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AUTOMOBILISMO
Cláusula previa quebra do contrato caso brasileiro falasse publicamente sobre relação com time italiano?
Ferrari silenciou Massa por quatro anos
FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL
Praxe na F-1, o comunicado foi
sucinto, curto e seco. Em sete li
nhas, a Ferrari confirmou, há cin
co dias, que Felipe Massa será seu
piloto titular em 2006. Mas a his
tória que culminou com o anúncio _e com o fim da era de Ru
bens Barrichello como principal
representante do país na catego
ria_ é rica, uma novela. E longa.
Começou em junho de 2001,
num escritório de Maranello, na
Itália. Reúne acasos, uma revista
sem idéias, um presente de pai pa
ra filho, uma cláusula de silêncio,
um chefe de equipe ganancioso,
um motor de US$ 25 milhões e
um jovem piloto que ainda luta
para se afirmar. Havia 20 anos, a
Ferrari não contratava um titular
com histórico tão inexpressivo.
?Nossa primeira reunião em
Maranello [onde fica a sede da es
cuderia] foi em junho de 2001.
Fomos o Felipe, o Ricar
do e eu. E quem nos rece
beu foi o Todt e o Dome
nicali?, conta Adriano
Morini, dono da Draco, time pelo qual Massa dispu
tava a F-3000 européia.
Ricardo Tedeschi era, en
tão, empresário do piloto e
já havia sido o responsável
por emplacar Barrichello na
F-1, oito anos antes. Foi Te
deschi quem levou Massa do
kart para a F-Chevrolet, em
98, e de lá para a F-Renault, na
Itália, em 99. Stefano Domeni
cali era, na época, o encarrega
do pela logística da Ferrari.
Jean Todt, o diretor esportivo.
Foi o primeiro encontro de
Massa com Todt, o homem que
desenharia seu futuro. Um en
contro frio, que não gerou gran
des esperanças na trupe do piloto.
Todt falou pouco, fez pouquís
simas perguntas, lembra Morini.
Ao final de uma hora e meia de
reunião, o francês foi seco: disse
que Massa tinha obrigação de
conquistar o título e que, caso o
fizesse, o procurasse de novo.
A indiferença de Todt, porém,
era fachada. Ele se impressionou
com o currículo de Massa. Então
com 20 anos recém-completados,
ele estreava na F-3000 européia,
prima pobre da F-3000 interna
cional, e acumulava três vitórias
em três provas disputadas. Até
aquele junho, correra 27 provas
de monopostos e vencera 15.
Mais: o francês viu no brasileiro
a chance de resolver um proble
ma pessoal, encaminhar seu filho
no automobilismo, tornando-o
empresário de piloto. Nicolas,
dois anos mais velho do que Mas
sa, sofria para fazer decolar sua
empresa de hospedagem de sites.
Para completar, sabia que havia
mais gente atrás do brasileiro.
Em outubro de 2000, Flavio
Briatore, diretor esportivo da Re
nault e célebre por fechar contra
tos ad eternum com revelações, já
havia tentado cooptar Massa.
Chegou a mandar propostas
por fax para Luis Antônio Massa,
pai de Felipe, em Botucatu (a 230
km de São Paulo). Mas foi prete
rido porque não podia garantir a
promoção para a F-1. Pelo mes
mo motivo, Pedro Paulo Diniz e
Alain Prost, sócios da Prost
Grand Prix, perderam o piloto.
Assim, um mês depois do pri
meiro encontro, Todt ligou para
Morini, marcando nova reunião.
Quando o mesmo trio chegou a
Maranello, achou um contrato
pronto, faltando só a assinatura.
Além de contar com o nome da
Ferrari, que começava a viver o
melhor momento de sua história,
Todt tinha aquilo que Briatore
não podia oferecer: a vaga na F-1.
Na Sauber, que desde 1997
comprava motores da Ferrari por
US$ 25 milhões. A idéia era em
prestar o piloto a um time para
que ele ganhasse experiência. Em
troca do favor, os suíços ganha
riam descontos nos propulsores.
Todt conseguiu que a Sauber
agendasse um teste com Massa,
no dias 18 e 19 de setembro, em
Mugello. Apesar das dificuldades
para se comunicar em inglês com
os engenheiros, o piloto foi bem,
com um tempo apenas 0s867
mais lento que a melhor marca de
Michael Schumacher no circuito.
Aí, o acaso surgiu. Na semana
do treino, com a F-1 decidida ha
via mais de um mês, Ivan Zazza
roni, diretor da ?Autosprint?,
principal revista italiana de auto
mobilismo, não sabia o que colo
car na capa da edição seguinte.
Mario Donnini, repórter que
cobria categorias locais, lembrou
do teste em Mugello e do currícu
lo do brasileiro. O chefe viu ali
uma chance de boas vendas. No
dia 25, a revista foi às bancas com
uma foto de Massa na capa e o tí
tulo: ?Será ele o novo Senna??.
Se faltava algo para convencer
Luca di Montezemolo, presidente
da Ferrari, a aceitar o desconto na
venda de motores sugerido por
Todt, acabou ali. Em 3 de março
de 2002, Massa alinhou o Sauber
no grid da Austrália, tornando-se
o 26º brasileiro a correr na F-1.
Já naquela época havia evidên
cias sobre suas ligações com a
Ferrari, o que sempre foi negado
por todos os envolvidos. Em en
trevista publicada pela tal ?Autos
print? que lhe dedicou capa, por
exemplo, Massa declarou que
nunca havia encontrado Todt.
Mas já o vi pela TV, nos GPs.
A relação ficou clara quando
Massa tornou-se piloto de testes
da Ferrari, em 2003, mesmo ano
em que Nicolas passou a acompa
nhá-lo. As negativas, porém, con
tinuaram. O motivo: uma cláusu
la que anulava o contrato caso
uma das partes o revelasse.
O veto durou até a última sema
na, quando a Ferrari anunciou a
troca de pilotos. Hoje diretor-ge
ral da Ferrari, Todt não pestane
jou quando Barrichello o consul
tou sobre sua saída para a BAR.
Acabaram, enfim, os segredos.
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