São Paulo, sábado, 05 de junho de 2004

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FUTEBOL

Maracanã, adeus?

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Ricardo Teixeira quer explodir o Maracanã. A proposta só merece ser comentada aqui por ser reveladora da visão que uma parte de nossa elite tem do país e de seus problemas.
O argumento do presidente da CBF é o de que o estádio Mário Filho está tão obsoleto que não há nem como reformá-lo para seguir as exigências da Fifa se o Brasil quiser sediar a Copa-2014. Entre outras falhas, o Maracanã não disporia em seu entorno de área livre para a construção de um estacionamento de 3.000 veículos.
Ora, a questão está sendo colocada de cabeça para baixo. Não é o Maracanã que não se adequa às exigências de uma Copa do Mundo. É o Brasil, e em particular o Rio de Janeiro, que não atende às necessidades básicas de segurança, transporte e infra-estrutura para um evento desse tipo.
Está certo, temos um grande estádio velho e cheio de problemas. Se o demolirmos, o que teremos? Nada. Ou será que o dirigente imagina que no lugar do velho dinossauro brotará num passe de mágica um similar do Stade de France ou dos espetaculares estádios que o Japão exibiu ao mundo na última Copa?
É isso que é típico dessa elite a que me referi. Ela não quer mudar o Brasil, com tudo o que isso implica de esforço coletivo, de negociação de interesses contraditórios, de superação de problemas crônicos e estruturais. Ela quer é abolir o Brasil, em nome da miragem de um país que não existe.
Habituado aos hotéis cinco estrelas, aos estádios e gabinetes refrigerados do Primeiro Mundo, Teixeira parece perder de vista o país onde vive. Há muita coisa a fazer por aqui antes de se pensar em destruir o Maracanã. O coitado não tem culpa de nada.
É possível que alguém me conteste, lembrando: "O estádio de Wembley tinha até mais tradição que o Maracanã, e os ingleses o implodiram".
Responderei: em primeiro lugar, é problema deles. Em segundo lugar, eles têm muito mais dinheiro para erigir estádios modernos e menos problemas urgentes a resolver.
Em terceiro lugar, ao defender o Maracanã, não sou movido só pelo desejo de preservar a tradição. O Mário Filho ainda é o grande palco da diversão mais popular do país. Qual foi o estádio que recebeu as maiores (e mais animadas) platéias neste ano de 2004? Resposta: o Maracanã, nas finais do Estadual do Rio.
O que existe no ar é uma clara tentativa de elitizar o futebol, de transformá-lo em programa de endinheirados. O povo que assista pela televisão. As federações aumentam o preço dos ingressos, clubes como o Atlético-PR tentam afastar de seu estádio os torcedores pobres, a TV marca os jogos para as 21h40, e por aí vai.
Evoca-se o exemplo do que ocorreu na Europa, apela-se ao argumento da falência dos nossos clubes, lança-se mão do desgastado termo "modernidade". Conclusão: não basta demolir o Maracanã, esse símbolo incômodo do futebol como festa popular; é preciso substituir o povo brasileiro por uma turma mais chique.

Ronaldo salva
Brasil 3x1 Argentina: uma partida em que o talento do atacante Ronaldo salvou um time sem conjunto, sem criatividade no meio-campo e com uma defesa mais que vulnerável. Sorte que os argentinos erraram a pontaria. E pena que o técnico Parreira tenha tanta birra contra o meia Alex, que no pouco tempo que teve deu o passe mais preciso e precioso do jogo, o do terceiro pênalti sofrido por Ronaldo no Mineirão.

Nota 10
Tem revista nova de futebol na praça. É a elegante "Revista 10" (Conrad Editora), que traz em sua primeira edição, entre outras coisas, saborosas reminiscências botafoguenses de Nilton Santos e uma entrevista com o homem que descobriu Diego Armando Maradona.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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