São Paulo, sexta-feira, 06 de julho de 2007

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FÁBIO SEIXAS

Sobre sol e peneira


Não vai acontecer nada, mas a McLaren deveria, sim, ser punida com a perda dos pontos no campeonato


PARA COMEÇAR, sem falso suspense: não vai acontecer nada.
A McLaren não será punida no caso do tráfico de informações.
Empolgada com o melhor Mundial dos últimos anos e com o advento do fenômeno Hamilton, a FIA nem em sonho castigará o time inglês. Vai além disso. Só entrou no rolo para colocar panos quentes. O tal papo de "assegurar a lisura" pode ser traduzido como "reunir a confraria, passar um pito e seguir com o jogo".
Mas deveria. A McLaren deveria ser punida e perder seus 114 pontos.
Integrante da "famiglia Ferrari", grupo que reergueu a escuderia, Nigel Stepney é acusado pelos próprios chefes de ter roubado documentos com detalhes técnicos do F2007, além de informações da estrutura do time, de dados de acertos dos carros e de estratégias para os GPs.
Stepney já foi punido pela equipe, com a demissão. Nunca mais trabalhará na F-1. Responderá a processo criminal na Itália. Já está suficientemente encrencado. Esse lado da história, enfim, já me parece resolvido.
O problema está na outra ponta.
Mike Coughlan, o receptador, não é um qualquer. Trata-se, desde 2002, do projetista-chefe da McLaren, do homem que assumiu o posto de Adrian Newey na concepção dos carros que saem das autoclaves de Woking. Era nas mãos dele, ou nas gavetas de sua casa, como descobriu a Scotland Yard, que estavam os projetos tungados de Maranello.
Para quê? Por que ele quis ou por que aceitou a papelada? Para consertar o carro da garagem ou o liquidificador da patroa? Acho que não.
E não se trata de vistoriar o MP4-22 atrás de componentes similares aos do F2007. É encenação, é balela, é desviar do foco da questão. É óbvio que não vão encontrar coisa alguma. Peças são feitas para pôr e tirar. Isso faz parte da operação abafa da FIA.
O xis do caso é outro. O simples fato de Coughlan ter passado os olhos nos documentos já é, ou deveria ser, suficiente para que a McLaren perdesse os pontos. Ron Dennis ciente ou não, uma peça-chave de sua organização recebeu de forma ilegal e antiesportiva conhecimentos vitais de uma rival. Muito mais valioso do que o desenho de um defletor é saber, por exemplo, como o time adversário se arma para tal corrida.
E isso o projetista-chefe da McLaren mantinha na gaveta de casa. E isso ele utilizou, conscientemente ou não, secretamente ou não. Conhecimento se adquire, mas não se apaga.
Pode não ter havido dolo da McLaren. Mas houve falha, a de ter em seus quadros alguém que, mesmo que indiretamente, causou prejuízos a terceiros. O que, desde o Código de Napoleão, prevê punição. O que, por aqui, recebeu o nome de responsabilidade objetiva. Embora tanto aqui como na F-1 muita gente se ache mais importante que o pequeno imperador. E nada aconteça.

Pit Stop
Esta coluna faz uma parada de três semanas e volta após o Pan.

fseixas@folhasp.com.br


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