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FUTEBOL
Prédio comprado pelo volante corintiano começou com Greta Garbo e piano e terminou com nudez e gemidos
"Cine-Vampeta' viu orquestra e sexo
do enviado a Nazaré (BA)
Em seus 71 anos de existência, o
Rio Branco, tal qual o cinema retratado no filme de Tornatore,
guarda um mundo de histórias.
Desde a noite de 11 de dezembro
de 1927, quando foi exibida a película "Uma noite de amor", estrelada por Greta Garbo e John Gilbert,
até o último fechamento, em
1996,o espaço adquirido por Vampeta experimentou a glória e o empobrecimento, processo por que
passam (ou passaram) inevitavelmente os cinemas do interior.
Por sua tela ou palco desfilaram
filmes e shows que repassam a história cultural do país neste século.
No princípio era o cinema mudo,
sonorizado por um piano e uma
orquestra.
"Os músicos começavam a tocar
na praça e iam caminhando pela
cidade, até entrarem no cinema",
conta a ex-proprietária Norma
Soares.
Certa vez, recorda, um sanfoneiro foi chamado para sonorizar um
filme que contava a vida de Cristo.
"Meu pai explicou que era pra ele
tocar as músicas de acordo com as
cenas, e ele foi tocando, de improviso. Estava indo bem, até que, na
cena em que Jesus era crucificado,
ele tocou uma música cujo refrão
era "O tatu subiu no pau'. O povo
danou-se, deu-lhe uma surra e arrebentou a sanfona, ele saiu correndo do cinema."
Contemporâneo do Rio Branco,
o aposentado Carlito Serafim dos
Anjos, 79, empolga-se ao relembrar dos tempos áureos do cinema.
"Antigamente só se entrava de
paletó e gravata, e as madames e
senhoritas exibiam seus melhores
vestidos. Para conseguir ingresso
nas frisas para o domingo, tínhamos que comprar na quinta-feira."
Carlito fala como uma criança de
Oscarito em "Esse Mundo é um
Pandeiro" e de "Tom Mix e Buck
Jones nos caubóis", a grande atração de seu tempo.
"Gostava muito de ver os filmes
do Gionvani", conta.
Citado por outros moradores como um dos atores de maior sucesso no Rio Branco, o "Gionvani" em
questão nada mais era -só mais
tarde a reportagem esclareceria-
que uma corruptela do ator norte-americano John Wayne.
O prestígio do gênero "western"
era tanto que foi imortalizado na
logomarca do Rio Branco.
O formato das letras, mantido até
hoje (veja foto acima), é inspirado
na tipologia usada nas fachadas
dos "saloons" americanos.
Mais tarde, quando os espetáculos de luta livre eram moda, um lutador visitante
saiu fugido da
cidade por cegar o campeão
local durante
um combate.
Lutavam
uma noite o
nazareno Tito e
o visitante
King Kong,
vindo de Salvador. Em certo
momento,
King Kong
acertou um
chute no rosto
de Tito, nocauteando-o.
Em 92, quando dava seus últimos
suspiros, o cinema chegou a abrigar uma minitemporada de uma
peça de sexo explícito de uma
companhia paulista que excursionava pela Bahia.
Em cima de uma picape do dono
do cinema, as atrizes dançavam e
acenavam pelas ruas da cidade
anunciando o espetáculo.
A propaganda não surtiu efeito.
"Foi um fiasco, tivemos 50 pessoas por noite", recorda o ex-proprietário Jorge Nagib Boeri Jr..
Nessa época, o Rio Branco já não
tinha o glamour das primeiras décadas: suas pinturas estavam desbotadas, as cadeiras quebradas, os
ornamentos despedaçados.
Construído sob influência tardia
do "art nouveau" (estilo decorativo que vigorou entre 1895 e 1915), o
cinema tem uma galeria superior
em forma de ferradura, onde se localizam as frisas.
As 670 cadeiras são de madeira, e
há desenhos por todo o prédio (veja detalhes nesta página).
Apesar de tanta riqueza, até agora nenhum restaurador participou
da reforma, comandada pelo mestre-de-obras Silvério Rocha.
O Ipac (Instituto do Patrimônio
Artístico e Cultural da Bahia) ficou
de mandar um restaurador à cidade, mas ainda não o fez.
Quanto às outras modificações,
vão sendo feitas do jeito que dá.
Na reforma do telhado, Rocha e
seus homens tiveram que elevar as
vigas de madeira nas costas.
As cadeiras quebradas, originalmente de vinhático, estão sendo
repostas por outras, de jequitibá.
"Não tinha vinhático na carpintaria", conta Rocha.
No últimos anos, comentava-se
na cidade que o Rio Branco seria o
cinema mais antigo em funcionamento no Brasil.
A informação não procede, segundo o curador de documentação e pesquisa da cinemateca do
MAM do Rio e autor da pesquisa
do livro "Palácios e Poeiras - 100
anos de cinemas no Rio de Janeiro", Hernani Heffner.
Só na cidade do Rio, afirma Heffner, há três cinemas mais antigos:
o Íris (de 1909, mas que sofreu reforma em 1921), o Copacabana (de
1916, que já mudou a fachada três
vezes) e o Odeon (de 1926).
O cinema mais antigo em atividade seria o Olímpia, em Belém, de
1912, originário da "borracha-époque" paraense (trocadilho alusivo
à riqueza do ciclo da borracha no
Norte).
(FÁBIO VICTOR)
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