara, o Adamastor.
Quando chegou à fábrica da
Volkswagen, o grandalhão espalhou pânico na linha de montagem. Caladão, fazia o trabalho de
quatro soldadores. Com o tempo,
foi ganhando a confiança da peãozada. O truque? Não roubou o emprego de ninguém. Ao contrário.
Era tão rápido que contrataram
mais metalúrgicos para dar conta
das carrocerias que ele soldava.
Adamastor é um robô. Opera na
Volks em Taubaté (SP), a fábrica
mais robotizada do país. Em 1994,
tinha 60 robôs e 6.403 funcionários. Ano passado, os robôs mais
que dobraram (eram 137) e o número de empregos cresceu para
7.471. A demanda pelos carros ali
produzidos, o Gol e a Parati quatro portas, e a velocidade dos robôs levaram a Volks a contratar
mais metalúrgicos.
Se o ministro do Trabalho, Edward Amadeo, desse um pulinho
até essa fábrica, veria sua justificativa de que a principal causa do
desemprego no Brasil são as novas
tecnologias ser estraçalhada.
Pergunte a Paulo Cesar da Cruz,
33, um prensista convertido em
operador de robô com as mudanças tecnológicas. "Eu achava que
robô tinha duas pernas e andava,
como nos filmes. Tinha um pouco
de medo do bicho. Quando eles
chegaram aqui, vi que não era nada daquilo. Fui estudar o robô, ganho mais hoje, e ninguém foi demitido", conta Cruz, cujo salário
passou de R$ 1 mil a R$ 1,6 mil
com a robotização.
Crescimento e negociação
Não houve mágica na Volks. Só a
combinação de dois fatores que
desmontam a hipótese de que a
tecnologia desemprega: a produção de carros era crescente e o sindicato dos metalúrgicos conseguiu barganhar um acordo em que
cediam em alguns pontos, mas garantiam que a introdução de novas máquinas não desempregaria
ninguém -os funcionários atingidos seriam retreinados.
O maior levantamento sobre o
impacto da modernização na indústria brasileira, feito pela CNI
(Confederação Nacional da Indústria) e Senai (Serviço Nacional da
Indústria), confirma que Adamastor pode ser um bom camarada
-e que o senso comum está errado quando acredita que o seu trabalho está sendo roubado por máquinas modernas e computadores.
O setor da indústria que mais desempregou entre 1992 e 1996, segundo o estudo, foi a construção
civil -33,8% dos empregos foram
cortados no período.
Coincidência ou não, a construção civil foi o setor que menos investiu em tecnologia. Só 5% da receita operacional líquida (o faturamento já descontados os impostos) das construtoras foram gastos
na compra de novos equipamentos (veja quadro ao lado).
O antípoda da construção civil
em investimento tecnológico foi o
setor de telecomunicações. As empresas investiram 40,6% de suas
receitas em novos equipamentos e
o setor ficou em primeiro lugar
entre as que menos desempregaram no período de 1992 e 1996
-1% dos empregados foram demitidos.
Ciranda do emprego
Então, tecnologia não causa desemprego?
Não é bem assim. Um estudo da
OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico), assinado por Martin Carnoy,
da Universidade Stanford, e Manuel Castells, da Universidade da
Califórnia, conclui que tecnologia
cria e destrói empregos ao mesmo
tempo. Tudo depende do local observado e do ambiente econômico
em que é aplicada.
No local onde é aplicada a tecnologia desemprega automaticamente. Na linha de soldagem da
Volks, por exemplo, o robô desemprega, mas cria empregos na
montagem final porque mais carrocerias estão sendo produzidas
graças aos robôs.
A principal causa do desemprego é a velocidade de crescimento
da economia. Com a economia
andando em marcha lenta, como é
o caso do Brasil, a tecnologia pode
desempregar, mas quando o cenário é de crescimento, o choque tecnológico cria empregos, segundo
Mario Sergio Salerno, professor
do curso de engenharia de produção da Escola Politécnica da USP.
O exemplo mais contundente é a
comparação dos Estados Unidos e
do Japão, os países mais automatizados do mundo, com a Europa,
onde a difusão tecnológica segue
um ritmo menor.
Enquanto os Estados Unidos e o
Japão criaram, respectivamente,
35 milhões e 15 milhões de novos
empregos nas últimas duas últimas décadas, os 12 países da Comunidade Européia não foram
além dos 7 milhões, a maioria deles públicos, segundo Carnoy e
Castells.
O movimento simultâneo de
criação e destruição de empregos
pela tecnologia não é novo nem foi
resultado do barateamento dos
computadores. Entre 1909 e 1919,
o número de empregados nas fábricas de carruagem caíram de 70
mil para 26 mil nos EUA. Para esses trabalhadores, era o apocalipse. A indústria automobilística,
porém, mais do que compensou
os cortes -seus funcionários passaram de 85 mil para 394 mil no
período.
O salto da importação
No Brasil, houve um fenômeno
similar ao das carruagens com a
abertura do mercado de automóveis à concorrência internacional
no governo Collor.
Em 1991, quando o mercado foi
aberto, a indústria empregava
124.859 trabalhadores e produzia
960.219 veículos. Ano passado, os
empregos caíram a 116.667 e a produção mais que dobrou em relação a 1991 -2.067.452.
"As montadoras tiveram um
ganho de produtividade brutal,
reduziram o número de funcionários, mas a abertura do mercado
criou empregos nas importadoras, no porto, nas concessionárias,
nas lojas de peças e oficinas mecânicas", diz o engenheiro José Roberto Ferro, professor da Fundação Getúlio Vargas e pesquisador
da indústria automobilística.
Tecnologia cria emprego quando aumenta a produtividade, esse
ganho é repassado ao consumidor
com queda de preço do produto, o
mercado se expande e essa expansão gera novas oportunidades de
negócios.
Com a economia estagnada ou
crescendo pouco, como ocorre
com o Brasil, os ganhos de produtividade não significam queda de
preços nem expansão do mercado
-daí o desemprego.
O discurso de que a tecnologia é
culpada pelo desemprego não passa de cortina de fumaça, segundo
Salerno, da USP.
"Esse discurso pode servir para
ganhar a eleição, mas não tem base científica. Se o governo admitisse que a tecnologia não tem muita
culpa, pelo menos estaria lidando
com a verdade. E a verdade é a melhor maneira de começar a combater o desemprego", diz.
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