São Paulo, sábado, 13 de março de 2010

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Geraldão estreou na Ilustrada em 1983

Glauco não passou em engenharia e começou a desenhar nos anos 70

Cartunista teve influência de Henfil, com quem morou em SP, e estreou na Folha em 1977, ano em que ganhou prêmio em salão de humor

Antonio Carlos Borja/Arquivo Circo
O cartunista com o filho Raoni, em outubro de 1987, em foto para a publicação "Geraldão" na Redação da editora Circo, na Pompeia

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE OPINIÃO

Numa entrevista, em 1985, por ocasião do lançamento de seu livro "Abobrinhas da Brasilônia", Glauco foi convidado a falar sobre o poder do humor. Descreveu, então, um cartum de Henfil: "Está todo mundo lá na igreja, sério e circunspecto, quando um sujeito solta um pum bem alto. Ninguém consegue se segurar e no fim todos estão rindo, do padre aos fiéis. Esse pum é um exemplo de como o humor pode desmontar, ainda que por instantes, uma instituição secular".
Esse era o tipo de graça que ele gostava -e compartilhava com o criador dos Fradinhos, com quem também dividiu, como convidado, um apartamento, no bairro de Higienópolis, em São Paulo. Eram os últimos anos da década de 70.
Glauco, que nasceu em 10 de março de 1957, na cidade de Jandaia do Sul, no Paraná, havia se transferido para Ribeirão Preto, em 1975, onde tentou um vestibular para engenharia. Não passou -o que afinal foi melhor para todos. Ele conhecia Jimi Hendrix e o "Pasquim" e, em sua cidade natal, já ensaiara os primeiros cartuns.
Foi em Ribeirão que pela primeira vez publicou seus desenhos, pelas mãos do jornalista José Hamilton Ribeiro, que dirigia, na cidade, o "Diário da Manhã". "Ele parecia um hippie do mato, caipira, com uma barbicha", lembra. "Era muito tímido, mas as pessoas que o conheciam diziam que era bom. O traço ainda era tosco, ele nunca foi de filigrana. Mas batia fundo. Dava já para ver que tinha talento."
Em 1977, Glauco ganhou um prêmio no Salão do Humor de Piracicaba, que tinha no júri alguns dos mais prestigiados cartunistas do país, como Jaguar, Millôr Fernandes e o próprio Henfil -além do jovem Angeli, premiado no evento em 1975. Já chargista da Folha, Angeli editava uma página de humor no suplemento "Folhetim", intitulada "Vira Lata". Foi ele quem convidou Glauco a publicar seus primeiros desenhos no jornal. Ele estreou na Ilustrada em 1977, com um traço que lembrava muito Henfil.
Foi alguns depois que o chargista passou para a página de quadrinhos da Ilustrada. No dia 4 de outubro de 1983, logo abaixo do "Chiclete com Banana", de Angeli, que abria a seção, e acima de personagens como Garfield e Cebolinha, entrou em campo o espantoso Geraldão -para alegria de muitos e desespero de alguns.
Era impossível que passasse em branco aquele boneco compulsivo e desejante, com tantas pernas, braços, seringas, sanduíches e cigarros, para não mencionar aquilo que o autor costumava chamar de "pingolim" -às vezes à mostra, às vezes encoberto por uma obscena tarja preta.
O personagem, que Glauco dizia ser autobiográfico "com exageros", foi o abre-alas de um divertido cortejo que ia do profeta Zé do Apocalipse ao doidão Doy Jorge, passando pelo Casal Neuras. O sucesso das tiras foi notável e levou-o à televisão -foi roteirista do "TV Pirata", da Globo.
Com um jeito particular, que unia inocência e malícia, e uma personalidade avessa à violência, acabou por morrer da mesma maneira que outros militantes da paz.


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