São Paulo, quinta-feira, 07 de junho de 2001

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FUTEBOL

O grande teatro

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Um dos componentes mais folclóricos e inúteis do mundo do futebol são as declarações de técnicos e jogadores antes dos jogos. Nem sei por que os jornalistas fazem tanta questão das entrevistas, já que quase ninguém fala a verdade (ou toda a verdade). Também não sei por que alguns técnicos decidem se indispor com a imprensa e se recusar a falar com os repórteres, já que é tão fácil dar aquela enroladinha tradicional.
Sejam quais forem as respostas, a mídia vai sempre tirar as suas próprias conclusões. Muitos jornalistas defendem as suas teses até o fim, quer o entrevistado as confirme ou não. Mas isso não acontece só no esporte...
Como os entrevistados mentem muito, e não só no esporte, o jornalista se concede um salvo-conduto para interpretar as verdadeiras intenções por trás das respostas, e os leitores e espectadores assistem, assim, a um verdadeiro teatro, já comentado.
Se um atleta disser que não ficou abalado porque perdeu um pênalti, será citado assim: "Fingindo tranquilidade, fulano não admitiu que está abalado".
Se disser que não se aborreceu com uma substituição: "Apesar de ter ficado bastante contrariado, o jogador negou estar irritado com o técnico".
Em alguns casos, não há resposta "certa". Qualquer declaração será criticada. No caso da substituição, ou de o jogador começar um jogo como reserva: se ele disser que é normal e que está conformado, isso será traduzido como desinteresse, acomodação ou covardia. Se disser que preferia ser titular ou continuar em campo, ele pode ser chamado de mascarado, rebelde, desagregador e até de antiético.
Se o técnico elogiar o jogador insatisfeito "é bom sinal, prova de interesse". Pode ser acusado de estar "passando a mão na cabeça" do rebelde, ou de estar querendo "pôr panos quentes". Se criticá-lo, está "jogando a torcida contra o jogador".
Se um jogador disser, como Álvaro na Olimpíada, que "não importa o adversário, o Brasil tem de ser superior. A gente não pode ter medo do Japão", qual a conclusão? "Mascarado", "está de salto alto". Se a declaração for "precisamos respeitar o adversário; o Japão evoluiu e tem bons jogadores", serei a primeira a dizer: "Essa história de cautela já encheu; o Japão evoluiu, mas nós temos de jogar melhor".
É fácil perceber quando alguém está mentindo, mesmo sem a interpretação do jornalista. Quando o Corinthians recém-campeão diz que "o Washington faz falta, mas a Ponte tem outros jogadores e pode complicar para o nosso time", sabemos que essa é a única declaração possível, mas perder para a Ponte seria uma surpresa incrível para os corintianos.
Leão garantiu que o jogo de hoje contra a França não seria uma revanche. Mas é claro que é! Até jogo de tênis com a França virou revanche de 98. Se o Brasil ganhar, não vai apagar a mágoa. Se perder, a sensação será a de que "a França é bi".
Com todos os rapapés e salamaleques de hoje em dia, é bom ter alguém como o velho louco, quer dizer, Lobo Zagallo, que diz: "Estamos com o Vasco atravessado na garganta. Queremos revanche, sim!". Sorte dele que deu certo... Alguém menos afortunado teria muito mais de engolir do que ser engolido. Mas, para quem está assistindo, esse outro teatro, parecido com as provocações dos pugilistas antes da luta, é muito mais divertido.

Na cozinha
Quando eu disse, na minha estréia como comentarista na TV, que o Botafogo-RJ estava em fase tão ruim "que os jogadores comemoravam até 0 a 0 como bom resultado", botafoguenses me mandaram para o fogão (um trocadilho involuntário e um equívoco; não é porque nasci com ovários que sou boa cozinheira). Agora é o técnico da seleção que comemora 0 a 0. Desisto. Vou para o fogão.

Garantia
Andrés Pastrana, presidente da Colômbia, garante a segurança na Copa América. Para os visitantes, garantias. Para os habitantes, boa sorte e condolências.

Quem sabe
Se Alex, Lopes, Arce e Felipe jogarem (mesmo), o Boca também tem motivos para se preocupar. E-mail: soninha.folha@uol.com.br


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