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COMO É NOS EUA
Lei rigorosa e restrições inibem vazamentos, e acordos com infratores flagrados levam à prisão de "tubarões"
País fiscaliza com técnica antidroga
MARCIO AITH
de Washington
Há mais de seis décadas os Estados Unidos combatem com uma
lei rigorosa e métodos "detetivescos" o uso indevido de informações privilegiadas em praticamente todos os setores da sociedade.
Em 1934, o Congresso norte-americano aprovou um código de
conduta (o "Securities Exchange
Act") que criminalizou como princípio geral de mercado o uso de informações privilegiadas e obrigou
acionistas com mais de 10% de
participação em companhias abertas a comunicar ao público o volume e o preço das ações que compraram e venderam.
Na década de 80, o sistema de
prevenção foi fortalecido ainda
mais com a instalação de gravadores que registram os diálogos nas
reuniões do Fed (Federal Reserve),
o poderoso banco central norte-americano.
Como mafiosos
Junto com as leis e o registro detalhado das reuniões oficiais, a
SEC (Securities Exchange Commission), órgão fiscalizador do
mercado, adotou para a investigação de crimes contra o mercado os
mesmos padrões usados contra
traficantes de drogas e mafiosos.
Telefones são grampeados, executivos de renome são cooptados
para entregar seus colegas em troca de uma redução na pena criminal e as operações de compra e
venda de ações são minuciosa e
diariamente estudadas para que se
detecte eventuais comportamentos suspeitos.
As leis e a fiscalização rigorosa
acabaram moldando os hábitos
sociais dos agentes de mercado.
Funcionários públicos e executivos de companhias evitam ir a bares, restaurantes e eventos frequentados por especuladores e
corretores. Quando num mesmo
ambiente, evitam conversas prolongadas.
Essa experiência de seis décadas
e meia permitiu milhares de investigações espetaculares, prisões de
integrantes da elite burocrática e
financeira do país e revelou uma
realidade ambígua e inusitada: a
obsessão das autoridades em punir os que lucram com informações secretas tem sido tão eficaz
quanto a capacidade do mercado
de driblar essas autoridades.
Casos históricos
A década de 80 foi pródiga em
comprovar a vitalidade do mercado em desafiar os fiscalizadores,
por mais rigorosos que esses últimos sejam. Alguns casos que resultaram em prisão também fizeram história.
Em maio de 1985, Dennis Levine,
então um dos mais promissores e
espertos agentes de mercado,
"comprou" de um operador do
banco de investimento Lehman
Brothers a informação (até então
secreta) da fusão entre a gigante da
indústria do tabaco R.J. Reynolds e
a Nabisco, um dos maiores grupos
do setor de alimentação em todo o
mundo.
Como assessor da fusão, o Lehman Brothers deveria ter mantido
a informação em sigilo. O esperto
Levine, que havia convencido um
ex-colega a vender essa informação por US$ 10 mil, adquiriu US$ 9
milhões em ações da Nabisco.
Sentou-se em sua cadeira e esperou pelo anúncio oficial da fusão,
que aconteceria algumas semanas
mais tarde e que provocaria uma
enorme elevação no valor das
ações da Nabisco. Só nessa operação, Levine lucrou US$ 2,7 milhões. Durante seis anos, ele conseguiu arrecadar um valor estimado
em US$ 12 milhões somente com
informações privilegiadas que
comprou no mercado negro de
Wall Street.
Prisão
Levine acabou sendo pego pela
SEC alguns anos depois. A agência
começou a investigar compras maciças de ações nas semanas que antecederam as maiores fusões do setor privado.
Descobriram que apenas um
banco, sediado nas Bahamas (paraíso fiscal no Caribe), havia sido
responsável por 80% dessas compras. A quebra do sigilo bancário
provou a ligação do banco a Levine, que acabou confessando.
Ele foi preso em 1986, condenado
a dois anos de prisão e a uma multa
de US$ 11 milhões, pouco menos
que arrecadou.
A pena foi considerada branda
porque ele colaborou com investigadores e os ajudou a prender outro famoso comerciante de informações privilegiadas: Ivan Boesky,
apelidado pelo mercado de "Ivan,
o terrível".
Entre dezenas de ilegalidades,
Boesky, presente em quase todas
as colunas sociais do país e figura
poderosa do mundo financeiro,
recomprava as informações obtidas por Levine e as usava numa escala ainda maior.
Ele teria lucrado US$ 500 milhões com informações privilegiadas, quase todas obtidas entre um
uísque e outro na filial de Nova
York do prestigioso Harvard Club.
"Dedado" por Levine, Boesky foi
condenado a três anos de cadeia e a
uma multa de US$ 100 milhões.
Sua pena também foi considerada
branda por ter concordado em colaborar com a Justiça num acordo
polêmico: entregou Martin Siegel,
operador de mercado que lhe vendia informações e que, portanto,
tinha importância mais reduzida.
Siegel, no entanto, foi peça chave, alguns meses depois, na prisão
do maior "tubarão" das finanças
dos EUA, Michael Milken, que
descobriu as possibilidades de lucro das ações de pequenas empresas e as comprou maciçamente,
dando liquidez a elas.
Sob orientação do FBI, Boesky
gravou conversas comprometedoras com Milken, que pegou oito
anos de cadeia e pagou US$ 1,5 bilhão em multas.
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