São Paulo, sábado, 13 de novembro de 2004

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FUTEBOL

Regente ou gerente?

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Há jogadores cuja principal característica é a de organizar o jogo, como quem limpa o terreno para os outros brilharem. É o caso de Ricardinho, que agora está de volta à seleção brasileira, depois de dois anos de quase ostracismo.
Poucos jogadores passaram por fases tão díspares em tão pouco tempo. Senão, vejamos.
Após atingir seu apogeu no Corinthians, Ricardinho foi chamado às pressas para a Copa-02, por conta da contusão de Emerson. Na época, havia quase um clamor geral pela sua convocação, dada a pouca consistência criativa do meio-campo brasileiro.
Ricardinho foi à Copa, quase não jogou, e o Brasil voltou campeão. O jogador trocou o Corinthians pelo São Paulo, onde rendeu menos que o esperado. Sua passagem pelo Middlesbrough foi ainda mais frustrante: não chegou a jogar nenhuma partida.
Ricardinho passou a ser visto como atleta em decadência. Uma carta fora do baralho.
Mas eis que no Santos, em plena reformulação com a saída de jogadores como Diego, Renato e Paulo Almeida, Ricardinho em pouco tempo reencontrou seu espaço, sua autoconfiança e seu futebol inegavelmente competente.
O que explica uma alternância tão grande?
Como sempre, várias coisas. Há quem aponte como decisivo o dedo de Luxemburgo. De fato, o treinador, que conhece Ricardinho desde os tempos do Paraná Clube, soube encaixá-lo no time e devolveu-lhe o status de líder e capitão. O elenco do Santos também ajuda, claro.
Mas o São Paulo, quando Ricardinho passou pelo Morumbi, também não tinha um elenco ruim. Estavam lá Kaká, Maldonado, Júlio Baptista, Luis Fabiano. Por que não deu certo? Segundo se depreende das declarações de Ricardinho, houve contra ele, dentro e fora do campo, resistências que beiraram o boicote.
Para um jogador como Ricardinho, totalmente voltado para o jogo coletivo, o ambiente de trabalho é fundamental. No Santos, ele parece estar à vontade, com a cabeça fresca para encontrar os espaços e criar jogadas para seus talentosos companheiros. É o regente de uma orquestra em que os solistas se alternam.
Quando o clima é hostil, quando não há colaboração da equipe, um jogador como Ricardinho deixa de ser regente para se tornar um mero gerente, merecendo as acusações que lhe imputam: burocrático, quadrado, sem inspiração. Passa a ser apenas o representante do técnico em campo, como o aluno CDF que a professora deixa tomando conta da classe quando se ausenta.
Se não há paixão, se os companheiros não ajudam, se a torcida não apóia, tanto faz dar um passe de lado ou fazer um lançamento de 40 metros.
Vai-se tocando o ofício como quem trabalha com a barriga no guichê do banco ou da loja.
Mas o futebol de Ricardinho pode ser muito mais do que isso, como ele está mostrando no Santos e mostrará, quem sabe, na seleção brasileira.

Efeito Serginho
A cautela do departamento médico do Grêmio, que afastou Emerson até que se façam exames cardiológicos detalhados, indica que os clubes se tornaram mais preocupados com a saúde dos atletas após o caso Serginho. Se isso for verdade, a morte do zagueiro do São Caetano não terá sido em vão.

Recordar é viver
A rodada deste fim de semana do Brasileirão vai assistir a um triste confronto direto entre dois clubes que correm risco de rebaixamento: Atlético-MG e Flamengo. E pensar que os mesmos dois clubes disputaram no Maracanã, em 1980, uma das finais mais empolgantes da história, que terminou com a vitória por 3 a 2 do Flamengo de Zico sobre o Atlético de Reinaldo. Bons tempos.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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