São Paulo, domingo, 11 de março de 2001

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FUTEBOL

Antigo e novo

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

E m outras épocas, o futebol ofensivo, lúdico, descontraído e ""moleque" predominou no Brasil. Os meninos jogavam descalços, nos campos de terra.
Descobriam a magia e os encantos do futebol. Sem regras e professores. Aprendiam a dominar a bola e acariciá-la. Criava-se uma intimidade.
Para sempre!
Depois vinham o drible, o passe e o chute em curva e outros divertimentos. O garoto tornava-se artista antes de ser um atleta. Nas categorias de base, aprendiam a técnica, as regras, a posição em campo, a competir, a ganhar, a perder e outras coisas chatas, mas necessárias.
Nos principais estádios do mundo repetiam as jogadas maravilhosas da infância.
Essa capacidade de brincar com responsabilidade na vida adulta é a base da criatividade em todas as profissões.
Com essa habilidade e descontração, associadas à técnica e disciplina tática, a seleção do Brasil foi quatro vezes campeã do mundo.
Não ganhou em 1982, mas encantou o mundo.
Em 1994, o principal motivo da vitória não foi o eficiente esquema tático, como dizem. Foi o talento de jogadores como Romário, Bebeto e outros.
Ao assumir o comando da seleção brasileira, Leão prometeu resgatar o futebol alegre, ousado e bailarino.
Como ninguém viu o primeiro jogo contra os Estados Unidos, não sei se o time melhorou ou piorou contra o México. Certamente, não agradou.
De positivo, a intenção do treinador de adotar uma postura ofensiva, ao escalar Rivaldo, Romário, Ronaldinho e Edílson. Vampeta, Cafu e, raramente, Roberto Carlos, também apareciam muito na frente.
Ronaldinho e Rivaldo, no entanto, ocuparam o mesmo espaço. Rivaldo, o melhor da seleção, jogou pelos dois.
A seleção do Brasil atuou com quatro defensores (dois zagueiros centrais e dois laterais) muito atrás e com quatro atacantes fixos na frente.
No meio-campo, um enorme vazio. Somente Emerson e Vampeta participavam da armação e da marcação.
A equipe mexicana tinha toda a liberdade, tocava a bola e facilmente chegava ao gol brasileiro.
A seleção do Brasil jogava assim antes da Copa de 58. Há mais de 40 anos.
Naquele Mundial, o ponta-esquerda Zagallo percebeu o grande buraco no meio-campo.
Recuou e formou uma linha de três armadores. Quando o Brasil recuperava a posse de bola, Zagallo tornava-se, novamente, um ponta-esquerda. Telê fazia isso pela direita no Fluminense.
A partir daí, todas as equipes passaram a jogar com três no meio-campo.
Alguns técnicos preferiam manter os dois pontas e recuar um atacante, o ponta-de-lança.
Voltando à atual seleção, uma coisa é recuperar o futebol bonito e bailarino do passado. Outra é repetir esquemas táticos ultrapassados.
O talento, a individualidade, a descontração e a ofensividade do passado não são incompatíveis com a velocidade, a marcação e a disciplina tática atual. Complementam-se.
Nos últimos anos, a única evolução do futebol, em consequência da vitória valer três pontos, foi a associação da ousadia com a forte marcação.
Em vez de jogar atrás e atrair o adversário para contra-atacar, algumas equipes passaram a pressionar e recuperar a bola no meio-campo e próxima à área do outro time. Assim é mais fácil chegar ao gol.
Dessa maneira, os jogadores que participam da marcação no meio-campo, automaticamente tornam-se atacantes quando recuperam a posse de bola.
""Quem ataca é atacante." (Armando Nogueira)
O futebol brasileiro e a seleção não fazem isso.
Ao anunciar a convocação para o jogo contra os Estados Unidos, Leão escalou o time, repetindo João Saldanha em 1969. No intervalo da partida retirou Juninho, Christian e Vampeta.
No primeiro treino para a partida contra o México, o treinador escalou Edílson, Ricardinho e Edmilson, além de Rivaldo e Roberto Carlos.
No segundo treino, voltou com o volante Vampeta no lugar do atacante Edílson.
No jogo, Edílson retornou ao time no lugar de Ricardinho. No segundo tempo, o treinador substituiu Rivaldo, Roberto Carlos, Edílson e Ronaldinho.
Desse jeito o Brasil vai chegar à Copa com as mesmas incertezas de hoje: desorganizado e sem time. Leão repete os mesmos erros do Zagallo e do Luxemburgo.
O futebol brasileiro começou a mudar. Dentro de campo surgem antigos e novos técnicos com outras idéias, como Valdyr Espinosa, Vadão, Geninho, Abel Braga e outros. Espero poder acrescentar o nome de Leão.
Fora de campo, as CPIs estão desencadeando outros comportamentos.
Surgem novas propostas e idéias, como as do Sócrates.
Há muita gente incompetente, fisiologista e que não entende nada de futebol.
Em todas as áreas. Aproveitam-se do esporte.
Essas pessoas terão de mudar, ou se retirar.
Para sempre!

E-mail : tostao.folha@uol.com.br

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