São Paulo, domingo, 30 de junho de 2002

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CORÉIA 6 x 0 JAPÃO


Na Copa binacional, sul-coreanos ganham no custo, na torcida, na alegria, no técnico, nos estádios e nos telões


RICHARD WERLY
DO "LIBERATION"

Uma Copa do Mundo, dois países, prometia a Fifa. Um mês depois, na véspera da final de Yokohama, o primeiro balanço deste Mundial bicéfalo demonstra que duas competições paralelas ocorreram no Japão e na Coréia do Sul. Cada uma com seu leque de diferenças culturais, logísticas, materiais e jornalísticas. Vejamos os detalhes.

Seul, camisa vermelha
O dia em que as recepcionistas sul-coreanas tirarem suas camisas e suas camisetas vermelhas ficará marcado com uma cruz no calendário. Chegando de Tóquio, onde quase nada anuncia a Copa, percebo que a escolha das vestimentas demonstra a diferença de tom e de ambiente que reinou nos dois países nas últimas semanas.
As vitórias da Coréia do Sul transformaram o país numa festa de vermelho. O slogan "Seja vermelho" virou a nova palavra de ordem de uma população tão maravilhada com seus jogadores que até mesmo os lares de pessoas mais velhas estampam o uniforme da Coréia do Sul. Dez milhões de camisas da seleção ou de camisetas relacionadas a ela foram vendidas no país, segundo o jornal "Korea Times". Também foram vendidos milhões de broches vermelhos (usados pelos que ficaram fiéis a um traje mais formal).
A febre azul japonesa, visível sobretudo em dias de jogos da seleção nipônica (eliminada nas oitavas-de-final) e confinada ao centro das grandes cidades e aos arredores dos estádios, não "causou nem um resfriado".

Os técnicos viram moda
Acreditava-se no paralelo perfeito. Duas equipes asiáticas treinadas por estrangeiros. Dois técnicos com discursos quase idênticos, enfatizando a condição física e a preparação mental. Porém o desenrolar da Copa cavou um buraco entre as duas formações.
Com seu time, o treinador francês do Japão, Philippe Troussier, pendurou as chuteiras já nas oitavas com uma honrosa derrota para a Turquia. Já o holandês Guus Hiddink, apoiado nas vitórias dos "diabos vermelhos", atingiu o status de estrela incontestável e de supercidadão na Coréia do Sul.
Troussier, agora que a eliminação nipônica foi digerida, está à procura de um emprego. Hiddink está no sétimo céu. A Coréia lhe ofereceu uma mansão na ilha de Jeju, um passaporte de cidadão honorário e a nacionalidade sul-coreana. Jeju, um paraíso para recém-casados, pretende homenageá-lo com uma estátua.

Maratona de estádios
Antes de tudo, a decisão de construir um estádio é política. A organização de suas vias de acesso é, no entanto, uma questão de logística. Analisando apenas os dois estádios das semifinais, sem entrar em mais detalhes, basta dizer que o trajeto até o estádio da capital sul-coreana demora em média 30 minutos para quem está no centro da cidade. Já no lado japonês, o trajeto demora ao menos uma hora e meia. Porém Saitama possui um museu em homenagem a John Lennon em sua cúpula, que é diretamente conectada a uma estação de metrô. Para os torcedores que são fãs dos Beatles, a escolha não se discute.

Fatura elevada
Os sul-coreanos tinham uma vantagem inicial. Uma refeição custa três vezes mais barato em Seul do que em Tóquio, e a conta do hotel segue a mesma proporção. Resultado: não é fácil encontrar torcedores de países asiáticos (que não participaram da Copa) nas ruas da capital nipônica. Para aqueles oriundos de um país ocidental, o primeiro passeio na cidade foi um choque. Resultado: O lucro turístico proveniente do evento não chegou nem perto do esperado. Na Coréia, embora o problema também tenha existido, a frustração foi menor.

"Felicidade" cotidiana
Uma Copa organizada por dois países tem, intrinsecamente, problemas organizacionais. Dois bilhetes de transporte (um para cada país), vôos programados, mas nem sempre cumpridos, uma loja de suvenires da Fifa com preços astronômicos, uma multiplicação de estádios que, às vezes, obrigava os torcedores a percorrer mais de mil quilômetros entre um jogo e outro, duas línguas distintas e situadas entre as mais difíceis do planeta. Até nisto os sul-coreanos levaram vantagem, arranhando um pouco melhor o inglês.

Telas maiores ou menores
Os japoneses deveriam propor a seus políticos que fossem à Coréia do Sul com mais frequência. Os sul-coreanos puderam assistir a todos os jogos de sua seleção em telões instalados no centro das principais cidades do país. Salvo raras exceções, os japoneses preferiram confinar os fãs desprovidos de ingressos para os jogos à televisão. Cada um colhe a febre futebolística que semeia...


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