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CONTAS PÚBLICAS
Constituintes criaram novas atribuições para o
Estado sem vincular as respectivas receitas
Carta criou despesas
sem fonte de recursos
GUSTAVO PATÚ
da Sucursal de Brasília
Os constituintes eleitos em 86
criaram, no papel, benefícios e direitos sociais de Primeiro Mundo,
mas não definiram como o Estado
iria, na prática, cumprir as novas
obrigações.
Trata-se de um princípio básico:
para que o governo possa prover
qualquer serviço, é necessário que
a sociedade gere riqueza suficiente
e que parte dessa riqueza seja paga
em impostos.
Entre outras regras, o texto
constitucional de 88 estabeleceu o
piso de um salário mínimo para os
benefícios da Previdência, criou o
seguro-desemprego, garantiu a estabilidade dos servidores públicos
e definiu assistência pública para
idosos e deficientes.
De 88 para cá, o Estado passou a
se apropriar de uma fatia maior da
renda do país. A carga de impostos
saltou de 22% para 30% do PIB
(Produto Interno Bruto, medida
da riqueza nacional), uma das
mais altas do mundo para países
com o nível de renda brasileiro.
Os gastos públicos estão em patamares ainda mais elevados -de
quase 38% do PIB. Mas nem assim
se chega perto da cobertura social
desenhada pela Constituição.
Pior: gastando mais do que arrecada, o governo absorve boa parte
da poupança do país que deveria
estar financiando investimentos
-ou seja, mais riqueza no futuro.
É claro que não se pode simplesmente jogar sobre a Constituição a
culpa pelo déficit público, que
sempre existiu no país.
Mas basta analisar o Orçamento
do ano que vem (ver quadro nesta
página) para notar como as obrigações constitucionais, mesmo insatisfatoriamente cumpridas, absorvem quase toda a arrecadação
federal e deixam pouca margem de
manobra para os administradores.
A receita do governo será de R$
187,8 bilhões, dos quais quase 80%
-R$ 146,7 bilhões- não podem
ser reduzidos: são gastos com pessoal, benefícios previdenciários e
transferências a Estados e municípios, todos protegidos, até agora,
pelo texto constitucional.
Sobram R$ 41,1 bilhões, dos
quais metade vai para gastos sociais prioritários (saúde, educação, reforma agrária e assistência
social) e metade para obras e custeio da máquina administrativa.
Ficam faltando R$ 40 bilhões para pagar os juros da dívida federal
que, se não forem abatidos, vão
engordar a dívida pública -ou seja, gerar mais despesas no futuro.
Dívida social
"A Constituição representou,
na época, um pacto para o resgate
da chamada dívida social atribuída ao regime militar", avalia o
economista Raul Velloso, especializado em contas públicas.
Outros dois objetivos, diz Velloso, eram a moralização do serviço
público e o fortalecimento dos
municípios.
Ao passarem para o recém-criado Regime Jurídico Único, cerca
de 400 mil servidores públicos antes regidos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) ganharam estabilidade e direito à aposentadoria integral.
Em 99, o governo federal gastará
R$ 22 bilhões com seus inativos,
para uma receita de R$ 3 bilhões
das contribuições dos servidores
da ativa.
A Previdência dos trabalhadores
da iniciativa privada gastará R$
57,5 bilhões em benefícios, cerca
de R$ 7 bilhões acima da arrecadação. Qualquer aumento do salário
mínimo elevará o déficit.
Os gastos sociais são menores
que os gastos com pessoal Äapesar de os servidores não receberem aumentos salariais desde 95.
E, pior, são candidatos a cortes
quando o governo resolver controlar o crescimento da dívida pública.
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