São Paulo, sexta, 2 de outubro de 1998

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DADAÍSMO E SURREALISMO
Dadá comeu primeiro


Dadaístas transformam canibalismo em estética; surrealistas dão-lhe conotação sexual


Divulgação
'Impossível' (1944), da artista surrealista brasileira Maria Martins


MARIO CESAR CARVALHO
da Reportagem Local

Foram os dadaístas -eles, de novo- que transformaram o canibalismo em operação estética. Aconteceu em 1920, oito anos antes do "Manifesto Antropófago", com a revista "Cannibale", de Francis Picabia (1879-1953).
Canabalismo, até então, era o ato supremo da selvageria, o tabu máximo, o fio que separava a civilização da barbárie. Na operação que negativou os valores ocidentais, um reflexo dos mortos na Primeira Guerra (1914-1917), os dadaístas converteram a antropofagia de tabu em totem, em sinal de religiosidade superior.
Essa espécie de pré-história da antropofagia será contada em sala especial da Bienal. Estão lá a revista "Cannibale" e obras de Picabia, Dalí (1904-1989), Masson (1896- 1987) e Schwitters (1887-1948).
Com os dadaístas, a antropofagia viveu sua primeira dentição estética. Prevalece o espírito de afronta, de canibalizar tudo que não era considerado arte -vide as colagens e "ready-made" com objetos supostamente sem valor estético e anúncios publicitários.
Com os surrealistas, a operação adquire conotação sexual. De Dalí, a Bienal trouxe do museu do artista em Figueras (Espanha) 14 gravuras baseadas nos "Cantos de Maldoror", de Lautréamont.
A idéia de Novalis de que "o desejo sexual talvez não seja mais do que um disfarçado apetite por carne humana" é traduzida em imagens. Numa gravura, um homem devora a barriga de um bebê. Noutra, retalha a nádega com uma faca. Não por acaso, foi Dalí quem reescreveu o lema de Breton ("A beleza será surrealista ou não será") com um viés antropofágico: "A beleza será comestível ou não será."

Visite o site oficial da XXIV Bienal de São Paulo


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