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São Paulo, sábado, 04 de outubro de 2003

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MOTOR

Autoflagelação

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

Barrichello teve um dia de cão em Indianápolis. A reconstrução parcial desse dia vem a seguir e evidencia a situação em que ele se colocou no momento em que trocou o papel de piloto de F-1 para o de piloto da Ferrari.
A classificação do sábado rende páginas e páginas a Kimi Raikkonen, mas poucos centímetros à situação mais interessante do grid, Barrichello, em segundo, exatamente à frente de Montoya. Schumacher, em sétimo, parece hipótese improvável. Enfim, o mundo da F-1 amanhece e toma o café imaginando que a largada do GP dos EUA será decidida entre três pilotos, mas não os três que decidem o título. Ou seja, Barrichello está sob enorme pressão.
Já no autódromo, procura Montoya e mantém com ele uma conversa reservada. O piloto brasileiro está lá para dar satisfações, não apenas ao colega colombiano, um amigo, mas indiretamente para a Williams, sua única opção de mercado -já ouviu um "chegou tarde" da McLaren, alusivo à contratação de Montoya.
Luzes vermelhas acesas e apagadas. Barrichello larga mal, Montoya também. Estavam do lado sujo da pista, ficam para trás, Schumacher e outros ultrapassam fácil. É o suficiente para o Galvão pergunta no ar se a Ferrari teria tido a coragem de fazer jogo de equipe logo na largada.
Pouco depois, chama a atenção também uma manobra estranha. Barrichello abre descaradamente para Coulthard e recoloca sua Ferrari no trilho exatamente à frente de Montoya. O duelo, mais do que interessante para o campeonato, dura pouco. Em ritmo de desespero, Montoya toca em Barrichello, e este sai da pista.
Da caixa de brita onde seu carro ficou até os boxes da Ferrari, cumpre a distância correndo, sem parar e sem tirar o capacete. Parece ter pressa de falar com a escuderia. Demora mais que o de costume por lá, sai e fala à TV: "Câmbio... segunda marcha engasgou... tive que abrir... dei espaço suficiente para Montoya". Jogo de equipe na largada? "Não me colocaria jamais nessa situação."
Em seguida, é a vez de o colega Fábio Seixas perguntar: "Alguma bronca do Montoya?". Não há resposta. Pouco depois, sem microfone, Barrichello discute rispidamente com o repórter. Por quê?
Barrichello soube se controlar ao falar da largada, mas, por alguma razão, explodiu ao ser questionado pelo acidente. Naquele momento, talvez não soubesse que a imagem da TV afastava especulações. Pecou pela boca.
Barrichello tinha ordens, como todos tinham desde os briefings da manhã. Pode até não tê-las cumprido, mas deixou o carro achando que o mundo achava que havia feito isso ou aquilo. E, no momento de cobrar o time pela situação em que imaginou ter se colocado, foi surpreendido por uma reprimenda, não ter cumprido seu trabalho, não ter se preservado em um GP de sobrevivência.
Barrichello não fez nada de tão grave em Indianápolis, mas se achou fazendo e, devido à sua atitude, será cobrado por quem acha que fez e por quem não acha.
O último domingo foi mesmo um dia de cão para Barrichello. Mas quem apertou a coleira?

Reflexo 1
Espetacular, a vitória de Schumacher caiu como um tijolo na cabeça de muita gente na F-1, não apenas na de Barrichello. Na de Montoya, evidente, mas também na de Ralf, que resolveu falar de um suposto erro de pit da Williams e levou bronca da BMW. Talvez seja cedo para falar isso, mas é bem provável que muito do que aconteceu nos EUA terá enorme reflexo na composição do próximo campeonato.

Reflexo 2
O formato proposto pelos times, matar a sexta e engordar o sábado, nada mais é que reflexo da profunda crise que se instalou na categoria. Pelo menos não levaram a sério a idéia de Ecclestone, que queria a classificação no domingo. Agora, uma pergunta: será que a TV vai transmitir uma hora e meia de classificação na manhã de sábado?

E-mail mariante@uol.com.br


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