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DE ÔNIBUS
Arquiteto se diz bóia-fria do ensino
da Reportagem Local
Mogi das Cruzes é uma cidade a
50 km a leste de São Paulo, tem 313
mil habitantes, está a caminho do
mar-mas não tem praia-, e parece não ter atrativos suficientes
para que alguém se desloque até lá
duas vezes em um mesmo dia.
Mas é exatamente isso que faz,
duas vezes por semana -todas as
segundas e quintas-feiras-, o arquiteto Decio Amadio, 47.
Ele mora na capital, onde tem seu
escritório, e ensina Desenho Urbano na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo Brás Cubas, de Mogi,
município que pertence à Região
Metropolitana de São Paulo.
O horário é "supermaluco", como o próprio arquiteto define: ele
acorda às 5h30 para pegar o ônibus
fretado pelos professores de São
Paulo que também ensinam lá e às
11h, como não tem "nada para fazer" em Mogi, volta para a capital.
Às 17h30, toma novamente o
ônibus para dar as aulas noturnas,
e às 23h30 faz a rota de volta para
casa. "Quando chego, estou acabado", conta.
Como ele, Amadio estima que
60% dos professores que ensinam
na faculdade moram e têm escritórios ou outro trabalho remunerado em São Paulo. Para o arquiteto,
que também acompanha um projeto seu em Bragança (80 km ao
norte de São Paulo), o emprego fixo em Mogi é a principal fonte de
renda.
"Parece que há uma tendência de
expansão do trabalho para fora da
Grande São Paulo", opina o arquiteto. Entre os professores, existe
até uma brincadeira de se chamarem uns aos outros de "bóias-frias" do ensino, porque já há
quem se divida entre três ou quatro diferentes locais de trabalho.
TRÂNSITO E CHUVA
Amadio se sente um "expert"
nisso: antes de começar a trabalhar
em Mogi, há sete anos, se dividia
entre São Paulo e Santos (72 km a
sudeste da capital), onde participou de um projeto durante um ano
e meio.
A vida que o arquiteto e seus colegas professores levam tem um
inimigo: o tráfico. Decio Amadio
diz que o horário para ir (cedo pela
manhã) e voltar (à noite) é tranquilo, fora da hora do rush: em 50
minutos chegam e vêm de lá.
O grande problema é sua saída
no meio da tarde. "Aí, a Marginal
(Tietê, via expressa de São Paulo)
está uma loucura. Em uma das enchentes, saí de lá às 11h, consegui
chegar no escritório às 15h e daí
para voltar a Mogi foi outra confusão."
Segundo o professor, durante o
período de chuvas em São Paulo os
alunos ficaram vários dias sem ter
aula porque era praticamente impossível para os professores chegar lá.
Já a rotina das viagens de ônibus
não chega a ser um problema para
Amadio. "Se fosse a semana inteira, acho que começaria a complicar, mas como são só dois dias, para mim é tranquilo."
Para esquecer a paisagem que se
repete indefinidamente pela janela
do ônibus, o arquiteto lê, dorme ou
conversa com os colegas -eles
têm até um dia favorito de bate-papo, as segundas-feiras, quando as
notícias dos jornais no domingo
são uma desculpa para puxar assunto e matar o tempo.
(CYNARA MENEZES)
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