São Paulo, domingo, 07 de agosto de 2005

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AUTOMOBILISMO

Cláusula previa quebra do contrato caso brasileiro falasse publicamente sobre relação com time italiano?

Ferrari silenciou Massa por quatro anos

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Praxe na F-1, o comunicado foi sucinto, curto e seco. Em sete li nhas, a Ferrari confirmou, há cin co dias, que Felipe Massa será seu piloto titular em 2006. Mas a his tória que culminou com o anúncio _e com o fim da era de Ru bens Barrichello como principal representante do país na catego ria_ é rica, uma novela. E longa.
Começou em junho de 2001, num escritório de Maranello, na Itália. Reúne acasos, uma revista sem idéias, um presente de pai pa ra filho, uma cláusula de silêncio, um chefe de equipe ganancioso, um motor de US$ 25 milhões e um jovem piloto que ainda luta para se afirmar. Havia 20 anos, a Ferrari não contratava um titular com histórico tão inexpressivo.
?Nossa primeira reunião em Maranello [onde fica a sede da es cuderia] foi em junho de 2001.
Fomos o Felipe, o Ricar do e eu. E quem nos rece beu foi o Todt e o Dome nicali?, conta Adriano Morini, dono da Draco, time pelo qual Massa dispu tava a F-3000 européia.
Ricardo Tedeschi era, en tão, empresário do piloto e já havia sido o responsável por emplacar Barrichello na F-1, oito anos antes. Foi Te deschi quem levou Massa do kart para a F-Chevrolet, em 98, e de lá para a F-Renault, na Itália, em 99. Stefano Domeni cali era, na época, o encarrega do pela logística da Ferrari.
Jean Todt, o diretor esportivo. Foi o primeiro encontro de Massa com Todt, o homem que desenharia seu futuro. Um en contro frio, que não gerou gran des esperanças na trupe do piloto.
Todt falou pouco, fez pouquís simas perguntas, lembra Morini.
Ao final de uma hora e meia de reunião, o francês foi seco: disse que Massa tinha obrigação de conquistar o título e que, caso o fizesse, o procurasse de novo.
A indiferença de Todt, porém, era fachada. Ele se impressionou com o currículo de Massa. Então com 20 anos recém-completados, ele estreava na F-3000 européia, prima pobre da F-3000 interna cional, e acumulava três vitórias em três provas disputadas. Até aquele junho, correra 27 provas de monopostos e vencera 15.
Mais: o francês viu no brasileiro a chance de resolver um proble ma pessoal, encaminhar seu filho no automobilismo, tornando-o empresário de piloto. Nicolas, dois anos mais velho do que Mas sa, sofria para fazer decolar sua empresa de hospedagem de sites.
Para completar, sabia que havia mais gente atrás do brasileiro.
Em outubro de 2000, Flavio Briatore, diretor esportivo da Re nault e célebre por fechar contra tos ad eternum com revelações, já havia tentado cooptar Massa.
Chegou a mandar propostas por fax para Luis Antônio Massa, pai de Felipe, em Botucatu (a 230 km de São Paulo). Mas foi prete rido porque não podia garantir a promoção para a F-1. Pelo mes mo motivo, Pedro Paulo Diniz e Alain Prost, sócios da Prost Grand Prix, perderam o piloto.
Assim, um mês depois do pri meiro encontro, Todt ligou para Morini, marcando nova reunião.
Quando o mesmo trio chegou a Maranello, achou um contrato pronto, faltando só a assinatura.
Além de contar com o nome da Ferrari, que começava a viver o melhor momento de sua história, Todt tinha aquilo que Briatore não podia oferecer: a vaga na F-1.
Na Sauber, que desde 1997 comprava motores da Ferrari por US$ 25 milhões. A idéia era em prestar o piloto a um time para que ele ganhasse experiência. Em troca do favor, os suíços ganha riam descontos nos propulsores.
Todt conseguiu que a Sauber agendasse um teste com Massa, no dias 18 e 19 de setembro, em Mugello. Apesar das dificuldades para se comunicar em inglês com os engenheiros, o piloto foi bem, com um tempo apenas 0s867 mais lento que a melhor marca de Michael Schumacher no circuito.
Aí, o acaso surgiu. Na semana do treino, com a F-1 decidida ha via mais de um mês, Ivan Zazza roni, diretor da ?Autosprint?, principal revista italiana de auto mobilismo, não sabia o que colo car na capa da edição seguinte.
Mario Donnini, repórter que cobria categorias locais, lembrou do teste em Mugello e do currícu lo do brasileiro. O chefe viu ali uma chance de boas vendas. No dia 25, a revista foi às bancas com uma foto de Massa na capa e o tí tulo: ?Será ele o novo Senna??.
Se faltava algo para convencer Luca di Montezemolo, presidente da Ferrari, a aceitar o desconto na venda de motores sugerido por Todt, acabou ali. Em 3 de março de 2002, Massa alinhou o Sauber no grid da Austrália, tornando-se o 26º brasileiro a correr na F-1.
Já naquela época havia evidên cias sobre suas ligações com a Ferrari, o que sempre foi negado por todos os envolvidos. Em en trevista publicada pela tal ?Autos print? que lhe dedicou capa, por exemplo, Massa declarou que nunca havia encontrado Todt.
Mas já o vi pela TV, nos GPs. A relação ficou clara quando Massa tornou-se piloto de testes da Ferrari, em 2003, mesmo ano em que Nicolas passou a acompa nhá-lo. As negativas, porém, con tinuaram. O motivo: uma cláusu la que anulava o contrato caso uma das partes o revelasse.
O veto durou até a última sema na, quando a Ferrari anunciou a troca de pilotos. Hoje diretor-ge ral da Ferrari, Todt não pestane jou quando Barrichello o consul tou sobre sua saída para a BAR.
Acabaram, enfim, os segredos.

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