São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 2004

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MOTOR

Molho inglês

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

O quadro foi pintado por um colega que esteve em Valencia, segunda-feira, na apresentação do FW26, o novo Williams.
Convidados para conhecer o carro, jornalistas europeus, dezenas deles, desembarcaram na cidade espanhola com a mesma missão, uma só idéia fixa: entupir os pilotos e os chefes da equipe com perguntas sobre a situação incômoda de Juan Pablo Montoya nesta temporada. O tema era esse, óbvio. O negócio era mergulhar, fustigar, chafurdar até arrancar uma declaração bombástica, uma frase que, além da paella e da horchata, valesse o vôo.
(Mesmo isso seria difícil. As entrevistas coletivas de pilotos são cada vez mais formais. Vigiados por assessores e seus cupinchas, não falam nada aproveitável nem em decisão de campeonato.)
Então subiu o pano. E todos ficaram boquiabertos. Estupefatos, se entreolharam. Cenário que poucos esperavam ver de novo na F-1, após mais de uma década de carros pasteurizados, apareceu algo diferente no front. Aleluia!
Foi esse o primeiro mérito do FW26. Em um instante, todos deixaram de lado o plano original. Diante de um carro tão diferente, tão... esquisitão, não haveria sentido perguntar sobre o colombiano. No íntimo, Patrick Head deve ter soltado uma gargalhada.
Naquele dia e de lá para cá, a categoria flerta com seu passado, com os tempos de Collin Chapman e Gordon Murray. Os jornalistas pararam de provocar, os pilotos deixaram de lado a empáfia, os técnicos, orgulhosos da obra, passaram a falar sem freios. Há, afinal, um terreno fértil para discussão. Há uma novidade para tentar explicar e tentar entender.
Até uma velha brincadeira foi retomada. Começou uma corrida para ver quem inventava a alcunha mais criativa para o bico do FW26. Surgiram várias: batmóvel, periquito, arraia, tubarão martelo, aparelho de barbear, só para citar algumas. Daqui a pouco, um desses apelidos pega.
No meio de todo o frisson, houve ainda quem sugerisse que o novo bico não passava de uma fraude, de um factóide criado pela Williams para desviar a atenção sobre a já anunciada transferência de Montoya para a McLaren.
Head desancou o repórter que fez a ilação. E nos dias seguintes, em Jerez, o carro mostrou que funciona, que anda rápido, seu segundo -e, claro, mais valioso- mérito. A Renault já admitiu que pode copiar a idéia.
Movimentados os últimos dias, não? Nem parece a categoria que há quatro anos faz o mesmo piloto campeão. Que há cinco vê um só time levantar o Mundial de Construtores. Que teve que inventar regras esdrúxulas para tentar -e não conseguir- equilibrar um pouco a relação de forças.
Seja qual for o resultado na pista, a impressão é a de que o FW26 já entrou para a história. Dentro de alguns anos, frequentará o imaginário dos fãs e entrará nas conversas sobre carros bacanas. Talvez isso não aconteça com a Ferrari F2002, que há dois anos venceu 15 de 17 GPs. F-1 é algo mais do que competência fria e pura. Tem também o molho.


Excepcionalmente hoje José Henrique Mariante não escreve neste espaço

Renovação 1
A badalação em torno do FW26 foi tão grande que jogou uma névoa sobre a suposta renovação de Barrichello. A assessoria da Ferrari não desmente. Diz que é possível, mas que não recebeu nenhuma comunicação dos dirigentes. Em Detroit, Luca di Montezemolo foi duro ao negar o contrato. Um palpite? Se sair, a renovação será anunciada no meio do ano. Até lá, Massa já vai ter mostrado a que veio. Ou não.

Renovação 2
Atrás de índices ainda maiores de audiência, a Nascar anunciou ontem que adotará um sistema de playoffs neste ano. As 26 primeiras provas servirão para classificar os pilotos (o número ainda está em discussão) para as dez corridas finais. A pontuação anterior será zerada, mas terá um peso. O resto correrá um campeonato paralelo.

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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