São Paulo, Domingo, 05 de Setembro de 1999
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FUTEBOL NO MUNDO
Sonho no exterior

RODRIGO BUENO

"No começo, foi difícil. Passei dois ou três meses chorando. Fiquei 12 meses sem receber."
O atacante Wamberto, 24, já ídolo no Ajax, é um excelente exemplo (quase desconhecido no Brasil) de como alguns empresários exploram jogadores.
Maranhense, Wamberto, ainda bem jovem, foi vendido por US$ 80 mil para um clube da segunda divisão na Bélgica.
"O empresário que me vendeu pegou todo o dinheiro. Viajei e falei para ele mobiliar a casa da minha mãe. Ela pediu sofá, geladeira, essas coisas, mas não viu nada", disse, em uma entrevista no Amsterdã Arena.
Tive a oportunidade de conhecer na semana que passou tanto os problemas que afligiram Wamberto na Europa quanto o pomposo estádio do Ajax, onde o clube enfrentou na quarta uma seleção turca para arrecadar fundos para vítimas do terremoto naquele país.
Antes de viajar para a Holanda (a convite da KLM, empresa aérea holandesa que, em parceria com a Alitalia, comandará o transporte na Euro-2000), respondi a um anúncio de jornal no Brasil com oferta de emprego para jogadores de primeira e segunda divisão no exterior. No anúncio, chances para jogar nos EUA, no Japão e na Europa. Ao ser atendido, me perguntaram se eu dispunha de R$ 1 mil.
Mesmo dizendo que não estava em nenhum time profissional, que não estava em boa forma e que já tinha 26 anos, me passaram um número de conta corrente para eu fazer um depósito dizendo que divulgariam meu currículo em times estrangeiros. Se algum dia alguém mostrasse interesse em meu trabalho, teria o passe ligado ao empresário.
Assim como Wamberto, garotos sonhando com o estrelato viram vítimas de intermediários. "Sou um privilegiado. Quando vou ao Brasil, as pessoas me pedem uma ajuda, uma chance aqui. Mas eu falo para não virem. Antes de sair, tem que pensar bastante", diz Wamberto.
Para quem não sabe, a Fifa passou a credenciar agentes de jogadores. Apenas eles, teoricamente, atuam legalmente.
Mas não são só os empresários os obstáculos. "O presidente do Sampaio Corrêa (clube que Wamberto defendia no Brasil) na época também não foi honesto", disse o atacante.
Na Bélgica, enfrentou o racismo. Em um jogo, foi chamado de macaco e virou alvo de bananas dentro de campo.
Às vezes até a família atrapalha. Não porque Wamberto ampara seus nove irmãos. Mas porque alguns deles o aconselharam a não ter uma nacionalidade européia (com isso, suas oportunidade de trabalho ficariam bem mais facilitadas).
Mais calejado, Wamberto não tem mais empresário. Conseguiu chegar a um dos clubes mais conhecidos do mundo, dirige um Mitsubishi na turística Amsterdã, dá a melhor educação possível a seus três filhos (Danilo, 8, já treina no Ajax).
É, na verdade, um dos poucos que sobreviveram.



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