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LEGISLAÇÃO
Folha revela nota redigida em fevereiro, que é contestada por especialistas e sofre resistência até no ministério
Álibi olímpico foi dado antes do estatuto
GUILHERME ROSEGUINI
MARIANA LAJOLO
PAULO GALDIERI
DA REPORTAGEM LOCAL
Os cartolas do futebol espernearam, ameaçaram interromper o
Nacional, foram até Brasília fazer
lobby e, mesmo assim, não conseguiram aliviar o teor enérgico do
Estatuto do Torcedor.
Com os esportes olímpicos, a
novela foi bem diferente. No dia
21 de fevereiro, quase três meses
antes de o estatuto virar lei, um
parecer jurídico do Ministério do
Esporte assegurava que a nova lei
não se aplicaria às confederações.
O documento, obtido pela Folha, foi produzido num período
em que se discutia a aplicação do
texto para as demais modalidades
esportivas. Em todo o seu corpo, o
estatuto não traz em nenhum momento a palavra futebol. Diz apenas que as novas obrigações devem ser aplicadas a todo o "desporto profissional".
Sancionada em 15 de maio pelo
presidente Lula, a lei obriga os dirigentes a oferecerem segurança e
infra-estrutura aos fãs de esportes
e prevê uma série de penas pesadas aos que a descumprirem.
Para os olímpicos, não seguir os
dizeres do texto pode representar
também o fim da cessão de recursos públicos. Assim, perderiam
sua espinha dorsal de sustentação, a verba da Lei Piva -em
2002, o total repassado às 27 confederações foi de R$ 19,1 milhões.
Pelo que está escrito na lei, o estatuto é válido para todas as modalidades. Apesar disso, o ministro do Esporte, Agnelo Queiroz,
deu uma interpretação particular
ao estatuto, encampou o parecer
de fevereiro e declarou que deveres e penalidades ali previstos
atingem só o meio do futebol.
O problema é que, dentro do
próprio ministério, há quem discorde da posição de Queiroz.
A Folha apurou que um novo
parecer já foi elaborado pela pasta, com a data de anteontem, 3 de
junho, dizendo que o conteúdo
do Estatuto do Torcedor é, sim,
abrangente a todas as modalidades. Procurado pela reportagem,
o consultor jurídico do ministério, Francisco Xavier da Silva Guimarães, não atendeu aos pedidos
de entrevista para esclarecer as
disposições do novo documento.
Além dessa contradição interna, os argumentos da nota que
salvaguarda as modalidades ditas
amadoras não têm valor legal, segundo especialistas consultados.
Assinado por Mário Drumond
Coelho, chefe de gabinete da secretaria executiva do ministério, o
documento cita trecho da lei nš
9.981, conhecida com Lei Maguito
e que modificou itens do texto
original da Lei Pelé, para colocar
apenas o futebol como modalidade enquadrada pelo estatuto.
A nota se utiliza do artigo 28
-item que define o atleta profissional-, que seria aplicável apenas para o futebol, caracterizando-o como único esporte em que
haveria profissionalismo. Assim
sendo, os olímpicos estariam
isentos da obrigação de atender às
exigências do Estatuto do Torcedor ou de serem punidos.
"O estatuto vale para o desporto
profissional, para competições
profissionais. Quem determina se
um torneio é profissional ou não é
o atleta. Como existem jogadores
com contratos de trabalho em várias modalidades olímpicas, elas
podem ser enquadradas na lei",
diz Heraldo Panhoca, especialista
em legislação esportiva.
O advogado Leonardo Serafim
tem opinião semelhante: "A lei
diz apenas que o futebol é o único
esporte em que o contrato de trabalho [prova de vínculo profissional] é obrigatório. Mas, se atletas
de outras modalidades firmarem
contratos com seus clubes, eles
também serão caracterizados como profissionais, e os outros esportes igualmente terão que se
enquadrar nas exigências do Estatuto do Torcedor".
Como se não bastasse, o próprio texto elaborado por Coelho
se contradiz ao argumentar em
favor dos olímpicos. Em certo trecho, diz que a "associação do profissionalismo apenas ao futebol é
no mínimo duvidosa".
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