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FUTEBOL
O grande teatro
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
Um dos componentes mais
folclóricos e inúteis do
mundo do futebol são as declarações de técnicos e jogadores
antes dos jogos. Nem sei por que
os jornalistas fazem tanta questão das entrevistas, já que quase
ninguém fala a verdade (ou toda a verdade). Também não sei
por que alguns técnicos decidem
se indispor com a imprensa e se
recusar a falar com os repórteres, já que é tão fácil dar aquela
enroladinha tradicional.
Sejam quais forem as respostas, a mídia vai sempre tirar as
suas próprias conclusões. Muitos jornalistas defendem as suas
teses até o fim, quer o entrevistado as confirme ou não. Mas isso
não acontece só no esporte...
Como os entrevistados mentem muito, e não só no esporte, o
jornalista se concede um salvo-conduto para interpretar as verdadeiras intenções por trás das
respostas, e os leitores e espectadores assistem, assim, a um verdadeiro teatro, já comentado.
Se um atleta disser que não ficou abalado porque perdeu um
pênalti, será citado assim: "Fingindo tranquilidade, fulano não
admitiu que está abalado".
Se disser que não se aborreceu
com uma substituição: "Apesar
de ter ficado bastante contrariado, o jogador negou estar irritado com o técnico".
Em alguns casos, não há resposta "certa". Qualquer declaração será criticada. No caso da
substituição, ou de o jogador começar um jogo como reserva: se
ele disser que é normal e que está conformado, isso será traduzido como desinteresse, acomodação ou covardia. Se disser que
preferia ser titular ou continuar
em campo, ele pode ser chamado de mascarado, rebelde, desagregador e até de antiético.
Se o técnico elogiar o jogador
insatisfeito "é bom sinal, prova
de interesse". Pode ser acusado
de estar "passando a mão na cabeça" do rebelde, ou de estar
querendo "pôr panos quentes".
Se criticá-lo, está "jogando a
torcida contra o jogador".
Se um jogador disser, como
Álvaro na Olimpíada, que "não
importa o adversário, o Brasil
tem de ser superior. A gente não
pode ter medo do Japão", qual a
conclusão? "Mascarado", "está
de salto alto". Se a declaração
for "precisamos respeitar o adversário; o Japão evoluiu e tem
bons jogadores", serei a primeira a dizer: "Essa história de cautela já encheu; o Japão evoluiu,
mas nós temos de jogar melhor".
É fácil perceber quando alguém está mentindo, mesmo
sem a interpretação do jornalista. Quando o Corinthians recém-campeão diz que "o Washington faz falta, mas a Ponte
tem outros jogadores e pode
complicar para o nosso time",
sabemos que essa é a única declaração possível, mas perder
para a Ponte seria uma surpresa
incrível para os corintianos.
Leão garantiu que o jogo de
hoje contra a França não seria
uma revanche. Mas é claro que
é! Até jogo de tênis com a França virou revanche de 98. Se o
Brasil ganhar, não vai apagar a
mágoa. Se perder, a sensação será a de que "a França é bi".
Com todos os rapapés e salamaleques de hoje em dia, é bom
ter alguém como o velho louco,
quer dizer, Lobo Zagallo, que
diz: "Estamos com o Vasco atravessado na garganta. Queremos
revanche, sim!". Sorte dele que
deu certo... Alguém menos afortunado teria muito mais de engolir do que ser engolido. Mas,
para quem está assistindo, esse
outro teatro, parecido com as
provocações dos pugilistas antes
da luta, é muito mais divertido.
Na cozinha
Quando eu disse, na minha estréia como comentarista na TV,
que o Botafogo-RJ estava em fase tão ruim "que os jogadores
comemoravam até 0 a 0 como bom resultado", botafoguenses
me mandaram para o fogão (um trocadilho involuntário e um
equívoco; não é porque nasci com ovários que sou boa cozinheira). Agora é o técnico da seleção que comemora 0 a 0. Desisto. Vou para o fogão.
Garantia
Andrés Pastrana, presidente da Colômbia, garante a segurança
na Copa América. Para os visitantes, garantias. Para os habitantes, boa sorte e condolências.
Quem sabe
Se Alex, Lopes, Arce e Felipe jogarem (mesmo), o Boca também
tem motivos para se preocupar.
E-mail: soninha.folha@uol.com.br
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